Da Agencia Lusa
As suspeitas de corrupção no desporto marcaram os anos da XIII legislatura, com a erupção de diversos casos mediáticos no futebol que preencheram a atualidade noticiosa e colocaram a atuação da Justiça sob intenso escrutínio.
E-toupeira, Emails do Benfica, Cashball, Jogo Duplo, Mala Ciao e Vouchers: os nomes destes processos tornaram-se uma presença constante no quotidiano dos portugueses. Sobre o funcionamento do poder judicial caiu o perigoso peso de paixões clubísticas, contribuindo para juízos populares numa área que é independente da esfera do Governo, mas sobre a qual a Assembleia da República até agiu desde 2015.
Com efeito, foi já nesta legislatura que o parlamento alterou a Lei n.º 50/2007, que estabelecia o Regime de Responsabilidade Penal por Comportamentos Antidesportivos. A Lei nº 13/2017, baseada em projetos de lei de PS, PSD e CDS, definiu um “novo regime de responsabilidade penal por comportamentos suscetíveis de afetar a verdade, a lealdade e a correção da competição e do seu resultado na atividade desportiva”.
Em vigor desde 3 de maio de 2017, a nova disposição veio agravar as molduras penais a aplicar aos crimes de corrupção no desporto, nomeadamente o crime de corrupção passiva, cuja pena máxima passou de cinco para oito anos, e o crime de corrupção ativa, em que a pena máxima subiu de três para cinco anos. Também as punições para o crime de tráfico de influências foram revistas em alta.
Contudo, o tempo das notícias e o tempo da política são distintos do tempo da justiça e todos estes processos continuam ainda por conhecer o seu fim. Dos casos citados, apenas o processo cível ligado aos emails do Benfica se traduziu parcialmente numa decisão, com o tribunal cível do Porto a condenar o FC Porto e o seu diretor de comunicação, Francisco J. Marques, a uma indemnização de cerca de dois milhões de euros ao Benfica pela divulgação dos emails.
No próprio dia da sentença, 7 de junho, os dragões anunciaram o recurso para o Tribunal da Relação do Porto da decisão proferida pelo juiz presidente do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, José António Rodrigues da Cunha, argumentando que esta “penaliza a divulgação de informação que o próprio tribunal reconheceu como verdadeira”.
No entanto, os emails que alegadamente configuravam um esquema do clube da Luz para controlar a arbitragem permanecem sob investigação no processo crime em que o Ministério Público (MP) juntou também o caso dos Vouchers — que surgiu em 5 de outubro de 2015, quando o então presidente do Sporting, Bruno de Carvalho, denunciou alegadas ofertas do Benfica a árbitros, observadores e delegados, mas que já foi arquivado na justiça desportiva.
Deste megaprocesso faz ainda parte o caso Mala Ciao, desencadeado em 25 de junho de 2018, que visa igualmente o Benfica e no qual está em causa a alegada compra de passes de jogadores como forma de contrapartida de corrupção desportiva e pagamento de incentivos a equipas adversárias para vencer o FC Porto. A investigação deste caso atingiu ainda Desportivo das Aves, Vitória de Setúbal, Paços de Ferreira e Marítimo.
Na origem da divulgação dos emails do Benfica suspeita-se que possa estar Rui Pinto, colaborador do ‘Football Leaks’, que foi detido na Hungria, ao abrigo de um mandado de detenção europeu, e depois entregue às autoridades portuguesas.
O jovem de 30 anos, que está indiciado por seis crimes (dois de acesso ilegítimo, dois de violação de segredo, um de ofensa a pessoa coletiva e outro de extorsão na forma tentada) por acessos ilegais aos sistemas informáticos do Sporting e da Doyen, aguarda a conclusão da investigação do MP, estando em prisão preventiva desde 22 de março.
Já o processo E-toupeira envolveu a SAD do Benfica, o agora ex-assessor jurídico dos encarnados Paulo Gonçalves e dois funcionários judiciais, Júlio Loureiro e José Silva, que alegadamente forneciam informações sobre inquéritos a troco de bilhetes, convites e ‘merchandising’ do clube.
A acusação do MP imputava à SAD do Benfica um crime de corrupção ativa, um crime de oferta ou recebimento indevido de vantagem e 28 crimes de falsidade informática. Todavia, a juíza Ana Peres, do Tribunal Central de Instrução Criminal, entendeu não levar a julgamento a SAD ‘encarnada’ – permitindo assim ao Benfica escapar a eventuais sanções desportivas -, bem como o funcionário judicial Júlio Loureiro.
Apenas Paulo Gonçalves, pelos crimes de corrupção ativa e violação de segredo de justiça, e o oficial de justiça José Silva, pelos crimes de corrupção passiva e peculato, vão responder em julgamento a partir de 25 de setembro, embora sobre este processo está ainda pendente o recurso do MP para o Tribunal da Relação de Lisboa no sentido de pronunciar também a SAD do Benfica.
O Benfica esteve no epicentro da maioria dos casos que abalaram os últimos anos, mas também o Sporting se viu envolvido em 2018 no processo Cashball, que investiga um suposto esquema dos leões para viciação de resultados no futebol e no andebol, chegando a envolver os nomes de Bruno de Carvalho e do ex-team manager do clube, André Geraldes. O caso continua em investigação.
Igualmente em investigação está o caso Lex, sobre suspeitas de corrupção/recebimento indevido de vantagem, branqueamento de capitais, tráfico de influências e fraude fiscal. Embora não seja um processo de natureza estritamente desportiva, acabou por incluir também o presidente do Benfica, Luís Filipe Vieira, no lote de arguidos.
Numa fase mais avançada está já o processo Jogo Duplo, lançado em 14 de maio de 2016, que levou a julgamento oito antigos jogadores do Oriental, ex-futebolistas do Oliveirense, Penafiel e Académico de Viseu e ainda dirigentes, empresários e pessoas ligadas ao negócio das apostas desportivas. A leitura do acórdão do processo, com 27 arguidos e relacionado com viciação de resultados, está marcada para 25 de outubro.