Urbanismo: Portugueses e brasileiros criticam o Estado por falta de “visão estratégica”

Da Redação com Lusa

Professores portugueses e brasileiros, da área de planejamento e ao urbanismo, consideraram que o Estado precisa de ter “visão estratégica” e que muitos planos que fazem “perdem eficácia” por demorarem a ser implementados.

Treze professores de universidades portuguesas e brasileiras estiveram presentes no V Colóquio Brasil – Portugal, realizado no campus da Alameda do Instituto Superior Técnico (IST) nesta quinta-feira, onde discutiram as transformações dos últimos 30 anos nas periferias urbanas nas áreas metropolitanas de Lisboa e São Paulo (Brasil).

Durante as várias conferências, os acadêmicos deixaram críticas à gestão que os órgãos governativos fazem do território, em áreas como a mobilidade, a habitação ou instrumentos legais.

“Nós fazemos planejamentos, mas depois levam anos a serem implementados, e perdem eficácia”, afirmou a professora do IST Maria do Rosário Partidário, na conclusão deste dia de trabalhos, desejando que “os decisores políticos comecem a ter uma visão estratégica”.

Em tom de brincadeira, o diretor do Instituto de Geografia e Ordenamento do Território (IGOT), José Manuel Simões, disse que tem “uma longa carreira de insucesso em planeamento”, porque vários trabalhos por ele e por outros colegas realizados foram pedidos por órgãos governativos, mas não tiveram seguimento.

O planejamento de obras que não se concretizam no final corre o risco de criar “infraestruturas-fantasmas”, como apelidou o professor do IST Jorge Gonçalves, pois há processos que se realizam e que têm influência nos locais pensados para as construções.

Os instrumentos legais de gestão do território foram também criticados, com especial foco no Plano Regional de Ordenamento de Território da Área Metropolitana de Lisboa (PROTAML) e nos Planos Diretores Municipais (PDM).

O professor do IST e ex-vereador na área da mobilidade na Câmara de Lisboa Fernando Nunes da Silva referiu que o PROTAML se revela incapaz “de se traduzir em ações práticas”, e disse ter uma “ausência de políticas públicas eficazes” e “acolher, de forma mais ou menos acrítica, iniciativas privadas” que vão levar a “profundas alterações do uso do solo”.

“Cada município é uma ilha e olha para o seu umbigo”, classificou assim a docente da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, Margarida Pereira, a primeira geração de PDM, que surgiram no início dos anos 90 e tiveram atualizações no final da década.

A acadêmica especialista em ordenamento do território considerou “inaceitável” que muitos PDM (cada município tem de ter o seu) estejam em revisão há mais de uma década, classificando de “contentor” este instrumento por caber lá tudo, algo que “se torna ingovernável”.

A dependência de Portugal em relação aos fundos europeus foi abordada, com os professores João Rafael Santos, da Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa (FAUL), e Eduarda Marques da Costa, do IGOT, a referir a “capacidade engenhosa” do país em recolher fundos e usá-los em pequenas obras, como a repavimentação de uma estrada.

Eduarda Marques da Costa apelou ainda para que o Estado mobilize fundos próprios para resolver problemas “mais pequenos” e reserve o dinheiro da Europa para as “agendas do momento” e para “investimentos estruturantes”.

Nesta quinta-feira discutiu-se também a realidade das áreas periféricas na Região Metropolitana de São Paulo, com a presença dos docentes Lúcia Bógus, Maura Véras, Susana Pasternak, José Geraldo Simões Jr. e Eunice Helena Abascal.

O colóquio continua esta sexta-feira e traz a debate enquadramentos legais e instrumentos de intervenção, bem como casos de estudo.

Parceria

O seminário “Viver (n)a Periferia”, organizado em 1990 pelo Instituto Superior Técnico, ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa e Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, e realizado na Amadora (município da Área Metropolitana de Lisboa), foi o início de uma parceria institucional que permitiu desenvolver e fortalecer laços acadêmicos e incluir progressivamente outros importantes parceiros, como a Universidade Presbiteriana Mackenzie, a partir de 2000, e recentemente o Instituto de Geografia e Ordenamento do Território e a Faculdade de Arquitetura de Lisboa.

Ao longo dos anos, disciplinas e seminários conjuntos foram realizados no Brasil e em Portugal, sempre com o propósito de proporcionar intercâmbios de experiências e circulação de ideias sobre as metrópoles brasileiras e portuguesas, os seus principais problemas e possibilidades de intervenção.

O primeiro Colóquio Brasil-Portugal, realizado em 2008, em São Paulo, na Universidade Presbiteriana Mackenzie, ajudou a consolidar esta parceria, vindo a consagrar-se como um evento periódico capaz de reunir outros especialistas, além dos parceiros institucionais, para refletir quer sobre a temática das transformações urbanas nas metrópoles, quer sobre as novas estratégias urbanísticas desenvolvidas para as cidades brasileiras e portuguesas.

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