Da Redação Com Lusa
Histórias de famílias que viveram a ditadura do Estado Novo, contadas por pessoas reais, estão na base do espetáculo “Os Filhos do Mal”, que estreia nesta quarta-feira, na sala virtual do Teatro Municipal S. Luiz, em Lisboa.
Como as seis personagens viveram a ditadura, de que forma afetou, ou não, as suas vidas, como integraram essas experiências do passado nos seus percursos e de que forma foram determinantes para o seu presente são algumas das questões postas na peça criada pelo ator e encenador André Amálio.
“Um mosaico, uma colagem que nos dá uma ideia de como esse período foi vivido na altura, e que impacto tem na atualidade”, disse André Amálio à Lusa, sobre “Os Filhos do Mal”, que criou para o Teatro Europa, numa produção conjunta desta estrutura com o S. Luiz Teatro Municipal, em Lisboa.
O impacto dessa violência nas gerações seguintes e o modo como as personagens se relacionam com os seus familiares – os que lutaram contra o regime e os que colaboraram com a ditadura portuguesa – é mais uma linha de ação, que verifica como estas histórias foram passadas a descendentes e como estes se relacionam com o regime.
Ao explorar a relação que as gerações nascidas após o 25 de Abril de 1974 têm com a ditadura fascista portuguesa, e quais as memórias desse passado que lhes foram ou não transmitidas, a peça “Os Filhos do Mal” encerra o ciclo iniciado em 2019, na Culturgest, com “Os Filhos do Colonialismo”.
“Trata-se de uma parte da história que foi traumática a todos, sobretudo para os que estavam contra o regime e lutaram para que fosse derrubado”, frisou André Amálio.
Com “Os Filhos do Mal”, o criador tem por objetivo encontrar “respostas de quem somos e de como o passado determina o presente das pessoas”.
Com seis intérpretes, estranhos ao Teatro Europa, “pessoas reais” encontradas no processo de recolha de depoimentos, representando as suas próprias histórias, o espectáculo soma seis meses de preparação, iniciada em setembro de 2020, com a realização de ‘workshops’ destinados a construir as personagens, referiu.
As histórias que são contadas ao longo do espetáculo atravessam cinco décadas, desde os anos de 1930 até à Revolução de 25 de Abril de 1974.
Uma das curiosidades do espectáculo passa pelos próprios intérpretes terem trabalhado muito no aprofundamento das suas histórias pessoais, muitas das quais as famílias não lhes tinham contado ou tinham omitido partes, disse o ator e encenador.
Questionado sobre o porquê do título, “Os Filhos do Mal”, André Amálio disse à Lusa que há que admitir, “sem dúvidas, contemplações ou complexos, que o período da ditadura do Estado Novo foi um período do mal para todos”.
“O período do fascismo é um período do mal. Não pode haver dúvidas nem nostalgias”, afirmou. Muito menos “numa altura em que um partido saudosista da ditadura e do fascismo tende a crescer”.
É necessário, cada vez mais “não branquear a história”, defendeu.
Hotel Europa criou esta nova produção de teatro documental a partir do conceito de “pós-memória”, definido pela professora e investigadora Marianne Hirsch, no seu livro “Postmemory Generation”.
Criado por André Amálio, com Tereza Havlícková, responsável pelo movimento, o espetáculo “Os Filhos do Mal” tem interpetações de Ana Rita Ferreira, Ana Sartóris, João Esteves, Marta Salazar Fernandes, Paulo Quedas e Rita Tomé.
A cenografia é de Sara Franqueira, a criação musical, de Pedro Salvador, e, o desenho de luz e operação, de Joaquim Madail.
“Os Filhos do Mal” ficam em cena até 04 de abril, com representações de quarta-feira a sábado, às 19:00, até 31 de março, período durante o qual ficará disponível até às 24:00.
O espetáculo também poderá ser visto, de 02 a 04 de abril, a partir das 14:00, ficando disponível até às 19:00.
A peça “Os Filhos do Mal” também está disponível para escolas, mediante marcação por e-mail.