O Tribunal de Estrasburgo e a União Homoafetiva

Recebo do General Reformado do Exército, Luiz Gonzaga Schroeder Lessa, presidente da Academia de Ciências Políticas e Morais, com sede no Rio de Janeiro, resumo de decisão, que lhe foi enviada por Marcos Coimbra, do Tribunal de Direitos Humanos de Estrasburgo, na qual 47 juízes de 47 países, que constituem o Conselho da Europa, por unanimidade, declaram que “não existe o direito de casamento homossexual”.
Na referida “Resolução” –a sentença fala em Resolução—contempla-se “o conceito tradicional de casamento, ou seja, a união do homem e de sua mulher” e de que aos governos não deve ser imposta a “obrigação de abrir o casamento a pessoa do mesmo sexo”.
A “decisão” lastreou-se no artigo 12 da Convenção Européia de Direitos Humanos, com considerandos filosóficos e antropológicos baseados na ordem natural, senso comum, relatórios científicos e no direito positivo.
Já o Tribunal Europeu decidira, também, em relação a caso que lhe fora submetido por casal de homem e mulher, em que o homem mudara de sexo na Finlândia, pretendendo que fosse reconhecida a união de duas mulheres como casamento, algo proibido pela legislação finlandesa. Considerou que se desejasse mudar seu estatuto, deveria o casal divorciar-se e constituir uma nova sociedade civil –não casamento—, pois casamento só poderia ser realizado entre homem e mulher.
Esclareceu, naquela ocasião, o Tribunal Europeu, que a maioria dos países da União Europeia não admitia casamento entre pares do mesmo sexo e que cabe a União Européia respeitar o direito de cada país, pois esta matéria não diz respeito àquelas de regularização comunitária.
Embora ambas as decisões tenham tido pouca repercussão no país, à falta de interesse de determinados segmentos de torna-las públicas, parece-me, todavia, que, do ponto de vista exclusivamente constitucional, merecem algumas considerações jurídicas.
De início, quero esclarecer que não tenho qualquer preconceito contra os homossexuais e –-como todos os brasileiros— tenho amigos que adotaram tal opção na vida. Tenho, todavia, desde os Comentários à Constituição do Brasil, que com Celso Bastos elaborei, em 12.000 páginas e 15 volumes pela Editora Saraiva, entendido que a união de pares do mesmo sexo não configura casamento, no sentido consagrado pela Lei Maior, a qual declara ser a família a base da sociedade; que o Estado tudo fará para prestigiá-la, desde que formada por homem e mulher; que o casamento religioso tem valor de casamento civil entre homem e mulher; que deve, o Estado, tudo fazer para transformar a união estável em casamento; que a família será assim considerada, se houver prole, desde que ou o homem ou a mulher continue a educa-la; que o pátrio poder será exercido ou pelo homem ou pela mulher.
Em nenhum momento, a Constituição, no artigo 226 e seus cinco parágrafos sobre a família, cuidou de homem e homem e mulher e mulher para constituirem a família nos moldes constitucionais.
Quando o STF decidiu, CONTRA O EXPRESSO TEXTO CONSTITUCIONAL, que família também seria constituída pela união de pessoas do mesmo sexo, VIOLOU o referido artigo, comportando-se como “poder constituinte” e não, o que a Constituição determinou ser sua função, ou seja, apenas de “Guardião da Constituição” (art. 102). Tanto é assim que, nem nas ações diretas de inconstitucionalidade por omissão do Poder Legislativo, a lei prevê que o Judiciário possa legislar em seu lugar (art. 103 § 2º).
À evidência, não pretendo –e nem seria lógico— retirar o direito de conviverem pares do mesmo sexo. Mas, tal união não seria casamento, como definiu recentemente o Tribunal Europeu de Direitos Humanos de Estrasburgo, pois o “casal” seria incapaz de gerar prole por processos naturais, não se assemelhando à família, que deve ser prestigiada pelo Estado como base da sociedade. A criação de uma sociedade civil, outorgando-se mútuos direitos e deveres, em contrato que lhes permita garantirem-se no futuro, tudo isto é possível e são numerosas as relações jurídicas passíveis de conformar para este tipo de sociedade e de uniões. O que não são e nunca serão é família, no conceito tradicional, aquela que tem permitido a evolução da humanidade pela geração natural de prole na relação entre pai e mãe, na imensa maioria dos casos.
Nem há que se argumentar com a exceção, ou seja, de casais que não têm filhos ou de pessoas que adotam filhos. A união de homem e mulher permitirá a seus filhos a opção mais natural, que é atração pelo sexo oposto. Na grande maioria das hipóteses de homossexualismo, a opção sexual realiza-se por influência externas e após certa idade.
Mesmo aqueles que pretendem impor uma ideologia do gênero, dizendo que os seres humanos nascem sem sexo definido – apesar de o aparelho genital definir o sexo – sabem, por “n” experiências, que a esmagadora maioria das crianças têm suas preferências e atitudes acompanhando sua natureza biológica.
Parece-me, pois, que a decisão unanime, cujo resumo foi encaminhado pelo General Lessa, presidente da Academia de Ciências Políticas e Morais, proferido por Corte de países com civilizações muito mais antigas que a brasileira e por juízes imparciais, prestigia o casamento de homem e mulher, pois, no curso de toda a história da humanidade, sempre foi a família tradicional, de homem e uma mulher, que permitiu a evolução da raça humana. As decisões mencionadas mereceriam reflexão pelos Ministros da Suprema Corte do país, que admiro por sua cultura, idoneidade e valor, mas que, neste ponto, não respeitaram a Constituição Brasileira.

 

Dr. Ives Gandra Martins
Professor Emérito das Universidades Mackenzie, UNIFMU, UNIFIEO, UNIP e das Escolas de Comando e Estado Maior do Exército-ECEME e Superior de Serra-ESG, Presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio e do Centro de Extensão Universitária – CEU – [email protected]  e escreve quinzenalmente para o Jornal Mundo Lusíada.

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