Mundo Lusíada
Com Lusa
O ministro português dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, esclareceu nesta quarta-feira, numa audição da Comissão parlamentar de Assuntos Europeus, que a União Europeia não pretende retirar quaisquer exigências de natureza ambiental do acordo com o Mercosul.
Durante a audição, a deputada do Bloco de Esquerda (BE) Fabíola Cardoso questionou o ministro sobre a notícia de rejeição de sanções sobre o Brasil em caso de incumprimento das metas ambientais, após declaração de embaixadores da União Europeia (UE) e de Portugal, num encontro com a imprensa em Brasília em 10 de fevereiro.
Nesse encontro, os embaixadores reforçaram a ambição da presidência portuguesa do Conselho da UE de avançar na ratificação do acordo entre Bruxelas e o Mercosul (Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai) e compararam o Acordo de Paris com este acordo comercial ao nível de sanções, explicando que a UE não trabalha “com a ideia de chegar a sanções, mas promover que as coisas aconteçam em determinado sentido”.
Em resposta, o ministro disse acreditar que foi “uma interpretação errada das declarações dos embaixadores”, reiterando a posição do bloco comunitário de “não retirar nenhum elemento de natureza ambiental e climática do acordo concluído com o Mercosul”.
“Pelo contrário, queremos acrescentar ao que já está nesse acordo compromissos adicionais através de uma declaração política, de um anexo ou de um instrumento adicional”, esclareceu.
O acordo comercial UE-Mercosul, assinado em 2019 após 20 anos de negociações, tem marcado a agenda europeia, uma vez que ainda não entrou em vigor. Em causa estão as exigências de países como França, Bélgica, Países Baixos e Áustria, além do Parlamento Europeu, quanto ao reforço das políticas ambientais, principalmente por parte do Brasil, que viu a desflorestação e os incêndios na Amazônia baterem recordes nos últimos anos.
Também o BE anunciou ter questionado o chefe da diplomacia da União Europeia sobre as declarações do embaixador da UE no Brasil.
Numa pergunta endereçada a Josep Borrell, os eurodeputados Marisa Matias e José Gusmão, do Bloco de Esquerda, pediram explicações ao Alto Representante para a Política Externa sobre as declarações do embaixador da UE no Brasil, Ignácio Ybáñez, que afirmou rejeitar sanções ao país por incumprimento de metas ambientais, assinalando uma “mudança positiva de atitude” do governo de Jair Bolsonaro.
Já o embaixador de Portugal no Brasil, Luís Faro Ramos, afirmou mesmo notar “uma mudança” de atitude no executivo do país sul-americano.
“O ministro dos Negócios Estrangeiros português, [Augusto Santos Silva], quando falou com o ministro das Relações Exteriores brasileiro, detetou essa mudança e essa boa vontade. Agora, se não forem bem comunicadas, não servem para nada. E aí entramos na questão da percepção. É importante que o Governo brasileiro comunique, explique concretamente, o que está a fazer e como pretende comprometer-se com estas metas”, sublinhou.
BE Contesta
No entanto, para a deputada Marisa Matias, “não houve mudança nenhuma do lado do Brasil”.
“O governo de Bolsonaro está a destruir a Amazônia e a atacar quotidianamente as comunidades indígenas. A mudança que houve foi que o lóbi das multinacionais parece estar a falar mais alto em Bruxelas que a defesa do ambiente e dos direitos humanos. É preciso recuar e não ser cúmplice desta tragédia”, frisou a eurodeputada, citada num texto publicado no Esquerda.net, órgão de informação do BE.
Evocando afirmações do ministro do Ambiente do Brasil, Ricardo Salles, de abril de 2020, sobre como se devia aproveitar a pandemia para aprovar desregulação ambiental, os eurodeputados do BE frisam que, os eurodeputados bloquistas apontam mesmo para um agravamento.
“O que houve foi um aceleramento de publicação de despachos que amnistiam os desmatadores da mata Atlântica, que de janeiro a setembro de 2020 o Ministério do Ambiente gastou apenas 0,4% da verba anual prevista para proteção da biodiversidade e combate às alterações climáticas, e que o mês de setembro ficou marcado pela queda de duas resoluções que restringiam o desmatamento em áreas de preservação ambiental de vegetação nativa”, afirmaram.
Marisa Matias e José Gusmão apontaram ainda que também em abril de 2020 o vice-presidente da Comissão Europeia Valdis Dombrovskis e o próprio embaixador Ignacio Ybáñez afirmaram que o acordo com o Mercosul só seria ratificado se houvesse um claro compromisso ambiental e medidas concretas contra o desmatamento da Amazônia.
O acordo comercial, alcançado em junho de 2019 entre a UE e os países do Mercosul (Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai), após duas décadas de negociações, deverá entrar em vigor ainda este ano, cabendo agora aos países europeus ratificá-lo, uma responsabilidade que o ministro dos Negócios Estrangeiros referiu, no passado dia 07 de janeiro, ser da presidência rotativa do Conselho da UE, que Portugal assumiu no passado dia 01 e que se estenderá até dia 30 de junho de 2021.