Um Ano De Temer, por José de Almeida Amaral Júnior

A imprensa nos últimos dias lembrou que há um ano o País vivia o impeachment da presidenta reeleita Dilma Rousseff. Ela, num primeiro momento, foi afastada do cargo para julgamento no Congresso e, três meses depois, teve a formalização, a confirmação, de sua condenação.
É importante lembrarmos que o processo se iniciou em 2 de dezembro de 2015, quando o ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB/RJ), deu prosseguimento ao pedido dos juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal. Dilma foi acusada de crime de responsabilidade contra a lei orçamentária e contra a guarda e o emprego de recursos públicos, na forma de três decretos de crédito suplementar e operações com bancos públicos (1). Após 273 dias de debates, com provas e contraprovas, a defesa não conseguiu seu objetivo e o mandato foi efetivamente cassado. Mas, com a ressalva de que seus direitos políticos foram mantidos, o que ainda causou protestos da oposição.
O cenário era bastante desfavorável à presidenta. Submerso numa crise econômica, seu governo estava fragilizado. Dilma havia sido responsabilizada pelo rebaixamento da nota de crédito do Brasil, retirando o selo de ‘bom pagador’, feita pela agência internacional de classificação de risco Standard & Poor’s. A oposição e setores empresariais aliados afirmavam na imprensa que “sem Dilma, a volta de investimentos seria ‘instantânea”, como disse o presidente da Riachuelo à BBC Brasil. No meio do caminho, o aliado PMDB abandonou a coligação, debandando-se para a oposição. Esta, unida com a grande imprensa comercial, não deu tréguas ao Executivo, buscando manter a ‘fritura permanente’ perante a opinião pública. Cunha, em 1/04/2016, chegou a afirmar que se ela escapasse da degola não iria conseguir governar, por estar sem apoio no Congresso. E, assim, a oposição conseguiu seu intento, até então frustrado nas urnas. Curiosamente, as ‘pedaladas fiscais’ que custaram o cargo a Dilma haviam sido utilizadas pelo próprio relator da peça de acusação, ex- governador mineiro Anastasia, entre outros 17 executivos que teriam realizado a mesma prática contábil, segundo juristas, e não foram antes caracterizadas como ‘crime de responsabilidades’. O Ministério Público Federal alegou que não havia crime por parte da presidenta. Porém, foi inútil. Por isso, para muitos foi uma manobra ilegítima. Um golpe. Outro no decorrer da vida do Brasil. Mas, e agora? Qual o resultado disto? Foi o fim do pacto social vigente. Início da ‘ponte para o futuro’, conforme os novos governantes.
Temer procurou o mais rápido possível facilitar a participação do mercado, buscando privatizar o patrimônio público, flexibilizar a legislação e endurecer os gastos sociais. Luta para agradar aos que lhe guindaram até a posição (2). Mas, a estabilidade e o avanço prometidos não aconteceram até aqui, com todo apoio existente. E, pior, o País está em conflito aberto, cheio de manifestações, cada vez mais intensas. Há tensão.
O atual mandatário sabe que não lhe resta muita coisa mais em termos de perspectiva política. Entrou em abril último com 28% considerando regular seu governo e apenas 5% de positivo (Vox Populi/CUT). Pesquisa Ipsos (abril/ 2017) o colocou como o político mais odiado do Brasil, com 87% de rejeição, junto de Eduardo Cunha; e 10% de aprovação. Queda livre. Tem sido criticado pela sua base, incluindo gente do próprio partido, o PMDB. E, para coroar, numa entrevista à Band (15/04), afirmou literalmente que se Dilma tivesse conseguido 3 votos do PT para livrar Eduardo Cunha do Conselho de Ética da Câmara, que acabou efetivamente por levá-lo à prisão, “seria muito provável que a senhora presidente continuasse…” Uma imensa vergonha, escancarada pelas listas das empreiteiras levantadas pela Justiça, que não poupam partidos, inclusive e com grande destaque, vários oposicionistas que bateram no peito posando como indignados, revoltados, com a corrupção do governo Lula/Dilma. Tudo isto, então, revela-se como um jogo de interesses mesquinhos, com reduzidíssima intenção cívica, republicana, pensando no ‘bem comum’ da grande massa. Em relação ao povo, o desemprego na Região Metropolitana de SP passou dos 1,8 milhões no desvio e, no País, chegou a 13 milhões (Dieese e IBGE, Jan/2017). Trágico para uma nação tão judiada, de históricos abismos sociais.
Para concluir, um trecho da recente carta do Papa Francisco ao atual presidente, explicando sua negativa em visitar o País neste ano Mariano de 2017: “não podemos mais confiar nas forças cegas e na mão invisível do mercado” […] não posso deixar de pensar em tantas pessoas, sobretudo nos mais pobres, que muitas vezes se veem completamente abandonados e costumam ser aqueles que pagam o preço mais amargo e dilacerante de algumas soluções fáceis e superficiais para crises que vão muito além da esfera meramente financeira”. Mais claro impossível. Recado está dado. São Paulo, 26 de Abril de 2017
(1) http://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2016/12/28/impeachment-de-dilma-rousseff-marca-ano-de-2016-no-congresso-e-no-brasil
(2) https://theintercept.com/2017/03/28/ataques-ao-direito-dos-trabalhadores-sao-desastre-total-diz-subprocurador-geral-do-trabalho/
https://theintercept.com/2017/04/25/em-sintonia-com-o-empresariado-deputados-aprovam-em-comissao-texto-da-reforma-trabalhista/

 

Prof. José de Almeida Amaral Júnior
Professor universitário em Ciências Sociais; Economista, pós-graduado em Sociologia e mestre em Políticas de Educação; Colunista do Jornal Mundo Lusíada On Line, do Jornal Cantareira e da Rádio 9 de Julho AM 1600 Khz de São Paulo

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