“Não matem”: PCP contra referendo e eutanásia em Portugal

Centenas de pessoas junto à Assembleia da República contra a despenalização da eutanásia, em Lisboa, 24 de maio de 2018. Foto TIAGO PETINGA/LUSA

Mundo Lusíada
Com Lusa

O secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, disse esta quinta-feira “não” por duas vezes, contra o referendo e a eutanásia, ou morte assistida, que estará em debate dentro de uma semana no Parlamento português, e fez um apelo: “Não matem.”

A Assembleia da República debate em 20 de Fevereiro cinco projetos de lei para a despenalização da morte assistida, do BE, PS, PAN, PEV e Iniciativa Liberal, que preveem essa possibilidade sob várias condições.

“Não matem. Procurem que esse princípio do prolongamento da vida humana se concretize também na nossa pátria”, afirmou Jerónimo de Sousa em declarações aos jornalistas, à margem de um encontro com a organização AMAlentejo, de defesa do desenvolvimento e da regionalização.

Para Jerónimo de Sousa, o debate em torno deste tema de “grande sensibilidade e complexidade” não é entre “o preto ou branco”, nem deve basear-se em divisões entre crentes e não crentes ou “conceitos jurídicos e constitucionais”.

“Estamos a falar do direito a uma vida digna e de ser acompanhada, em que o Estado tem responsabilidades. Não [pode] descartar-se, é o Estado assumir as responsabilidades para, através de mecanismos que existem e serviços públicos, garantir que as pessoas não tenham o sofrimento que conduza a essa decisão de acabar com a vida”, afirmou.

E foi esta a resposta do secretário-geral dos comunistas à questão de saber se a aprovação de uma lei para despenalizar a eutanásia põe alguma questão de constitucionalidade.

O líder comunista afirmou que o posicionamento do seu partido nesta questão é fundamentando, “sem dramatizações nem crispações”, dado estar a falar-se de “um assunto tão sensível como a vida e a morte”.

“É preciso salvaguardar esta ideia dos avanços da civilização humana, em que o objectivo do prolongamento da vida foi sempre uma questão central”; e criticou posições que podem levar a um “retroceder no plano das leis e administrativo”.

Para Jerónimo de Sousa, “o Estado não pode aliviar as [suas] responsabilidades com um ato administrativo”, só porque tem “dificuldades em termos de aplicação” das normas e eventualmente falta de meios que “garantem a vida humana com dignidade [que] se transforma noutra coisa”.

Em 2018, o Parlamento debateu projetos de despenalização da eutanásia, apresentados pelo PS, BE, PAN e Verdes, mas foram todos derrubados, numa votação nominal dos deputados, um a um, e em que os dois maiores partidos, PS e PSD, deram liberdade de voto.

Debate sereno

A líder parlamentar do PS pediu que o debate sobre despenalização da eutanásia se faça de forma serena, esclarecedora e sem “insinuações sobre troca de votos”, rejeitando o referendo e o argumento da falta de debate.

Estas posições foram transmitidas em conferência de imprensa por Ana Catarina Mendes, na Assembleia da República, no final da reunião semanal do Grupo Parlamentar do PS, durante a qual manifestou a sua convicção de que o projeto dos socialistas sobre esta matéria será aprovado na generalidade.

“O PS faz um apelo à serenidade do debate que se deve ter sobre a despenalização da morte assistida, porque o assunto que tratamos é demasiado sério, esteve em discussão ao longo dos últimos anos, foi levado a um congresso do PS em 2016 (com uma moção que depois foi aprovada), tendo depois merecido um debate parlamentar elucidativo em 2018”, sustentou a presidente da bancada socialista.

Com estas palavras, Asna Catarina Mendes procurou contrariar os argumentos de que se verifica na sociedade portuguesa uma ausência de debate aprofundado em relação à eutanásia.

Perante os jornalistas, a líder parlamentar socialista acentuou também a mensagem de que é preciso que se faça “um debate esclarecedor e que não seja enviesado por insinuações”.

Estudo

Mais de metade dos pesquisados num estudo do Instituto Universitário Egas Moniz mostra-se favorável à eutanásia e os que manifestaram atitudes mais desfavoráveis são os mais velhos, com menor nível de escolaridade e que se identificam com uma religião.

Esta investigação, da responsabilidade do Laboratório de Psicologia do Instituto Universitário Egas Moniz e que será apresentada na próxima semana, avaliou as atitudes da população portuguesa face à eutanásia, em articulação com fatores de ordem psicológica, designadamente a solidão, a satisfação com a vida, o mal-estar psicológico, o bem-estar espiritual e a personalidade.

Os dados da investigação, que decorreu durante os meses de Dezembro do ano passado e Janeiro deste ano e abrangeu 1695 pessoas de várias regiões de Portugal continental, indicam que mais de metade (50,5%) dos inquiridos revelou atitudes favoráveis face à eutanásia, um quarto (25,6%) reportou atitudes desfavoráveis e os restantes (23,9%) manifestaram indecisão quando a esta matéria.

“Verificou-se que os inquiridos com idades mais avançadas, com um menor nível de escolaridade, que se identificaram com uma determinada religião e reportaram prática da mesma, que consideraram ter um estado de saúde mais debilitado e que referiram possuir uma menor informação sobre a eutanásia são aqueles que integram o grupo dos sujeitos com atitudes mais desfavoráveis face à eutanásia”, referem os investigadores.

Pelo contrário, acrescentam, “os inquiridos mais jovens, com um maior nível de escolaridade, sem identificação com qualquer religião, que consideram ter um melhor estado de saúde, bem como um maior grau de informação sobre a eutanásia, representam o grupo dos sujeitos com atitudes mais favoráveis”.

A maioria dos inquiridos revelou uma clara preferência pelo recurso a um referendo popular para decidir acerca da despenalização (63,7%), sendo esta opção ligeiramente mais evidente nos homens (66,6%) do que nas mulheres (61,7%). Cerca de um quarto da população inquirida (23%) referiu não saber qual a melhor forma de decidir esta questão e 13,3% dos participantes manifestaram preferência pela decisão parlamentar quanto à eventual legalização da eutanásia.

Mais de metade (56%) disse ter um grau moderado de informação sobre a eutanásia e a percentagem de inquiridos que se posicionou no pólo da baixa e nula informação (22,1%) é aproximadamente a mesma daqueles que se enquadraram no pólo da elevada e muito elevada informação sobre a eutanásia (21,6%).

Perante o cenário de uma pessoa com doença terminal que pede, para aliviar a dor e sofrimento, que sejam usados meios ativos como uma injeção letal, para antecipar morte, a maioria dos inquiridos (59%) diz que apoiaria este pedido. Também no caso de uma pessoa com doença terminal que, para aliviar a dor e sofrimento, pede que sejam utilizados meios passivos, como a retirada de tratamento ou equipamentos que permitem manter a vida, a maioria (68%) responde que apoiaria o pedido.

Comparando os dois cenários, os investigadores concluem que os inquiridos tendem a aceitar melhor as “práticas de eutanásia orientadas para a retirada de respostas que permitem a manutenção da vida do que para o recurso a estratégias que induzam a morte”.

Já perante o cenário de uma pessoa em estado de coma e com doença terminal, incapaz de dar o seu consentimento para pôr termo à vida, 43% dos inquiridos dizem que não apoiariam que os familiares desse doente solicitassem o recurso à eutanásia.

Quanto ao grau de aceitação da eutanásia associada ao intenso sofrimento psicológico, e perante um cenário em que uma pessoa sem doença terminal, mas com intenso sofrimento psicológico, solicita eutanásia, mais de metade (56%) recusaria o pedido. Apenas 18% dos inquiridos apresentaram uma opinião favorável a esta prática.

“Estes dados parecem sinalizar que a inexistência de uma doença terminal, conotada com sofrimento físico, está relacionada com uma menor aceitação da eutanásia, ainda que possa existir um intenso sofrimento psicológico”, escrevem os autores do estudo.

Face ao cenário de uma pessoa sem doença terminal, mas com demência irreversível grave e que ainda num estado de lucidez tenha solicitado a prática de eutanásia, caso um dia se encontrasse num estado em que não tivesse capacidade para fazer tal pedido, a maioria (51%) diz apoiar.

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