Por Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
Acredita-se que na maioria dos países de civilização ocidental, com matriz religiosa católica, a Páscoa seja celebrada com os rituais, e a dignidade que a tradição nos vem transmitindo ao longo dos anos e, neste domínio, Portugal não fugirá às regas, ou seja: A Páscoa, designadamente nas aldeias é, ainda, celebrada como uma festa, não só da família, mas também comunitária.
Vivenciar a Páscoa nas suas dimensões religiosa e profana, numa aldeia portuguesa, nomeadamente na província (Estado) do Minho, é uma experiência que não mais se esquece na vida. As cerimónias religiosas têm o seu tempo próprio e ritual ancestral, desde logo durante o longo período da Quaresma, que decorre durante os quarenta dias posteriores ao Carnaval, onde os preceitos católicos ainda vigoram, como jejuar de carne às sextas-feiras, a “queima do Judas”, entre outros.
Importará referir que haverá três dias que antecedem o dia de Páscoa que são respeitados e vividos com intensidade, pelos crentes mais fervorosos. Assim: na quinta-feira santa é o dia de endoenças, ou seja, o dia que antecede a celebração da morte e ressurreição de Jesus; segue-se a sexta-feira santa que corresponde a uma data religiosa católica, que recorda a crucificação de Jesus Cristo e sua morte no Calvário; no sábado de aleluia, é o último dia da Semana Santa, no qual os cristãos se aprontam para o festejo da Páscoa. Nele se celebra o dia que o corpo de Jesus Cristo permaneceu sepultado no túmulo e, finalmente, o domingo da ressurreição que, segundo a liturgia, nos garante que a vida em plenitude, resulta de uma existência feita de um dom e serviço em favor dos irmãos. A ressurreição de Cristo é o exemplo concreto que confirma tudo isto.
É, justamente, no domingo que o “compasso pascal”, visita as famílias nas suas casas, onde comparecem, também, outros familiares e os amigos, não havendo convites, porque neste ritual, a porta da casa está aberta para quem desejar entrar, e beijar Jesus crucificado na Cruz. Beijar a Cruz, é uma cerimónia em que o pároco dá a cruz a beijar ao dono da casa e depois a entrega para este percorrer os aposentos da casa e cumprir, igualmente, com este ritual, com todas as pessoas presentes.
Em seguida os convivas, dirigem-se para a divisão da casa, normalmente a sala, onde está a mesa, na qual foram colocadas as iguarias próprias da época, e assim se realizar a confraternização com alegria, tolerância e paz. Neste ritual profano, é normal que os donos da casa “caprichem”, no bom sentido da palavra, em apresentarem a melhor mesa de guloseimas. Faz parte da boa tradição das nossas aldeias.
A Páscoa Portuguesa é uma festa móvel, como em todo o mundo católico, muito interessante, que mobiliza milhares de pessoas que vivem nas cidades, para as aldeias onde possuem habitação, onde residem familiares e amigos, para matarem saudades e confraternizarem, entre si, com muita alegria, certamente, também com amizade e respeito, afinal, mais uma festa da família, de amor, de convívio, de exultação e, se quiserem, de ressurreição para uma nova vida.
O que fica exposto, em relação às várias dimensões positivas que a Páscoa nos oferece, infelizmente, ainda existem situações de nossos compatriotas que não têm quaisquer possibilidades de confraternizarem com familiares, amigos ou, talvez agora, sejam ex-amigos, neste dia tão especial para a comunidade dos crentes católicos.
É urgente, constitui um imperativo nacional, revela-se fundamental para a dignificação da pessoa humana, tomarem-se medidas rápidas e eficazes, para se acabar com esta chaga social que a todos nós constrange e envergonha, porque a situação em que se arrastam quase dois milhões de portugueses e estrangeiros residentes, constitui o maior libelo, com que algum governante pode se confrontar.
E inaceitável, incompreensível e injusto que, por um lado: se atribua consignação de privilégios a titulares de cargos de administração; se empreste, ou confira, a fundo perdido, quaisquer tipos de apoios financeiros, a instituições falidas fraudulentamente, ou em vias de insolvência, por má gestão, negligência profissional-financeira, em muitas delas; e, por outro lado, se descartem os apoios necessários para quem mais necessita, nomeadamente: a melhoria substancial das reformas, pensões e outros benefícios sociais; a construção e funcionamento profissional de lares, casas de recuperação para doentes com patologias degenerativas; a construção de habitações condignas, constitucionalmente consagradas na Lei Fundamental; a colocação em atividades produtivas por parte de pessoas que, embora reformadas, ainda podem e querem dar o seu contributo para uma sociedade mais justa e confortável. Assim mesmo, a Páscoa, deveria ser tudo isto.
Nesta Páscoa de 2022, em que ainda não estamos totalmente protegidos da Pandemia provocada pelo COVID-19, em 2020, o mundo confronta-se agora com uma outra calamidade, com dimensões regionais, que podem, provavelmente, alastrarem-se mundialmente, qual nova e terrífica pandemia, esta de natureza bélico/nuclear, a partir da invasão da Ucrânia pela Rússia. Iniciado este ataque desumano, criminoso e ilegítimo, em 24 de fevereiro de 2022, os combates prosseguem e, em algumas localidades, corpo a corpo.
Na Ucrânia, aldeias, vilas e cidades já foram praticamente destruídas. Centenas de milhares de pessoas: mulheres, crianças, jovens, idosas e até animais de estimação, foram dizimadas pelos bombardeamentos russos. Os nossos irmãos ocidentais não têm as mínimas condições para desfrutarem de algum conforto, porque; a água, os alimentos, a eletricidade e as infraestruturas já não satisfazem as populações. A fome grassa nesta população mártir. Celebremos, em ato de solidariedade, para com o povo Ucraniano, a nossa Páscoa, com a alegria possível, mas com os olhos postos naquele torturado país. GLÓRIA À UCRÂNIA.
Aproximamo-nos do final do primeiro quarto do século XXI. Reconhecendo-se que muito tem sido feito, em diversos domínios da sociedade, é intelectualmente honesto, admitir-se que ao nível do Estado Social, ainda há muito por realizar, e é aqui que a Páscoa faz todo o sentido.
Uma Páscoa que se equipare: a uma Ressurreição da sociedade, em geral; e do Estado, em particular, para os valores do humanismo, da dignidade da pessoa humana. Ninguém pode ser descartado, só porque idoso, pobre, doente, sem-abrigo ou qualquer outra situação desfavorável. A exclusão social, bem como quaisquer outros tipos de descartes, são incompatíveis com o Estado Democrático de Direito.
Páscoa que se pretende para todas as pessoas: como um dia, pelo menos um dia no ano, de reflexão, de recuperação de valores humanistas universais; um dia para festejar e recomeçar com novas: Precaução, Moderação, Robustez, Justiça, Fé, Confiança, Caridade, Comiseração e Generosidade. Uma nova Esperança Redentora, entre a família e os verdadeiros e incondicionais amigos.
Entretanto, porém, uma nova Esperança Redentora, entre a família, os verdadeiros e incondicionais amigos teremos de alimentar, com todo o fervor e fé. A todas as pessoas: Páscoa Muito Alegre e Feliz, obviamente, na medida do possível.
Apanhados de surpresa, entre os fogos de uma guerra cruel, desumana e, a todos os títulos, inaceitável, imploremos a Deus e aos homens, para que o sofrimento de milhões de seres humanos, termine definitivamente. Tenhamos a HUMILDADE de nos perdoarmos uns aos outros, porque o PERDÃO será o único “CAPITAL” que deixaremos aos vindouros.
Por Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
Presidente do Núcleo Académico de Letras e Artes de Portugal
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