Presidente luso afirma que promulgará a lei da Eutanásia porque a Constituição o obriga

Centenas de pessoas junto à Assembleia da República contra a despenalização da eutanásia, em Lisboa, 24 de maio de 2018. Foto TIAGO PETINGA/LUSA

Mundo Lusíada com Lusa

O Presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, afirmou hoje que vai promulgar a lei da eutanásia porque a Constituição que jurou defender não deixa outra alternativa.

“Eu jurei a Constituição. A Constituição obriga o Presidente a promulgar uma lei que vetou e que foi confirmada pela Assembleia da República (…) é o meu dever constitucional”, disse Marcelo Rebelo de Sousa, à margem da sessão comemorativa do 100.º aniversário da Nestlé Portugal, hoje em Estarreja, no distrito de Aveiro.

Questionado sobre a confirmação por parte do parlamento do decreto sobre a morte medicamente assistida, que tinha sido anteriormente vetado por si, o Presidente da República antecipou que irá promulgar a lei dentro do prazo de oito dias a contar da sua recepção em Belém.

Marcelo recusou-se a comentar se a decisão do parlamento constitui uma afronta ao chefe de Estado, limitando-se a dizer que tem de cumprir a Constituição. “A Assembleia confirma, o Presidente promulga”, afirmou.

O diploma sobre a morte medicamente assistida, que tinha sido vetado pelo Presidente da República, foi confirmado esta sexta-feira com um total de 129 votos a favor, 81 votos contra e uma abstenção, resultados anunciados pelo presidente do parlamento, Augusto Santos Silva, no final da votação.

Votaram a favor a esmagadora maioria dos deputados das bancadas do PS, IL, BE, e os representantes do PAN e Livre.

Quanto à bancada do PSD, sete parlamentares anunciaram o voto favorável (Adão Silva, Maló de Abreu, Rosina Pereira, Hugo Carvalho, Mónica Quintela, Sofia Matos e Catarina Rocha Ferreira), mas o quadro eletrónico dos serviços registrou oito.

Mais tarde, contactada pela Lusa, a deputada do PSD Lina Lopes esclareceu que votou a favor (confirmando os oitos votos favoráveis na bancada social-democrata do quadro eletrónico), não tendo sido dito o seu nome uma vez que estava a exercer funções na Mesa.

Este total ultrapassou largamente os 116 votos necessários para a confirmação.

Votaram contra o diploma a grande maioria da bancada do PSD, os grupos parlamentares do Chega e do PCP, bem como quatro deputados do PS: João Azevedo, Cristina Sousa, Joaquim Barreto e Sobrinho Teixeira.

O decreto contou ainda com uma abstenção, a do deputado do PSD Jorge Mendes. No total, segundo o quadro dos serviços da Assembleia, estiveram presentes em plenário 211 deputados.

Foi a quinta vez que os deputados aprovaram um decreto sobre o tema.

De acordo com a Constituição da República, perante um veto, o parlamento pode confirmar o texto por maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções, 116 em 230, e nesse caso, o Presidente da República terá de promulgar o diploma no prazo de oito dias a contar da data da recepção.

O Decreto

O decreto estabelece que a morte medicamente assistida só poderá ocorrer através de eutanásia se o suicídio assistido for impossível por incapacidade física do doente.

“Considera-se morte medicamente assistida não punível a que ocorre por decisão da própria pessoa, maior, cuja vontade seja atual e reiterada, séria, livre e esclarecida, em situação de sofrimento de grande intensidade, com lesão definitiva de gravidade extrema ou doença grave e incurável, quando praticada ou ajudada por profissionais de saúde”, lê-se no decreto.

Neste texto, que tem por base projetos de lei de PS, IL, BE e PAN, ‘sofrimento de grande intensidade’ é definido como “o sofrimento decorrente de doença grave e incurável ou de lesão definitiva de gravidade extrema, com grande intensidade, persistente, continuado ou permanente e considerado intolerável pela própria pessoa”.

O decreto estabelece ainda um prazo mínimo de dois meses desde o início do procedimento para a sua concretização, sendo também obrigatória a disponibilização de acompanhamento psicológico.

De acordo com o texto, “o Governo aprova, no prazo de 90 dias após a publicação da presente lei, a respectiva regulamentação” e a lei entra em vigor 30 dias “após a publicação da respetiva regulamentação”.

Este é o quarto diploma do parlamento que visa despenalizar a morte medicamente assistida, alterando o Código Penal. O tema já foi alvo de dois vetos políticos do chefe de Estado e dois vetos na sequência de inconstitucionalidades decretadas pelo Tribunal Constitucional.

O último veto ocorreu no passado dia 19 de abril, altura em que Marcelo Rebelo de Sousa pediu aos deputados para clarificarem “quem define a incapacidade física do doente para autoadministrar os fármacos letais, bem como quem deve assegurar a supervisão médica durante o ato de morte medicamente assistida”, lê-se na carta que o chefe de Estado dirigiu ao parlamento.

Em declarações aos jornalistas, Marcelo Rebelo de Sousa afastou dúvidas de constitucionalidade sobre o decreto, declarando que o vetou por “um problema de precisão”, e considerou que a ser confirmado “não tem drama”.

O PSD já assumiu o compromisso de “analisar o diploma com vista a formular pedido de fiscalização sucessiva da constitucionalidade”, instrumento de recurso para o Tribunal Constitucional que nos termos da Constituição pode ser feito por um décimo dos deputados, 23 em 230.

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