Da Redação com Lusa
O ministro português dos Negócios Estrangeiros afirmou que se soubesse o que sabe hoje não teria nomeado o antigo diretor-geral de Recursos da Defesa, detido numa investigação judicial, para a administração de uma empresa pública do setor.
“Num exercício retrospectivo, agregando informação que posteriormente veio a ser conhecida, isto é, sabendo o que sei hoje, obviamente que não o teria nomeado para outras funções. Mas isso é sabendo o que sei hoje, o que é substancialmente diferente da informação de que dispunha no momento de tomada de decisão”, defendeu João Gomes Cravinho.
O governante, que tutelou a Defesa entre 2018 e 2022, foi ouvido no parlamento nesta quarta-feira no âmbito de uma audição requerida pelo PSD, numa intervenção em que insistiu que não autorizou nem lhe foi solicitado qualquer aumento de custos na reconversão do antigo Hospital Militar de Belém.
Cravinho reiterou que não autorizou “nem tacitamente, nem expressamente” e rejeitou responsabilidades políticas.
Como ex-ministro da Defesa, respondeu ainda às dúvidas apresentadas pelos sociais-democratas quanto à nomeação do antigo diretor-geral de Recursos da Defesa e atual detido no âmbito da “Operação Tempestade Perfeita”, Alberto Coelho, para uma empresa pública do setor, a ETI – Empordef Tecnologias de Informação.
Gomes Cravinho fez uma cronologia dos acontecimentos desde 2020, altura em que foi tomada a decisão de reconverter o antigo Hospital Militar de Belém num Centro de Apoio Militar à covid-19 – obra que derrapou de 750 mil euros para 3,2 milhões.
O ministro lembrou que em abril de 2021 – altura em que o processo de nomeação de Alberto Coelho para a Empordef teve início – a informação de que dispunha era que o ex-diretor-geral era uma pessoa com “enorme experiência e conhecimento acumulado na área” bem como “mandatos renovados em vários cargos por governos de várias forças políticas”.
Apesar do relatório da primeira auditoria da IGDN se referir a “inconformidades legais” quanto às obras no hospital, continuou, a mesma entidade “não antecipava a gravidade do que estará agora em investigação”.
“E foi esta IGDN que me propôs a ratificação dos atos do diretor-geral [através de despacho](…). Estamos portanto muito longe de um quadro que apontasse para falta de idoneidade”, sustentou.
Cravinho salientou que o processo de nomeação de Alberto Coelho para a Empordef “começou em abril de 2021, passou pelo crivo da CRESAP [Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública] e foi concluído em 08 de junho 2021”.
“Algumas semanas mais tarde, em meados de julho de 2021 surgiram novas notícias levantando suspeitas graves sobre as empresas contratadas. Parece-me pouco sério alegar que em abril eu deveria agir de acordo com informação que aparece em julho”, respondeu.
Cravinho insistiu que face a essa informação determinou “imediatamente” à Inspeção-Geral da Defesa Nacional (IGDN) que procedesse a uma reavaliação de uma primeira auditoria, tendo em conta as novas informações e que pediu também a esta entidade uma auditoria “de todos os contratos adjudicados no âmbito do Ministério da Defesa Nacional nos últimos três anos às empresas que haviam realizado obras no centro de apoio militar de Belém e aferir da sua idoneidade para a realização das mesmas”.
“A primeira informação que recebo sobre o real custo das obras vem através de um ofício, no qual o meu chefe de gabinete estava em cópia, a 23 de junho de 2020, embora com informação não sistematizada e pouco fundamentada. Esse ofício tinha aparentemente sido enviado por Alberto Coelho [diretor-geral de Recursos da Defesa] em 20 de abril, mas não chegou aos destinatários por exceder o tamanho limite das mensagens e portanto ser recusado pelo servidor”, detalhou Gomes Cravinho.
Cravinho lembrou o contexto pandémico de 2020, salientando que o objetivo do centro de apoio em Belém era criar camas para doentes não urgentes e que o seu despacho de 19 de março desse ano dizia que “o montante [das obras] devia ser o mínimo essencial para atingir o objetivo”.
“Foi também naturalmente devido ao contexto que insisti por e-mail que este processo fosse prioritário e avançasse a todo o gás, o que nunca dispensa o cabal cumprimento de todas as obrigações legais em matéria de contratação pública”, frisou.
O governante salientou que em 27 de março, “através de um ponto de situação da Direção-geral, foi referida a possibilidade de reforçar as valências e a as características do Hospital de Belém tendo em conta trabalhos suplementares solicitados pelo Exército”.
“É bom deixar claro desde já que esses trabalhos extras precisavam de ter a devia validação, (…) a devida orçamentação, cabimentação e a devida autorização. Nada disso aconteceu nem sequer nos foi solicitado a mim ou ao secretário de Estado Adjunto e da Defesa [Seguro Sanches] que déssemos o nosso acordo a esses trabalhos extra – nem tacitamente, nem expressamente”, frisou.
Na sequência de diligências tomadas por Seguro Sanches, em 22 de julho, Cravinho disse ter recebido um despacho “a dizer que teria havido autorização e procedimentos indevidos por parte do diretor-geral” e que sugeria o envio da informação para a IGDN, algo que fez.
“A estimativa inicial de despesa teve uma escalada muitíssimo elevada, para o triplo, sem que a tutela, eu ou o senhor secretário de Estado Seguro Sanches, tivéssemos sido sequer informados. Não houve evidentemente nenhuma autorização da tutela para esta escalada de custos”, concluiu.