O Golpe Avança

Quando em 2009 a Operação Lava Jato iniciou seus trabalhos através do MPF – Ministério Publico Federal, no Paraná, com vistas a obter informações sobre crimes contra o sistema financeiro nacional e lavagem de dinheiro, as investigações foram demonstrando um quadro que cada vez mais se expandia, envolvendo políticos e empresas. Em 2013 se chegou a quatro organizações comandadas por doleiros. Um dos grupos investigados teve a operação chamada de ‘Lava Jato’ e, assim, o nome ficou para todo o processo. Em março de 2014 começou a fase mais ofensiva dos desdobramentos. Mandatos de busca e apreensão, prisão preventiva, prisão temporária, condução coercitiva se multiplicaram com força. Nesse avanço, constatou-se um grande esquema de corrupção e lavagem de dinheiro na Petrobras. No final do referido ano, grandes e renomadas empresas de construção como Engevix, Mendes Júnior Trading Engenharia, Grupo OAS, Camargo Correa, Galvão Engenharia, UTC Engenharia, IESA Engenharia, Construtora Queiroz Galvão e Odebrecht Plantas Industriais e Participações estavam arroladas nos processos, tendo como destaque a liderança do juiz Sérgio Moro, responsável pela ação penal da investigação. Sem sombra de dúvidas um trabalho importante porque a corrupção deve sempre ser combatida seja onde for e doa a quem doer, ou seja, não discriminar ninguém. Cidadania e espírito republicano.

Vale apontar que, neste ano de 2014, muita gente lembrou-se do falecido jornalista Paulo Francis, que vivia nos EUA. Em 1997, participando do programa Manhattan Connection, denunciou a existência de um esquema de roubalheira na Petrobras. Joel Rennó, presidente da empresa à época, abriu um processo de US$ 100 milhões contra Francis. E o presidente FHC nem tocou no assunto. Assim como o MPF e o procurador geral da República, Geraldo Brindeiro. Provavelmente, se houvesse mínima disposição, muita coisa poderia ter sido evitada.

O fato é que, aos poucos, os crimes da Lava Jato foram atrelados como responsabilidade do governo Dilma, que sucedeu Lula no poder. E, durante a campanha presidencial de 2014, cada vez mais se notou a orquestração entre as ações de setores da Justiça, da grande mídia e a oposição neste sentido. Tudo para evitar um quarto mandato. E não deu certo. Mas, o inconformismo com a derrota ficou patente desde a contagem dos votos. Uma profusão de impropérios e mesmo de racismo contra nordestinos, pobres e minorias explodiu nas redes sociais, como responsabilizando a toda essa gente pela vitória de Dilma. Foi declarada uma guerra ao mandato que passou a ser torpedeado diariamente com entusiasmo. Em paralelo, as investigações da Lava Jato prosseguiram. E, para deixar a coisa em uma situação mais evidente, os depoimentos que também envolviam figuras do PSDB e suas alianças eram sistematicamente desconsiderados pelos agentes da justiça, porque ‘não vinham ao caso na investigação’. Aécio Neves, PSDB MG, por exemplo, já foi citado nas delações por três ocasiões como organizador de esquemas de propinas e receptor de dinheiro ilegal.

Em 29 de fevereiro, José Eduardo M. Cardozo, ministro da Justiça, foi destituído do cargo pelo desgaste junto ao PT e aos correligionários. Para muitos, não teve pulso para administrar as investigações cada vez mais parciais, seletivas, pouco isonômicas do MPF e Polícia Federal, incluindo reclamações por abusos, constrangimentos e afins. Para seu lugar assumiu o procurador baiano Wellington Cesar Lima e Silva, causando críticas da imprensa tradicional. Em poucas horas, tudo muito rápido, ocorreria, então, a histórica deflagração da 24ª etapa da Lava Jato no dia 4 de março. Cabe, no entanto, destacar alguns detalhes prévios.

O senador petista Delcídio Amaral, preso desde novembro teria, em delação premiada, comprometido Lula e Dilma alegando que ambos conheciam irregularidades na Petrobrás. A acusação ‘vazou’ para a Revista Isto É. Vazamentos de depoimentos, aliás, se tornaram uma prática semanal no último ano e meio para a imprensa. É só conferir. Em 24 horas, no Congresso, os tucanos já pediam a cabeça de Dilma novamente. Na noite de quinta, a Globo ficou 40 minutos, em rede nacional, batendo no ex-presidente, o envolvendo com ‘possíveis’/ ‘supostos’ favorecimentos e corrupção com empresas. Então, sexta ao amanhecer, o juiz Moro, a Polícia Federal e setores do Ministério Público dão a grande cartada, há muito esperada: colocar as mãos em Lula. E com uma preocupação: marcar que é a vara de Curitiba quem investigará as mais recentes denuncias contra ele – posse de um apartamento no Guarujá e de um sítio em Atibaia – e não o MP/SP. É notável que ainda de madrugada, o editor da Época, grupo Globo, Diego Escosteguy, escreveu no Twitter a prova cabal de que a imprensa comercial já sabia o que iria acontecer ao amanhecer. Jornalistas da TV Globo e parceiros já estavam postados para o show da 24ª etapa da Lava Jato. E, pior: Delcídio Amaral em nota afirmara que nem ele e “nem sua defesa confirmam o conteúdo da matéria assinada pela jornalista Débora Bergamasco“. Só que a grande mídia não deu, obviamente, a mínima para isto. Às favas com a ética: os fins justificam os meios. E o objetivo é derrubar o ex-presidente e arruinar as possibilidades do partido para 2018. Então, Lula foi constrangedoramente levado em meio a uma porção de soldados armados em ‘condução coercitiva’ para depor. Vexatório.

Uma sucessão de absurdos, de violência contra o Estado de Direito e pura espetacularização. Tentativa de manchar sua imagem. Ele que saiu com o recorde mundial de 87% de aprovação (CNT/Sensus/ 2010). Lula tem domicílio conhecido, nunca se negou a depor, entregou documentações requeridas e nem tem pedido de intimação feita. Mais do que óbvio, é uma arbitrariedade, ataque contra um governo que foi eleito democraticamente por quatro ocasiões. E afronta a Constituição.

O que se assiste, portanto, lamentavelmente não é uma ação contra a corrupção, porque outras figuras importantes, como falado, foram arroladas nos depoimentos de envolvidos, contudo, não foram inquiridas. Cada vez mais clara fica então a intenção golpista orquestrada por setores da justiça, mídia e oposição. O povo que acorde: outro março como o de 1964 não pode ser admissível.

São Paulo, 4 de março de 2016

 

Prof. José de Almeida Amaral Júnior
Professor universitário em Ciências Sociais; Economista, pós-graduado em Sociologia e mestre em Políticas de Educação; Colunista do Jornal Mundo Lusíada On Line, do Jornal Cantareira e da Rádio 9 de Julho AM 1600 Khz de São Paulo

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