Portugal propõe converter dívida dos países da CPLP em apoio à transição ambiental

São Tomé e Príncipe, 27.08.2023 - Presidentes participam da sessão de abertura da XIV Conferência de Chefes de Estado e de Governo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). Foto: Ricardo Stuckert/PR

Mundo Lusíada com Lusa

Portugal está disponível para converter a dívida dos Estados-membros em apoios à transição ambiental, à semelhança do que acontece com Cabo Verde, afirmou hoje o primeiro-ministro português, na cimeira da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

Na sua intervenção durante a sessão restrita da 14.ª conferência da organização lusófona, que decorre hoje em São Tomé, António Costa disse que Portugal está disponível para “trabalhar com cada um dos Estados-membros da CPLP para também converter a dívida em fundo de investimento em ambiente, na energia, na água, na reciclagem, de forma a acelerarmos esta transição”.

O ponto de partida desta proposta é trabalhar “com base num projeto-piloto” que Portugal arrancou com Cabo Verde: a “criação do Fundo Climático e Ambiental”, que será aprovado formalmente pela Praia em outubro, explicou o governante.

Neste projeto, “Portugal comprometeu-se a converter a dívida de Cabo Verde em investimento na transformação ambiental”.

Costa também propôs um programa de intercâmbio acadêmico que permita a frequência de um semestre noutro país da organização.

“Que daqui até 2026, possamos conseguir ter nos nossos diferentes países pelo menos um curso onde todos sejamos certificados para podermos ter ao nível da CPLP uma frequência como o programa europeu Erasmus”, disse António Costa no seu discurso na cimeira, em São Tomé, apelidando este novo projeto de ‘Frátria’, numa evocação à expressão ‘Mátria’ de Caetano Veloso.

O objetivo é, “pelo menos em cada um dos cursos, em cada uma das universidades, de cada um dos nossos países, ter um semestre reconhecido para que os nossos jovens possam circular mais entre todos os nossos países”, disse o governante português, que citou a sua origem pessoal para a ideia deste projeto.

“Como muitos saberão, o meu pai nasceu em Goa e eu fui assistindo ao longo dos anos de como se foram deslaçando as relações entre Goa e o resto da comunidade lusófona”, referiu.

“A minha geração foi a última geração que aprendeu na escola primária que o monte Ramelau tem 2.963 metros de altitude”, ou “quais são os rios de Moçambique, do Rovuma até ao Maputo”, exemplificou.

“Se queremos garantir futuro à nossa comunidade, é fundamental promover a mobilidade dos nossos jovens e criar este programa que estimula a circulação dos estudantes universitários”, disse o primeiro-ministro português.

Guiné

Já o Presidente português considerou hoje que a Guiné-Bissau assumir a próxima presidência da CPLP será a oportunidade de projetar o país para o futuro e dar um “salto qualitativo”.

Falando aos jornalistas no final da 14.ª Conferência de chefes de Estado e de Governo, Marcelo Rebelo de Sousa considerou que esta decisão “tem toda a lógica”.

“A Guiné-Bissau vai ser o primeiro Estado a comemorar os 50 anos da sua independência, este ano, em novembro. Faz todo o sentido que também tenha essa grande oportunidade que é celebrar não o passado, mas projetá-lo para o futuro”, afirmou.

O chefe de Estado assinalou que a presidência da Guiné-Bissau, entre 2025 e 2027, sucedendo a São Tomé e Príncipe, vai coincidir com os 30 anos da CPLP.

“É a tal oportunidade de a Guiné-Bissau entrar neste salto qualitativo que importa, sobretudo, à juventude, mas importa a toda a gente”, defendeu, salientando que “o que interessa é que a CPLP valha para o futuro e não valha por aquilo que já fez no passado”.

Questionado sobre se a decisão foi consensual entre todos os países, Marcelo Rebelo de Sousa indicou que “foi uma decisão muito simples”.

O Presidente da República assinalou que na última cimeira, em Luanda, tinha sido escolhido São Tomé, mas o país “ia ter eleições, era preciso as novas autoridades confirmarem”.

Colocando-se a questão “se não for São Tomé e Príncipe, quem poderá ser”, surgiu “logo a ideia da Guiné-Bissau”, continuou.

Como São Tomé acabou por assumir a presidência, que arrancou hoje, “de imediato ficou claro, decorrendo do que se tinha falado em Luanda, que a seguir a São Tomé e Príncipe, ia ser a Guiné-Bissau, e é o que vai acontecer”, afirmou Marcelo Rebelo de Sousa.

A Guiné-Bissau vai assumir a próxima presidência rotativa da CPLP no mandato entre 2025 e 2027, sucedendo a São Tomé e Príncipe, foi hoje anunciado.

No sábado, em declarações à Lusa, o ministro das Relações Exteriores equato-guineense, Simeón Esono Angue, manifestou a intenção de o seu país presidir à CPLP.

No mesmo dia, o primeiro-ministro português fez escala técnica na Guiné-Bissau, a caminho de São Tomé e Príncipe, e expressou o apoio de Lisboa à presidência da Guiné-Bissau, que foi admitida pelo homólogo guineense, Geraldo Martins.

À chegada a São Tomé, também no sábado, o chefe de Estado português já tinha defendido que deveria ser Bissau a assumir a liderança da organização.

Brasil

Já o Presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, defendeu hoje, na cimeira de São Tomé, que a CPLP proponha que o português seja língua oficial das Nações Unidas.

A proposta do Presidente brasileiro surgiu durante a sessão restrita da 14.ª cimeira, num momento em que os chefes de Estado e de Governo aprovaram as resoluções.

“Temos de aproveitar que temos um secretário-geral das Nações Unidas que fala português [o ex-primeiro-ministro português António Guterres] e acho que nós deveríamos entrar com informações e um pedido nas Nações Unidas para que a língua portuguesa seja transformada em língua oficial das Nações Unidas”, propôs Lula da Silva, recebendo aplausos dos presentes.

O Presidente são-tomense, Carlos Vila Nova, que assumiu hoje a presidência rotativa da CPLP e conduzia os trabalhos da cimeira, respondeu: “Muito bem, Presidente Lula, está registrado, vamos continuar este trabalho e certamente teremos o objetivo conseguido”.

O presidente Lula lembrou que os países da CPLP reúnem quase 300 milhões de consumidores, espalhados por quatro continentes e com um PIB de US$ 2,3 trilhões.

“As transições digital e ecológica precisam ser aproveitadas para gerar oportunidades e evitar a concentração de renda e a desigualdade. A promoção do comércio e de investimentos deve garantir empregos dignos e verdes, e ter como objetivo a diversificação de nossa pauta exportadora para além das commodities. A iniciativa angolana de incorporar a cooperação econômica como novo pilar da nossa comunidade ajudará a interligar nossos mercados”, disse.

Cabo Verde

O Presidente de Cabo Verde, José Maria Neves, defendeu hoje em São Tomé que as ” muitas e legítimas aspirações” da juventude só se podem concretizar “num ambiente são, democrático, moderno, próspero e com oportunidades para todos”.

José Maria Neves, que intervinha na XIV Conferência de chefes de Estado e de Governo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), disse registar “com satisfação” que os jovens, à escala global, “se mostram conscientes das preocupações de formação de uma nova ordem mundial, de guerras geoestratégicas, de migrações sem precedentes, de mudanças climáticas, de fortes assimetrias entre países industrializados e desenvolvidos e países fornecedores de matérias-primas e subdesenvolvidos — os ‘termos de intercâmbio’ são, desgraçadamente, desiguais”.

“O crescimento terá de ser necessariamente inclusivo e ambientalmente sustentável”, frisou.

Referindo-se à realidade do seu país, e também de São Tomé e Príncipe e Guiné-Bissau, que definiu como “pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento”, salientou que os três sofrem “de forma particular, as nefastas consequências das alterações climáticas, eventualmente mais gravosas do que nos demais membros” da CPLP.

“Localização remota, reduzida dimensão territorial e demográfica, a exposição aos efeitos climáticos extremos contribuem para uma maior vulnerabilidade económica e ambiental”, afirmou.

Em seguida, José Maria Neves abordou a insegurança alimentar que se vive nalguns espaços dos Estados-membros e, socorrendo-se de uma afirmação feita no passado pelo seu homólogo brasileiro, Lula da Silva, declarou que “muitas pessoas não conseguem tomar café, almoçar e jantar todos os dias”.

“Reclamamos da subida dos preços dos combustíveis e da insegurança energética. A verdade é que uma percentagem apreciável da população não tem acesso à eletricidade. A isto se junta muitos jovens, ainda em idade escolar, mas que não frequentam a escola, por razões diversas”, salientou.

Esses “feixes de problemas” devem ser prioridades da CPLP, destacou, sugerindo que se integrem “os direitos e deveres dos jovens, com destaque para a garantia de acesso ao sistema de ensino e à formação, capacitando-os para enfrentar o mercado de trabalho, cada vez mais global e mais competitivo, e poder construir projetos de vida com perspetivas de futuro — por enquanto, um sonho de muitos — de mais realização e dignidade”.

O Presidente cabo-verdiano abordou ainda a questão da mobilidade no seio da CPLP e defendeu “a necessidade de desapertar alguns espartilhos que ainda cerceiam a mobilidade e o intercâmbio de jovens”.

Essas dificuldades “em nada favorecem a tão necessária e requerida troca de experiências”.

Segundo Lula, para efetivar a implementação desse acordo, o Brasil vai regulamentar a emissão de vistos para a comunidade acadêmica, científica, cultural e empresarial.

A CPLP, que integra Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste, realiza hoje a 14.ª conferência de chefes de Estado e de Governo, em São Tomé e Príncipe, sob o lema “Juventude e Sustentabilidade”.

 

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