Peça da vida e obra de Clarice Lispector em cartaz em Lisboa

Da Redação com Lusa

A vida e obra de Clarice Lispector estão na base de “Eu sou Clarice”, texto e encenação de Rita Calçada Bastos, com interpretação de Carla Maciel, que estreia essa semana no Teatro Municipal São Luiz, em Lisboa.

O “objeto teatral” resulta do “eco” que “a escritora maior” tem na vida da atriz e encenadora Rita Calçada Bastos desde que “há mais de vinte anos” leu pela primeira vez uma obra da autora, “A hora da Estrela”, disse a criadora à agência Lusa.

“Não quisemos, de maneira alguma, fazer uma mimese da Clarice, mas sim tentar entrar na sua essência e não explicar o que se é, ser só que se é”, frisou a autora do texto e da encenação.

Saber “quem era a pessoa que estava por trás da obra, a sua experiência de vida, como a entendia, o que a inquietava”, esteve sempre muito presente no caso de Clarice, acrescentou Rita Calçada Bastos.

Porque “ela [Clarice Lispector] é antes, ela é quase, ela é tudo”, disse a encenadora sobre a jornalista e escrita brasileira, nascida na Ucrânia, em 1920, que morreu em 1977, no Brasil, na véspera de completar 57 anos.

“Eu sou Clarice” é o segundo espetáculo da trilogia iniciada por Rita Calçada Bastos, em março último, com “Se eu fosse Nina”. Estreado na sala ‘online’ do S. Luiz, tratava-se de um monólogo no qual a criadora cruzava a personagem Nina, de “A gaivota de Tchekhov, com a sua própria biografia.

No palco da sala Mário Viegas, “Eu sou Clarice” desenvolve-se não como um monólogo, já que Carla Maciel vai dando corpo ao espetáculo “interpelada” por uma voz ‘off’, que é a de Rita Calçada Bastos – uma voz que “tanto pode corresponder à do criador, como à da escritora…”, disse a autora à Lusa.

“Gostava que isso ficasse em aberto e o público tirasse as suas ilações”, indicou a encenadora, assumindo, todavia, que essa voz ‘off’ corporiza “o efeito” que a escritora brasileira tem em si.

É “a criadora que precisa da atriz para saber quem é”, indicou, acrescentando que “este esquema da criadora falar com a atriz” lhe foi “sugerido” por uma personagem de “Um sopro de vida”, o último romance da autora brasileira publicado um ano após a sua morte.

A “estranha, a estrangeira, a hermética, a mãe, a mulher, a dona de casa, a pessoa que é capaz de ir morrendo por aqui e por ali para conseguir ser”, é como Rita Calçada Bastos define Clarice Lispector, “uma escritora da alma e do mundo”.

Ao contrário de “Se eu fosse Nina”, em que “a personagem acaba por morrer sem que o público saiba se quem tinha morrido fora a personagem ou a atriz”, em “Eu sou Clarice” assiste-se a uma “libertação da atriz em relação ao criador”.

Neste espetáculo, ao longo do qual Carla Maciel vai servindo “a necessidade que o criador tem de se conhecer”, assiste-se também a uma libertação da atriz “que decide ter outra vida”.

Acha que Clarice “é demasiado genial e isso oprime-a”, não consegue ser quem é, “porque não é suficiente perante a genialidade da Clarice que, de facto, é tremenda”, acrescentou Rita Calçada Bastos, preferindo não desvendar mais pormenores sobre o espetáculo.

“É não ter de mostrar o que se é, mas ser só, que era algo que a escritora perseguia muito. Porque não se define a coisa em si – a coisa é”, acrescentou.

Rita Calçada Bastos sublinha assim “o extraordinário alcance filosófico de Clarice Lispector e da sua obra”.

Ao longo de “Eu sou Clarice”, Clara Maciel vai citando várias frases da autora – como “Só quem voa sabe quanto pesa um corpo”, “Eu sou duas cadeiras e uma maçã” – imagens constantes da obra da escritora que Rita Calçada Bastos acredita ter um impacto enorme em quem a lê.

“Não acredito que sejamos a mesma pessoa antes de ler a obra de Clarice Lispector e depois de a ler”, concluiu a encenadora.

Até 24 de outubro, na sala Mário Viegas, “Eu sou Clarice” tem sessões de segunda a sábado, às 19:30, e, ao domingo, às 16:00.

Na assistência de dramaturgia está Maria Quintans, nos figurinos, Rute Osório de Castro e, na cenografia, Close2Paradise.

A luz é de Paulo Santos e, o som, de Hugo Neves, numa produção conjunta da Close2Paradie, da RTP – Rádio e Televisão de Portugal e do S. Luiz Teatro Municipal.

“À procura de Chaplin” é o espetáculo que encerará a trilogia e que, embora ainda não tenha local nem data marcada para a estreia, Rita Calçada Bastos avançou à Lusa que deverá ocorrer “no final de 2023”, coincidindo com a reabertura da temporada de teatro.

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