Da Redação com Lusa
Entre 500 e 1.000 milhões de pessoas no mundo sofrem alguma forma de pobreza sazonal e a migração pode ser uma solução, propôs hoje um economista, defendendo que em termos econômicos a migração é boa para todos.
“Não há dúvida, em termos econômicos, de que a migração é uma coisa boa”, disse o economista Ahmed Mushfiq Mobarak, da Universidade de Yale, num discurso na Conferência NOVAFRICA 2022 sobre Desenvolvimento Econômico, em Carcavelos, concelho de Cascais.
O investigador explicou que a migração tem “enormes vantagens” para o migrante, que encontra emprego e aumenta os seus rendimentos, para o país de origem do migrante, que recebe as remessas do seu trabalho, mas também para o país que o acolhe, que obtém mão-de-obra mais barata.
Mobarak respondia assim a uma pergunta da audiência após apresentar os resultados de um trabalho de investigação sobre a pobreza sazonal, que ocorre nas comunidades dependentes da agricultura nos períodos entre a plantação e a colheita.
Segundo explicou, nos períodos de plantação e de colheita há emprego e os rendimentos aumentam, mas entre esses dois períodos escasseia ao trabalho, os rendimentos baixam e as famílias perdem poder de compra, além de aumentar o preço dos alimentos.
Em todo o mundo, entre 500 e mil milhões de pessoas passam por alguma forma de pobreza sazonal todos os anos, e com as alterações climáticas, o problema tende a aumentar, alertou.
Nesses períodos, as famílias comem menos quantidade de alimentos por refeição ou menos refeições por dia, pelo que aumenta a malnutrição, e por vezes recorrem a medidas desesperadas, como pedir empréstimos a elevadas taxas de juro ou abandonar as suas terras para encontrar trabalho noutras plantações, o que prejudica a produtividade agrícola e agrava a situação.
Perante este problema, e tendo em conta de cerca de 100 milhões dos agricultores que sofrem de pobreza sazonal vivem perto de cidades prósperas, o investigador, originário do Bangladesh, propôs-se iniciar uma intervenção no seu país de origem, que consistiu em dar um apoio financeiro para incentivar os agricultores a procurar emprego – no período em que não há trabalho agrícola – na cidade mais próxima.
A iniciativa, que começou em 2008 e abrangeu cerca de 2000 lares, levou a um aumento da migração de 22% e a um aumento do consumo diário das famílias em 600 calorias por dia, sendo que três anos depois cerca de 10% dos lares abrangidos mantinham esse movimento migratório sazonal, muitas vezes para o mesmo empregador.
“É claro que ninguém ficou rico, nem fazem poupanças, mas ficam um pouco menos pobres”, disse o economista.
Questionando-se sobre a possibilidade de alargar a iniciativa, ou até de a levar para outros países, Mobarak sublinhou que “não se deve ficar entusiasmado com o primeiro ensaio, porque com a escala os problemas aparecem”.
Exemplificou que há problemas econômicos, mas também não econômicos que podem surgir, como o aumento dos divórcios devido à separação das famílias, ou até o risco de violência doméstica uma vez que aumenta a supremacia financeira do homem, que normalmente é quem emigra.
Em termos econômicos, há o risco de as comunidades de origem perderem os seus melhores trabalhadores ou de aumentar a inflação por causa dos rendimentos dos que emigram, prejudicando os que ficaram, por exemplo.
Mobarak contou ainda que a sua equipa iniciou uma intervenção similar no Nepal que não correu tão bem, porque como era mais difícil enviar remessas, os migrantes só traziam os seus rendimentos quando voltavam a casa, na época em que havia trabalho, pelo que a família não beneficiava no período em que mais precisava.
Perante esta situação, os investigadores propuseram dar um empréstimo às famílias na época de dificuldades, que seria pago quando o migrante regressasse, ou promover a poupança na época das colheitas para aguentar o período difícil.
Apesar da mais-valia da migração e do facto de, em todo o mundo, haver uma diferença de até 350% nos rendimentos do trabalho em meio rural e urbano, Mobarak constatou que as pessoas abrangidas pelo seu estudo não se tornaram emigrantes permanentes, mantendo antes a sazonalidade da migração.
Isto poderá ter a ver com a diferença na qualidade de vida no campo e na cidade, admitiu.
A Conferência NOVAFRICA 2022 sobre Desenvolvimento Econômico decorre hoje e quinta-feira na Nova School of Business & Economics, em Carvacavelos.