Por Jean Carlos Vieira Santos
Escrever sobre os patrimônios encontrados e apropriados pelo turismo no destino internacional Algarve é um desafio para qualquer turista ou viajante, por ser uma região com paisagens seculares e vistas como o legado de povos e comunidades com formas e materialidades distintas. Entre as civilizações mais antigas se destacam os romanos e árabes, em que os últimos são responsáveis pelo nome regional Algarve, advindo do termo Al-Gharb que, em tradução literal, significa “Ocidente”.
Desse modo, a viagem agora transformada em texto se aporta no lugar denominado como Milreu, paisagem cujos principais atrativos são a sua história e a relevância de ruínas luxuosas e decoradas com mosaicos e mármores. São edificações romanas também conhecidas como ruínas de Estói, por estarem localizadas nesse distrito do Concelho de Faro. Vale ressaltar que tal atrativo foi descoberto em 1877 pelo arqueólogo Estácio da Veiga.
Durante a visita, compreendemos que a referida paisagem é testemunho de uma importante vila áulica romana, habitada desde o século I da era cristã, com vestígios de ocupação contínua até o século X; por isso, esse lugar turístico do destino internacional Algarve foi classificada como monumento nacional em 1910. Na formação do espaço vivido de Milreu foi possível perceber, pelas leituras realizadas e durante o momento como turista, que as sociedades romanas e árabes estabeleceram cotidianamente suas relações sociais e culturais nos trabalhos desempenhados, nas possibilidades e imposições oferecidas pelas características físicas da localidade.
Em Milreu, os antigos moradores desenvolveram modos de vida e patrimônios materiais presentes, principalmente, na arquitetura vista como objeto de consumo de turistas e residentes nos dias atuais. A visita durante o inverno europeu nos colocou diante de um ambiente com traços religiosos, crenças, hábitos de lazer e práticas culturais de um período em que o Algarve, sob a luz de um modo vida mediterrâneo, também era romano.
Nesse contexto e à luz da profunda relação histórica do homem com a região Algarve, a vila de Milreu surgiu por meio da organização de áreas rurais fundamental para a prosperidade do Império Romano nos séculos II e I a.C. Esse atrativo é definido nos guias turísticos como antigo espaço urbano rústico originário do crescimento econômico do século I na Hispânia e na Lusitânia e, em uma época romana tardia, foi transformado em edifícios de luxo.
Conforme os folhetos turísticos e a sinalização local, constatamos que a paisagem constituía um pequeno centro onde se fazia a exploração agrícola e que dispunha de uma residência campestre. Assim, durante o nosso tempo turista, notamos no trajeto de visitação as ruínas de dois mausoléus: um deles é atribuído aos séculos I e II e é um pódio retangular com um columbarium abobadado e destinado a receber urnas cinerárias, sobre o qual se erguia um template funerário; e o outro é semelhante ao primeiro e possui uma câmara com sarcófago.
Entre as informações turísticas relevantes verificamos, que no século II, um novo programa de obras fez surgir no local uma residência de peristilo e átrio, construída com sólidos muros de pedras e cal, na qual a parte agrícola era situada ao norte. Ela foi utilizada, sem grandes reformas, até o final do século III, mas passou por profundas alterações da pars rústica – nesse caso, a parte supracitada ficava ao oriente da casa.
Outros atrativos turísticos da paisagem datam do século IV e correspondem aos mosaicos de representações da fauna marítima, presentes nas paredes de uma banheira nas termas e um edifício religioso – ainda conservado nos dias de atuais – até o arranque das abóbadas e que impregna a imagem do lugar. Do esplendoroso colorido desse prédio, testemunhamos os fragmentos de mármore e a parede do pódio, decorada ao redor por um friso de mosaico policromo que figura peixes.
Muros, cornijas em tijolo, colunas, capitéis e placas de balustrada em mármore nos permitem um olhar sobre o patrimônio material e outras formas existentes, como um templo de galeria e um tanque de água poligonal. A visita segue e as informações turísticas são imensas, a exemplo do sítio de Milreu que foi provavelmente abandonado na primeira metade do século X, mas, ao final do século XV ou início do século XVI, passou por uma nova conjuntura, pois, sobre as ruínas, foi erguida uma casa algarvia de arquitetura civil com contrafortes cilíndricos.
A partir desse tempo turista em Milreu, assimilamos algumas linhas da história e cultura do lugar, pois o espaço se tornou uma paisagem de visitação e interação de turistas com o meio, especialmente por ser um território dotado de valores a partir de suas ruínas históricas. Ele forma uma paisagem sociocultural repleta de representações e conteúdos concretos e simbólicos que fazem parte de histórias de viagens e viajantes.
Nesse atrativo algarvio, o turista que viaja pelo destino internacional ainda tem contato com a flora mediterrânica e reconhece, por meio de um circuito botânico, as amendoeiras, os damasqueiros e ciprestes em um trajeto sinalizado que fornece informações de cada vegetação. Essa sinalização ainda explica as formas de cultivo na época dos romanos, ao retratar que, em torno da paisagem, os antigos habitantes cultivavam legumes, figueiras, vinhas e oliveiras. Sendo assim, podemos afirmar que Milreu merece ser visitada e divulgada, por ser um museu de conhecimento para residentes e turistas.
Referências
INSTITUTO PORTUGUÊS DO PATRIMÔNIO ARQUITETÔNICO. Milreu Ruína. Lisboa: IPPAR, 1998.
SANTOS, J. C.V.; GARCIA, D. C.; SANTOS, R. J. Patrimônio Histórico e Arqueológico de Milreu no Circuito Turístico do Algarve – Portugal. UEG em Revista, nº 1, v. 5, p. 167-189, jan-dez, 2009.
Por Jean Carlos Vieira Santos
Professor e Pesquisador da Universidade Estadual de Goiás (UEG/TECCER-PPGEO). Pós-doutorado em Turismo pela Universidade do Algarve (UALg/Portugal) e Doutorado em Geografia pela Universidade Federal de Uberlândia (IGUFU/MG).