Roberto Leal: detalhes de uma vida em prol da cultura portuguesa

“O que podem esperar de mim? Que amanhã eu seja melhor do que sou hoje”, declara Roberto Leal.

 

Por Ígor Lopes
Para Mundo Lusíada

Ele se chama António Joaquim Fernandes e atrai um grande número de fãs. Em causa não está nenhum ator de Hollywood ou jogador de futebol. Esse ídolo a gente encontra nos palcos, mais precisamente no meio da comunidade portuguesa espalhada pelo mundo. Se o seu nome de batismo deixa margens para dúvidas, experimente procurar na Internet quem é o intérprete da canção “Arrebita”. Assim ficou fácil. Estamos falando de Roberto Leal, o cantor português que chegou ao Brasil “sem eira nem beira” e arrebatou multidões ao som das mais famosas músicas populares portuguesas.

Hoje, apesar de um grandioso reconhecimento por parte do público, Roberto não é mais tão visto na mídia nem nas capas das revistas. No entanto, ele não aceita a resignação. Roberto ainda canta para um público apaixonado por suas músicas, foi o astro maior num reality show “cômico” na sua terra natal e está preparando, para Abril de 2013, o “Cruzeiro do Descobrimento”, onde vai cantar em alto mar, numa homenagem ao ano de Portugal no Brasil. Mas esses são apenas alguns dos projetos desse artista lusitano que encantou o Brasil, onde chegou em 1962, aos 11 anos de idade.

Em São Paulo, trabalhou como sapateiro e vendedor de doces, mas foi na música que se realizou. Através de canções românticas e fados, foi ganhando popularidade. Mas foi depois de “Arrebita”, sua primeira música de sucesso, que Roberto conquistou o Brasil, ainda na década de 1970. Foi no programa de Chacrinha que ele teve o seu talento reconhecido, ficando conhecido como o “embaixador da cultura portuguesa no Brasil”.

Em 2011, Roberto decidiu lançar a sua autobiografia “As Minhas Montanhas”. O livro descreve a relação do cantor com os pais, os irmãos e a comunidade local onde nasceu e viveu. Fala da época difícil na “terrinha”, da despedida e da sua chegada ao Brasil, cheio de esperança por um futuro melhor.

Em conversa com o Mundo Lusíada, Roberto Leal “abriu o jogo” e falou sobre sua carreia e seu livro. Disse acreditar ter participado da “atualização” da imagem de Portugal no Brasil e revelou o seu amor pelo nosso país.

Mundo Lusíada (ML): Desde a música “Arrebita”, o que mudou no Roberto Leal que vemos hoje?

Roberto Leal (RL): Quando iniciamos nossa vida, apostamos tudo no que fazemos, porque ainda temos necessidade de tudo. Quando já conquistamos tudo ou quase tudo que tínhamos necessidade, temos então o privilégio de tudo fazermos apenas por ideal.

ML: Em Portugal, pude assistir a alguns dos seus shows. Uma autêntica festa em palco. Que energia é essa que você demonstra? De onde vem esse amor pela música?

RL: No começo da minha carreira no Brasil, a imagem do português por aqui era a de um homem com bigode, dono de padaria, que pouca instrução tinha, mas que dava muito valor ao trabalho. Através da minha música, o público descobriu um povo português alegre e cativante. Hoje, Portugal faz parte de uma Europa concisa, na qual o Brasil aposta cada dia mais.

ML: Em sua opinião, o quão importante foi a sua participação nessa mudança de opinião sobre Portugal por parte do público brasileiro?

RL: Eu tenho consciência de que, com a música, pude contribuir um pouco, levando as pessoas a conhecerem melhor a cultura portuguesa e o nosso povo como gente que não vivia apenas do fado e com o “lápis atrás da orelha”. Se no meio disto eu puder contribuir com algo mais, ficarei feliz. O tempo dirá.

ML: Que opinião tem hoje sobre o Brasil e o que pensou quando pisou aqui pela primeira vez?

RL: Falar sobre a dimensão do Brasil na minha vida é difícil, pois ele divide o meu peito com Portugal. É o país do “hoje”, com uma missão humana acima da política, perante o mundo. Com a responsabilidade de guardar o relicário da dignidade humana, em tempos difíceis que vivemos e viveremos. Foi exatamente o que pensei quando cá cheguei. Só que, naquela época, não imaginava como conseguiria falar com esse tamanho de país.

ML: Passa a maior parte do tempo em Portugal ou aqui no Brasil?

RL: Acho que passo a maior parte do tempo na TAP. (risos)

ML: Mas hoje mora em Portugal?

RL: Sim, oficialmente continuo a viver em Portugal.

ML: Que tipo de relacionamento tem com a sua família?

RL: Somos a extensão uns dos outros. Muito unidos e amigos, falamos abertamente de tudo, sem segredos, sem portas, apenas um profundo e inesgotável amor.

ML: Na vida do show-business, qual é a sua participação?

RL: Embora eu tenha empresários e profissionais para tratar de tudo, preocupo-me com cada detalhe dos espetáculos e das gravações. Desde a escolha do repertorio, arranjos, ensaios, músicos. Tudo.

ML: Como lida com os seus fãs hoje e o que pensa dos de antigamente? Há muitas diferenças?

RL: Não há muitas diferenças nos meus fãs de hoje e de ontem, mas acho que amadurecemos, eles e eu… (risos). Mas, hoje, meu público é mais homogêneo, não há aquela loucura quase histérica que caracterizava os fãs de antigamente – não só os meus. Eu respeito muito e me dedico aos meus fãs. Muitos deles têm meu telefone particular e chego a ficar até três horas após um show conversando com eles e dando autógrafos.

ML: No passado, a imagem de Roberto Leal era a de um artista português que “deu certo” por aqui. Você era facilmente encontrado na mídia. Hoje, essa realidade está mais afastada do seu dia a dia. O que mudou? Por que o Roberto não é mais tão visto na televisão e não participa tanto de programas de rádio?

RL: Penso que mais de 20 anos fora do Brasil faria com que o público nem lembrasse mais o nome de um artista. Eu me sinto um privilegiado por ainda manter minha imagem e o carinho do público brasileiro, apesar de ter saído daqui em 1989.

ML: A sua participação no programa português “O último a sair” foi vista com bons olhos em Portugal e no Brasil. A sua participação foi acompanhada através da Internet. Assim, foi possível ver um Roberto mais solto, sem padrões e cômico. Foi proposital? Procurou mudar a sua imagem?

RL: Não era uma questão de mudar de imagem. Ou eu encarava o desafio do programa e me tornava um ator ou ia pra casa. Aproveitei a oportunidade para mostrar uma caricatura de mim mesmo, o que reforçou minha imagem. As pessoas puderam me conhecer melhor, com minha exposição em situações inusitadas.

ML: E que Roberto existe hoje após aquele programa?

RL: Com certeza um Roberto mais solto, porque o público aceitou muito bem a minha descontração.

ML: O que espera do futuro?

RL: Eu sou um eterno positivo e otimista. Sempre acredito que o melhor ainda está por vir para mim e para os meus, para Portugal, para o Brasil, para o planeta e para a humanidade. Espero um mundo melhor, através de um ser humano melhor.

ML: O que significa “as minhas montanhas”?

RL: Na minha visão, a trajetória de um ser humano pela Terra é como a vida de um alpinista, sempre em busca da próxima montanha por escalar, o próximo desafio, a próxima aprendizagem. Ele não será um bom alpinista se não tentar, se não galgar e, principalmente, se não descer de cada montanha que galgou. Assim, dei ao meu livro o título “As Minhas Montanhas”, justamente por contar minha trajetória de vida, tudo aquilo que aprendi.

ML: O quão íngreme foi a sua vida até aqui?

RL: A vida é íngreme para todos. Se você está bem preparado e equipado, com certeza vai escolher a montanha mais alta no seu horizonte – grandes desafios. Se você está despreparado e mal equipado, qualquer pequena colina lhe será penosa. Mas o importante não é o tamanho da montanha, é o seu tamanho. E, mais do que isto, o quanto você aprendeu a cada escalada.

ML: Qual é o objetivo do seu livro?

RL: O objetivo do meu livro é justamente mostrar às pessoas que cada um tem a montanha apropriada para o seu aprendizado, de acordo com o seu preparo e de acordo com o que cada um consegue enxergar como horizonte. Tentei, então, mostrar como foi minha escalada de vida, as regras que aprendi, os tombos que levei e os que aprendi a evitar.

ML: Em que momento a obra foi escrita e quanto tempo durou para ficar pronta?

RL: Esse livro começou a ser escrito há muitos anos atrás, mas os meses que antecederam minha entrada no programa “O Último a Sair” e os meses em que estive lá foram muito decisivos, pois me obrigaram a pensar e repensar muito minha vida. Esta arrancada final levou cerca de seis meses.

ML: Por fim, na sua opinião, quem é Roberto Leal? O que se pode esperar desse cidadão do mundo?

RL: Roberto Leal é uma pessoa bem intencionada, profundamente apaixonada por tudo o que faz, por seu país (Portugal), por sua família, por sua carreira, pelo país que o acolheu (Brasil) e pela vida, como oportunidade de crescimento e aprendizagem. Apaixonado por DEUS, como princípio único, como motor de vida e meta absoluta. O que podem esperar de mim? Que amanhã eu seja melhor do que sou hoje. É isto que eu espero de mim mesmo.

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