Da Redação
Com Lusa
Maria Helena Pereira saiu com oito anos de Castro Daire, rumo ao Brasil, e por lá viu desvanecer-se a imagem de uma terra, onde regressa agora para perceber que este Portugal já não é o de Salazar.
A emigrante, de 67 anos, 59 dos quais vividos no Brasil, chegou há dois dias para visitar Portugal, pela primeira vez em mais de meio século, ao abrigo do programa “Portugal no Coração”, do Governo português.
“Não venho a Portugal há 59 anos. Fui para o Brasil com oito anos e agora regressei neste projeto maravilhoso”, disse à agência Lusa a emigrante natural de Coura, no concelho de Castro Daire, e residente em Maricá, cidade dormitório dos arredores do Rio de Janeiro.
Maria Helena Pereira integra o grupo de 15 emigrantes que foram recebidos, em Lisboa nesta terça-feira, pela secretária de Estado das Comunidades, Berta Nunes, e que até 21 de novembro vão visitar várias regiões portuguesas.
Funcionária bancária forçada ao desemprego por sucessivas crises econômicas no Brasil, a emigrante, agora aposentada, nunca conseguiu visitar Portugal, mantendo com o país uma ligação à distância, hoje muito mais facilitada pela Internet.
Ainda assim, depois de dois dias em visitas pela região de Lisboa – o programa começou em 09 de novembro – Helena Pereira não esconde a surpresa de descobrir um país muito diferente do que se lembrava.
“É totalmente diferente. Não é mais o Portugal de Salazar. Está uma maravilha. Apaixonei-me. Não tinha ideia, com a idade que tinha, de como isso era tão bonito e agora, além de bonito, estamos a progredir e a melhorar”, disse.
Do Brasil, onde há anos perdeu um irmão na sequência de um assalto, queixa-se da violência “cada vez pior” e diz que até ponderava viver em Portugal, mas o custo de vida não lhe deixa margem para o sonho de um regresso.
“Até voltaria, só que com o meu salário de aposentada não dá para morar aqui”, afirmou.
Por agora, prepara-se para aproveitar a visita e mostra-se especialmente entusiasmada por, na próxima semana, poder regressar a Coura para rever o rio e a fonte onde, contou, na infância, diariamente ia buscar água.
“Este programa realiza o sonho de muitas pessoas, faz uma pessoa voar num espaço de felicidade e trazer felicidade a alguém é muito bom”, adiantou.
Mais comedido nas palavras, Orlando João Caetano, 72 anos, residente na Argentina há 70, sem nunca ter regressado a Faro, onde nasceu, ou a Lisboa de onde, aos dois anos de idade, partiu de barco com os pais.
“Vim à nossa terra. Lisboa é muito bonita”, disse à Lusa.
Aposentado, com um filho e uma irmã na Argentina e alguns parentes ainda a viver no Algarve, Orlando Caetano, trabalhou praticamente toda a vida como motorista.
“Percorri toda a Argentina. De Portugal, não tenho nenhuma memória”, disse este filho de agricultores que fugiram do Algarve à procura de melhor vida na América do Sul.
A edição deste ano do programa “Portugal no Coração” traz a Portugal 15 emigrantes portugueses residentes na África do Sul, Argentina, Brasil e Venezuela.
A iniciativa proporciona uma visita a Portugal a portugueses com mais de 65 anos, residentes no estrangeiro e que não visitam o país há mais de 20 anos.
O programa decorre até 21 de novembro e inclui visitas turísticas e culturais nos distritos do Porto, Lisboa, Leiria e Guarda.
“Queremos estar próximo das nossas comunidades. Este programa já trouxe mais de 800 pessoas a Portugal e temos de continuar, não só para que estas pessoas tenham essa oportunidade, mas também para passar a mensagem de que eles são sempre portugueses e queremos que sintam que fazem parte do país […] e que não são estranhos”, disse, por seu lado, a secretária de Estado das Comunidades, Berta Nunes.
A responsável pela pasta da emigração sublinhou ainda a importância de manter este programa, que está em vigor desde 1996 e resulta de uma parceria entre o Ministério dos Negócios Estrangeiros (gabinete da secretária de Estado das Comunidades Portuguesas), Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (Fundação Inatel) e TAP Air Portugal.
Visita a França
Berta Nunes inicia, na quinta-feira, uma visita a França, sua primeira viagem oficial às comunidades e durante a qual espera perceber como responder às necessidades das várias gerações de emigrantes.
A visita inicia-se na quinta-feira e termina dia 19 de novembro, tendo previstas paragens em Paris, Bordéus e Lyon.
Antecipando as expectativas sobre a deslocação, hoje, em Lisboa, Berta Nunes evocou as diversas gerações de portugueses que compõe a comunidade portuguesa de França.
“É o país que tem mais emigrantes, onde várias gerações de portugueses estão. Comunidades bastante diversas e heterogêneas, que mostram também a riqueza que podemos encontrar numa comunidade como a de França”, disse.
Nesta comunidade, assinalou a governante, estão os que emigraram no século passado e já estão reformados, mas também os jovens qualificados, que representam um país mais desenvolvido e moderno, ou os empresários bem-sucedidos.
“Para mim vai ser importante perceber essa diversidade, perceber que têm necessidades diferentes, que necessidades têm e como é que podemos fazer esta ligação de uma forma significativa para esses [vários] emigrantes”, afirmou.
Continuidade da política de atração de investimentos dos emigrantes, da criação e apoio aos Gabinetes de Apoio ao Emigrante e das políticas de cultural e de promoção da língua foram algumas das prioridades elencadas pela nova secretária.
A comunidade portuguesa em França está estimada em cerca de um milhão de pessoas, segundo a embaixada de Portugal em França, com a chegada da primeira vaga de emigrantes a registar-se na década de 1960.