Negócios da China

Mao Tsé Tung foi um dos lideres que desde os anos 1920 se destacaram na resistência da China contra as potências imperialistas e, posteriormente, após a II Guerra, entre 1939-45, acabou por vencer uma disputa interna no gigantesco país, formando então a República Popular da China em 1949. Tanto a China como a antiga URSS faziam parte do bloco socialista, formação geopolítica que enfrentou o lado capitalista, capitaneado pelos EUA. O Partido Comunista do Brasil – PCdoB esteve, durante muitos anos, alinhado com a esquerda chinesa. A chamada Guerra Fria terminou entre 1989 e 91 com a derrocada dos soviéticos.
Mao Tse Tung ficou no poder por vários anos. Durante seu exercício, acabou realizando uma ‘revolução cultural’ que prendeu e eliminou muitos opositores. Com sua morte, em 1976, as lideranças que vieram posteriormente começaram um processo de abertura, iniciada por Deng Xiao Ping. E essa caminhada chegou até os dias de hoje, colocando o referido país como uma das maiores potências econômicas do mundo contemporâneo. E, aliás, um festejado aliado comercial do Brasil. Especialmente com a gigante crise financeira internacional, detonada a partir de 2008 e a estagnação reinante.
Em meio a este cenário é preciso, no entanto, que verifiquemos com calma a situação existente para que, não saiamos perdendo com esse ‘negócio da China’. Piada do passado. Há muito não existe ingenuidade – se é que algum momento existiu, de fato – em se comercializar com aquele país. Idéia de fazer faturamento fácil por aquelas bandas é ledo engano. As coisas andam evoluindo muito rápido e os chineses são astros de primeira linha, sem a menor sombra de dúvidas.
Desde 2009 a China é o parceiro comercial mais importante do Brasil. É o principal destino das exportações brasileiras e o segundo maior importador de produtos para o país. Com a crise atingindo os EUA, nosso antigo grande parceiro comercial, entre 2000 e 2010, as exportações brasileiras para a China subiram de US$ 1,1 bilhão para US$ 30,8 bilhões. Em outras palavras, saíram de 2% do total das exportações do Brasil para 15%. Já as importações brasileiras da China cresceram de US$ 1,2 bilhão (2% do total), para U$ 25,6 bilhões (14% do total). De acordo com o IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada, nos 10 últimos anos o saldo comercial entre exportações e importações foi superavitário para o Brasil em seis anos. Em 2010, por exemplo, o Brasil teve um saldo positivo com a China de US$ 5,2 bilhões. Bons resultados. Mas, que devem ser analisados numa ótica em longo prazo. E aí as coisas tendem a mudar de figura se não se alterarem as bases.
Para começar, se olharmos já para o tipo de negócio que estamos praticando com os orientais, poderemos notar que o Brasil exporta basicamente commodities e consome produtos industrializados. Ano passado, 83% da pauta de exportações foi composta por produtos básicos e as importações foram 97% de industrializados. Isso é um problema crescente. Produto primário é coisa frágil. E valor agregado aparece através de tecnologia. E, como reflexo, também o setor secundário nacional agora está sofrendo os impactos dessa relação. Estamos perdendo produção industrial local, substituída por importações. E para a economia é algo muito ruim, afinal, quem dinamiza o sistema é exatamente a indústria.
As armas utilizadas pelos chineses na luta pela conquista de mercado são bastante conhecidas. Vejamos. Em primeiro lugar, eles mantém o yuan desvalorizado artificialmente. Desta forma, o preço de seus produtos fica mais barato frente ao real ou dólar. Isso dá mais competitividade. Em segundo lugar, lembramos a larga oferta de mão de obra e consequentemente os baixos salários que são pagos para a grande massa de trabalhadores. Assim, os custos de produção ficam diminuídos. Em terceiro plano, a carga tributária. Eles não têm a carga tributária e nem os encargos sociais como temos aqui. Outro aspecto são as taxas de juros para produção que são bem mais baixas por lá do que no Brasil. E não só: o governo chinês estabelece restrições para o investimento estrangeiro, como forma de proteger a sua indústria ainda mais. Assim, só por essa análise básica, percebemos que são grandes os riscos dessa relação até aqui festiva – embora eles joguem duro e nunca escondam isso –, num futuro não muito distante, revelar-se uma armadilha e sermos engolidos pelos interesses chineses.
É interessante atentarmos para o fato de que os investimentos deles no Brasil estão associados prioritariamente à produção de matérias-primas e às aquisições de terra, isto é, ações que visam a suprir suas próprias demandas e não expandir ou qualificar em parceria nossa economia. Eles querem garantir acesso às fontes de recursos naturais e a energia, coisas fundamentais para uma economia que não raramente cresce seu PIB em dois dígitos percentuais.
Um recente livro lançado – “O Crepúsculo do Império e a Aurora da China”, publicado pela Observador Legal  – chama ainda mais a atenção para as possibilidades chinesas. De acordo com o pesquisador Durval de Noronha Goyos, embora os EUA ainda sejam o pólo do sistema capitalista mundial, sua hegemonia cada vez mais vai se esfarelando. Os estadunidenses estão, literalmente, falidos. Apesar de manterem a pose. Com um PIB da ordem de $14,66 trilhões, sua dívida pública, em 9 de setembro de 2011, já estava em cerca de US$ 14,71 trilhões. Há um imenso déficit público e comercial. E a China, enquanto isso, cresce. É atualmente o maior credor dos EUA, com reservas de mais de US$ 3 trilhões. Para Goyos, a emergência da China como a potência econômica mundial marcará o século XXI.
Um bilhão e meio de habitantes, unidos por um partido centralizador e consciente de sua força e extraordinário potencial. Eles vêm com tudo. Nós não devemos apenas ficar assistindo, passiveis, como meros produtores de bananas, essa alvorada vermelha. Temos que agir, também sermos protagonistas e não mais meros satélites das potências. O dragão chinês não é de brincadeira e o Brasil deve se precaver.

Prof. José de Almeida Amaral Júnior
Professor universitário em Ciências Sociais; Economista, pós-graduado em Sociologia e mestre em Políticas de Educação; Colunista do Jornal Mundo Lusíada On Line, do Jornal Cantareira e da Rádio 9 de Julho AM 1600 Khz de São Paulo.

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