Por Carlos Fino
Foi uma semana trágica para a Europa – três violentos atentados terroristas em Bruxelas, reivindicados pelo chamado Estado Islâmico, provocaram 28 mortos e centenas de feridos, suscitando um clima de perplexidade, insegurança e medo que irá certamente perdurar.
O ataque ao Bataclan, em Paris, em Novembro passado, perpretado pela mesma rede, foi ainda mais letal – 130 mortos. Mas, depois desse choque, acreditava-se, pelas medidas policiais de excepção entretanto adoptadas, que a situação estivesse minimamente controlada.
As explosões de Bruxelas tiveram por isso ressonância e simbologia particulares – surpreenderam tudo e todos, evidenciando as debilidades dos serviços de segurança e levando o caos e o pânico a dois eixos cruciais da capital administrativa da Europa: o aeroporto e uma das principais linhas do metropolitano, bem junto às sedes da Comissão e do Conselho Europeu.
Sabe-se agora que os atentados de Paris e Bruxelas tiveram a mesma origem – o bairro periférico e pobre de Molenbeek, na capital belga, onde predomina a comunidade de origem marroquina e um terço dos jovens não tem emprego. Foi lá que dias antes a polícia deteve Salah Abdeslam, o franco-marroquino de 26 anos suspeito de ser um dos terroristas por detrás dos ataques do ano passado em França.
Atingida na sexta, 18, a organização terrorista ripostou na terça, 22, com toda a violência. A rapidez da resposta faz pensar que tudo estava já preparado e mostra que a rede de apoios locais tem maior amplitude do que se considerava.
Mais preocupante ainda é o facto dos implicados terem ligações com grupos radicais na Síria e no Estado Islâmico/EI.
Pressionado por americanos e iraquianos, a leste, e por russos e sírios a oeste, o EI está em claro recuo, tendo perdido, nos últimos meses cerca de 1/3 do território que controlava, incluindo a cidade histórica de Palmira.
Mas tem ainda uma arma muito poderosa – os milhares de jovens europeus que combateram ou tiveram treino nas suas fileiras, muitos dos quais estão a regressar ao continente, aparentemente com a missão de criar células capazes de atacar quando considerado oportuno.
Para enfrentar esse perigo, os europeus precisariam de maior cooperação na segurança interna, área que tem progredido pouco (a própria Europol funciona mais como um organismo de mera distribuição de informação) e que pode agora defrontar-se com resistências ainda maiores dada a presente tendência para a renacionalização das políticas, na sequência da crise dos refugiados.
Como já acontecera com os EUA depois do 11 de Setembro, a Europa terá agora também de equacionar até onde deverá ir em termos do inevitável reforço das medidas de segurança, por forma a não comprometer o essencial das suas liberdades.
Alguns, aproveitando a compreensível emoção criada pelos atentados, poderão querer impor um clima de intolerância do estilo “quem não está conosco, está contra nós”. Contra isso, haverá que preservar o espaço de diálogo em que seja possível questionar algumas das políticas europeias que podem ter contribuído para gerar os perigos que agora espreitam o continente.
Depois da invasão americana do Iraque, por exemplo, a acção militar da Inglaterra e da França, com o apoio da Nato, para derrubar Kadhaffi, revelou-se um desastre – transformando a Líbia de país estável em região caótica e desprotegendo o flanco sul da Europa.
Nesta medida, os atentados de Bruxelas funcionaram como um alerta múltiplo. Saberá a Europa ouvi-lo?
Por Carlos Fino
Jornalista português, nascido em Lisboa, em 1948. Correspondente da RTP – televisão pública portuguesa – em Moscou, Bruxelas e Washington, destacou-se como correspondente de guerra, em conflitos armados na ex-URSS, Afeganistão, Oriente Médio e Iraque. O primeiro repórter a anunciar, com imagens ao vivo, o bombardeio de Bagdad pelas tropas norte-americanas na Guerra do Golfo (2003). Foi conselheiro de imprensa da Embaixada de Portugal em Brasília (2004/2012). Escreve semanalmente para o Jornal Mundo Lusíada.