Por Claudia Costa, do Jornal USP
Uma história da arquitetura portuguesa e brasileira através dos livros. Assim pode ser definido Livros, Leituras e Bibliotecas – História da Arquitetura e da Construção Luso-Brasileira, do professor Ricardo Rocha, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), que a Editora da USP (Edusp) lança no dia 25 de agosto, quarta-feira, às 15 horas, em evento que será transmitido pelo canal da UFSM no Youtube.
Com 172 páginas, o livro de Ricardo Rocha traz análises sobre publicações datadas dos séculos 18, 19 e 20, que dão ao leitor uma boa ideia do desenvolvimento das técnicas de arquitetura e construção em Portugal e no Brasil. No capítulo 1, por exemplo, Rocha faz comentários sobre o livro Regras de Desenho para Delineação das Plantas, Perfis e Perspectivas Pertencentes à Arquitetura Militar e Civil, publicado em 1793 pelo capitão Antônio José Moreira (1751-1794) para uso na Real Academia de Fortificação, Artilharia e Desenho de Lisboa.
Um manual de desenho, essa obra se insere no que era classificado na época como “textos de natureza não literária e sim doutrinária e ou científica” e que tiveram sentido em virtude da intencionalidade do autor – o protocolo de leitura -, como escreve Rocha. “No início do livro, Moreira assinala, por exemplo, a tensão entre teoria e prática ao dizer que ‘é verdade que o desenho se adquire mais com o uso do que por meio de longas e fastidiosas descrições; mas também se não deve negar que os preceitos e regras para riscar qualquer planta explicados somente de viva voz, são esquecidos com facilidade e se não houver livros”, comenta o autor. “O que aponta para uma prática, semelhante a que os arquitetos ainda hoje chamam de ateliê, em que se aprende melhor desenhando do que estudando a teoria. Por sua vez, a tradição oral (ou extensivamente aquela dos manuscritos), em toda sua vitalidade (re)criativa, teria um caráter normativo inferior ao documento publicado, pelo menos entre o ambiente de formação dos engenheiros luso-brasileiros e na opinião de Moreira.”
No segundo capítulo, Rocha analisa o Guia do Engenheiro na Construção das Pontes de Pedra, publicado em 1844, de autoria de Luís da Silva Mousinho de Albuquerque. À semelhança do livro das Regras de Moreira, esse Guia é também um manual, mas se trata de uma publicação avançada, dirigida a profissionais, e não a estudantes. Preparada em Paris e publicada pela Academia Real das Ciências de Lisboa, é dividida em três partes. “A primeira parte trata dos elementos que compõem as pontes de pedra – arcos, abóbadas, embocaduras, avenidas etc. – seu traçado, espessura e forma. A segunda parte comenta os materiais empregados na construção das pontes de pedra – argamassas, madeiras etc. –, bem como outros temas relacionados, como a dragagem, as ensecadeiras e os fundamentos (fundações). A terceira parte traz as demonstrações geométricas – construção da elipse, da parábola, dos arcos tricêntricos, policêntricos – e questões como a teoria das abóbadas, a resistência das pedras ao esmagamento e fratura etc.”
Em A Nossa Casa por Morales de Los Rios Filho – terceiro capítulo do livro -, Rocha recolhe anotações sobre o livro A Nossa Casa: Apontamentos sobre o Bom Gosto na Construção das Casas Simples, do arquiteto português Raul Lino (1879-1974), feitas pelo arquiteto brasileiro Adolfo Morales de los Rios Filho (1887-1973), formado pela Escola Nacional de Belas Artes, atual Museu Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro, em 1914. “Para Raul Lino, em passagem marcada por Rios Filho, ‘o caráter essencial das fachadas duma residência reside nas suas proporções gerais e estas só podem ser determinadas depois de haver uma planta definitiva’. Outras passagens sobre a questão, marcadas no exemplar de A Nossa Casa de Rios Filho, espalham-se pelo livro. Na página 26, a palavra ‘proporção’, anotada na margem, remete ao trecho sublinhado sobre o tema, que retorna na página 28. Na página 30, em nota, uma marcação/sublinhado relaciona o problema das proporções com o do fingimento: ‘se tem copiado pormenores arquitetônicos isoladamente, adaptando-os tais como se encontram nas edificações originais. Dá-se, porém, o caso de que o que nos encanta nas antigas casas não são somente os pequenos pormenores separáveis, é acima de tudo o conjunto das proporções’”, escreve Rocha.
O quarto capítulo, intitulado Alcides Rocha Miranda, Leitor Ideal de Lúcio Costa: Sobre Arquitetura, reproduz análises do arquiteto carioca Alcides Miranda (1909-2001) a respeito do livro Sobre Arquitetura, publicado em 1962, a reunião mais completa de textos e projetos de Lúcio Costa até o aparecimento, 30 anos depois, da sua autobiografia. Segundo Rocha, esse livro traça o perfil de personagens importantes no panorama da cultura brasileira, no que se refere à tentativa de construção de um país desenvolvido por meio do modernismo arquitetônico e artístico. Destaque para a figura do arquiteto Alberto Xavier, que teve a iniciativa publicar os textos de Lúcio Costa, famoso pela aversão à publicação de seus próprios trabalhos. Para Rocha, o livro é, “sem sombra de dúvidas, não só personagem fundamental na trama da arquitetura moderna brasileira, mas um registro sofisticado dessa mesma trama e que a transcende de certo modo, enquanto objeto estético em si mesmo”.
Por fim, o quinto capítulo, Sobre Bibliotecas, trata dos volumes sobre arquitetura e construção da Casa Anunciada dos Condes de Rio Maior, uma das melhores coleções de livros privadas de Portugal, que foi dispersa depois da Revolução de Abril de 1974, e das bibliotecas de dois colecionadores brasileiros, o engenheiro Zake Tacla (1918-2009) e o arquiteto Gerson Pompeu Pinheiro (1910-1978).
O livro será lançado no dia 25 de agosto, quarta-feira, às 15 horas, em evento que será transmitido pelo canal da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) no Youtube.