Da Redação com Lusa
Várias centenas de pessoas começaram no Campo Pequeno, em Lisboa, uma marcha em defesa do Serviço Nacional de Saúde (SNS), uma das maiores conquistas de Abril, como defendeu a secretária-geral da CGTP, presente na manifestação.
“O povo merece melhor SNS”, “E o que é que o povo quer? Saúde para viver!” ou “O público é de todos, o privado é só de alguns” são algumas das frases que se ouvem enquanto os participantes caminham em marcha lenta pela Avenida da República, em direção ao Saldanha na tarde deste sábado, no centro de Lisboa.
Em declarações à agência Lusa, Sebastião Santana, coordenador da Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública, um dos promotores da marcha “Pelo Direito à Saúde, Mais SNS, Melhor Saúde!”, apontou que todas estas pessoas têm em comum a defesa de um serviço de saúde universal, uma das maiores conquistas do 25 de Abril de 1974.
A visão foi partilhada pela secretária-geral da Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses – Intersindical Nacional (CGTP-IN), Isabel Camarinha, para quem está hoje em causa o funcionamento do SNS e o seu acesso universal.
Na perspectiva de Isabel Camarinha, faltam meios, faltam melhores salários e melhores condições de trabalho para quem trabalha no SNS.
A marcha “Pelo Direito à Saúde, Mais SNS, Melhor Saúde!” foi convocada por um alargado conjunto de estruturas sindicais e de utentes em defesa e pelo reforço do SNS, com iniciativas a decorrerem em Lisboa, Porto e Coimbra.
Investimento
CGTP-In exigiu mais investimento no SNS, defendendo que a saúde é um direito constitucional que não pode assentar numa política de baixos salários e vínculos precários.
Em declarações aos jornalistas, momentos antes do final da “Marcha pelo Direito à Saúde”, que hoje juntou várias centenas de pessoas a caminhar entre o Campo Pequeno e o Saldanha, em Lisboa, Isabel Camarinha defendeu o direito ao SNS, conquistado com o 25 de Abril e que alterou os padrões de saúde em Portugal.
“É preciso investir e alterar as orientações que têm vindo a ser seguidas de subfinanciamento, desvalorização dos profissionais de saúde, de entrega ao setor privado”, disse a líder da CGTP-In.
Na leitura da dirigente sindical, as várias centenas de pessoas que saíram hoje à rua nesta luta em Lisboa, Porto e Coimbra – numa iniciativa convocada por um conjunto alargado de estruturas sindicais e utentes – afirmaram que “a saúde não é um negócio, mas sim um direito constitucional que o Governo tem de garantir”.
“Para isso é preciso mudar as suas opções, alterar o rumo que está a seguir, investindo de facto e não fingindo que investe”, criticou.
Na opinião de Isabel Camarinha, enquanto não houver uma alteração nas políticas para a saúde, com a respetiva valorização das carreiras, continuará a não haver médicos suficientes, a não haver equipamentos ou condições de trabalho.
A queixa em comum entre as pessoas com quem a Lusa falou na marcha foi a falta de médico de família e a consequente demora em marcar uma consulta.
Luís Ventura, por exemplo, contou que precisou esperar quase 30 anos até ter médico de família, que lhe foi atribuído no ano passado, e quando tentou marcar uma consulta, para um problema que tinha na altura, teve de esperar vários meses.
“Apesar de ter uma parte resolvida, a parte do acompanhamento que se quer na parte dos cuidados de saúde primários continua difícil e quase tudo tem de ser feito à base da consulta de urgência”, criticou, apontando, no entanto, que o SNS é bom “e podia ser muito melhor”.
Mafalda Dias, por seu lado, criticou que o SNS seja atualmente um negócio, em que 40% do orçamento da saúde vai para o setor privado (serviços convencionados e externalizados), ao mesmo tempo que se verifica uma degradação dos serviços públicos.
“Estive muitos anos sem médico de família, ia todos os meses ao centro de saúde tentar coisas simples [como] uma baixa, uma vacina. Meteram-me num centro de saúde que era um balcão de reclamações, até que consegui ter médico de família depois de ir lá todos os meses”, contou.
José Fernandes, que integra a comissão de utentes da Baixa da Banheira (concelho da Moita, distrito de Setúbal), disse que a freguesia tem cerca de 20 mil utentes sem médico de família atribuído.
“Sabemos que a partir do mês de julho vão ficar mais três mil, ou seja, 23 mil utentes sem médico de família”, denunciou, acrescentando que seriam necessários mais 12 médicos e oito enfermeiros de família para que todas as pessoas tivessem cuidados de saúde primários.
Queixou-se igualmente por o centro de saúde estar localizado num prédio com quatro andares, “sem conservação há vários anos”, e criticou o atraso de mais de um ano na conclusão do novo equipamento, depois de o empreiteiro responsável pela obra ter falido em dezembro de 2021.
Presente na marcha, o vice-presidente da Federação Nacional dos Médicos, João Proença, também presidente do Sindicato dos Médicos da Zona Sul, criticou “a gestão e as lideranças que são nomeadas pelos partidos políticos, que não têm a ver com o mérito ou com a democracia”.
“Há uma captura pelos grupos econômicos dos serviços públicos de saúde, o que gera conflito de interesses nas lideranças, nos presidentes dos conselhos de administração, diretores de serviço, que transitam do privado para o público e permitem que os serviços públicos não funcionem”, denunciou João Proença.
A secretária-geral da CGTP-In também chamou a atenção para a falta de condições de trabalho dos profissionais de saúde, que muitas vezes fazem “horas extraordinárias às centenas”.
“Precisamos de investir, precisamos de financiamento, precisamos de alteração de rumo, aumentos de salários, garantia de direitos e de distribuição de riqueza de maneira a garantir os serviços públicos”, defendeu Isabel Camarinha.
A líder sindical frisou ainda que o investimento do Governo na saúde “está longe das necessidades do país”.