Portugueses têm capacidade de acolhimento e não alimentam ódio aos estrangeiros – Bispo

Da redação com Lusa

O bispo responsável pela área da Mobilidade Humana na Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), que acompanha as questões das migrações, considera que os portugueses “têm capacidade de acolhimento” e não cultivam o ódio aos estrangeiros.

José Traquina, bispo de Santarém, reconhece, no entanto, que, nalgumas zonas, “o povo português tem medo quando esses estrangeiros não querem integrar-se”.

“A experiência que nós temos da presença de [por exemplo] brasileiros, ucranianos, moldavos, é que estão integrados, sem nenhum problema, as crianças na escola sem nenhum problema. A integração é fácil. Os portugueses têm uma facilidade de acolhimento, já mostraram isso”, diz o bispo em entrevista à agência Lusa, acrescentando que “há situações que são complicadas”.

“Conseguimos identificar situações de pessoas de alguns países que têm retração à integração”, diz, exemplificando com o caso de cidadãos indostânicos, “com uma outra identidade”, que muitas vezes “não querem ajuda”, nomeadamente da Cáritas.

Por outro lado, reconhece que tudo é mais fácil quando esses imigrantes vêm para Portugal em família. Nesses casos, “as crianças vão encontrar-se com outras crianças e as famílias têm de se aproximar por várias razões, é mais fácil. Agora, se vêm só grupos de homens, assusta. Não haver mulheres próximas deles assusta um bocado”.

Muitos destes imigrantes ficam à mercê de redes que os exploram, com as instituições da Igreja Católica, nomeadamente a Cáritas – a estrutura está presente em todas as dioceses do país -, a “fazer o que pode” para ajudar aquelas pessoas e a “chamar a atenção para algumas situações de exploração humana”.

Só que, a partir daí, aquela é uma área de intervenção que compete ao Estado.

“Há aqui questões que compete ao Estado resolver”, como “a fiscalização, como é que as pessoas vêm, quem é que traz as pessoas para Portugal, a identificação das pessoas, quem é que as acompanha, quem é que lhes assegura a identificação, questões que têm a ver com a saúde… Depois, a estabilidade, porque vêm trabalhar, são necessários, mas vêm trabalhar quantos meses, é o ano inteiro, são só seis meses e depois ficam sem nada para fazer? Aí nós não podemos substituir o Estado. Nós podemos observar e chamar atenção, mas não temos a competência para identificar, não podemos fazer de fiscais”, diz José Traquina.

O bispo lamenta, ainda, que muitas vezes as observações feitas não sejam levadas em consideração e exemplifica: “no Alentejo, nomeadamente no Baixo Alentejo, a Cáritas Diocesana de Beja há muito tempo, ainda antes de rebentar socialmente a questão de Odemira, tinha chamado a atenção. E não houve nenhuma atenção às observações daquela Cáritas Diocesana”.

Para o presidente da Comissão Episcopal da Pastoral Social e da Mobilidade Humana, é também evidente “a sensação [de] que aquela mudança do fim do SEF [Serviço de Estrangeiros e Fronteiras] para uma agência [Agência para a Integração Migrações e Asilo]” não terá trazido melhorias.

E quanto às posições anti-imigração que vão surgindo, José Traquina faz questão de lembrar a tradição de séculos, nomeadamente em Lisboa, onde muçulmanos, judeus e cristãos sempre viveram pacificamente.

“Nós não podemos ter uma postura de uma cultura em que não conseguimos dialogar com outras culturas. Nós temos uma tradição em que pessoas de uma cultura diferente conseguem entender-se. Se tivermos pontos comuns, como é a vida e a paz, então podemos viver na mesma cidade”, acrescenta.

Rejeitando o discurso de que, entre os milhares de estrangeiros que procuram Portugal há “muitos malfeitores pelo meio”, o bispo responsável pela área da Pastoral Social diz-se convicto de que “as pessoas querem mesmo ser felizes, querem viver… querem procurar o que nos países deles não têm”.

“Há diferenças enormes na vida nos [diferentes] continentes, nos países. É esse o problema. Se as pessoas jogam a vida a atravessar o Mediterrâneo para chegar à Europa, quer dizer que a vida lá [nos países de origem] não tem valor, não faz sentido. E isto, para eles, é uma esperança, é encontrar um lugar para viver e com alguma esperança em relação também àqueles que deixam lá”, conclui José Traquina.

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