Da Redação
Com EBC
Os dedos já não respondiam, com facilidade, o que a cabeça e o coração tocavam. Desde 1965, quando sofreu um acidente jogando futebol nos Estados Unidos, e teve uma perfuração na altura do cotovelo direito, o maestro paulistano João Carlos Martins passou a escrever (ou melhor, tocar) uma incrível história de superação.
Primeiro, com os três dedos atrofiados, precisou se adaptar. Mas depois desenvolveu uma doença na mão esquerda: uma contratura que aumentou ainda mais a limitação.
Ele se submeteu a 24 cirurgias. Mesmo assim, nunca desistiu de trabalhar. Contrário a todos os prognósticos e indicações, ele compôs uma história de vida que estimula aplausos aonde chega. A maior novidade é que tecnologias de luvas e robôs deram novas condições ao maestro para tocar e se apresentar.
Nesta quinta (25), João Carlos Martins, luso-brasileiro um dos ícones da música clássica no país, que soma mais de 1,7 mil concertos, completa 80 anos de vida com uma apresentação em uma live às 20h.
“Anunciarei meus planos para os próximos 20 anos”, divulgou o maestro em rede social. Saiba mais sobre o músico em entrevistas e reportagens feitas pela EBC
O evento está previsto para ser transmitido pelo Youtube e pelo Facebook nos perfis do maestro. A pandemia do coronavírus alterou, por enquanto, o que o músico programava. Em entrevista à TV Brasil, no ano passado, ele contou que planejava celebrar o aniversário com uma apresentação no Carnegie Hall, em Nova York, com obras de Bach, Villa Lobos, Guerra Peixe e Tom Jobim.
Além do aniversário, a data marca a primeira apresentação do maestro na famosa casa de espetáculo norte-americana, há 60 anos.
Tecnologia
Foi com apenas 8 anos de idade que o paulistano João Carlos Martins começou a tocar piano e teve contato com as obras de Johann Sebatian Bach. Tornou-se um dos principais intérpretes do mundo da obra do músico alemão. Estudioso, viu-se surpreendido pelo o que a tecnologia poderia fazer.
“Quem diria que as tecnologias e as artes acabam se encontrando?”. Encontraram-se pela primeira vez em um concerto em outubro do ano passado quando ele utilizou o dispositivo robótico Joquinha para virar as páginas da partituras. A apresentação ocorreu com a Orquestra Filarmônica Bachiana Sesi-São Paulo.
Outra novidade que a tecnologia trouxe foi uma luva biônica que permitiu ao maestro utilizar todos os dedos novamente. Na apresentação de aniversário, nesta quinta, Martins vai utilizar o equipamento.
E pensar que, em 2018, ele chegou a se despedir do piano. No ano passado, ele vestiu pela primeira vez a luva e voltou a colocar os 10 dedos nas teclas de um piano. “Em palavras, eu não saberia me expressar. A forma que eu expressei depois de 22 anos foi em forma de uma lágrima”, disse em entrevista à Rádio Nacional.
A luva foi desenvolvida pelo designer industrial Ubiratan Costa. “Tem uma frase que repito sempre: ‘a pessoa tem que correr atrás dos seus sonhos, quando ela menos esperar, os sonhos correm atrás dela'”, afirma o músico.
O autor do projeto das luvas biônicas, do designer industrial e professor Ubiratan Costa, morador da cidade de Sumaré (SP). As luvas foram um presente para um ídolo. “Eu estava assistindo a uma entrevista e ouvi que ele iria se despedir do piano e pensei que poderia fazer algo que pudesse melhorar para ele”.
O professor desenvolveu um adaptador e se baseou nas imagens que assistia na TV para criar o protótipo. “Luvas extensoras para ajudar nas mãos. Eu coloquei quatro hastes, que servem como mola, em cima de cada dedo”.
Depois do contato pessoal com o maestro, ele desenvolveu três protótipos que melhoraram o equipamento. Com o sucesso, o professor pensa em criar outros produtos que possam ajudar mais gente. Para fazer em larga escala, ele precisa que as indústrias abracem a ideia.
O maestro afirma que todas as dores que passou foi para conseguir concretizar o sonho de tocar e se apresentar. “Quantas vezes eu pensei em desistir porque pensava que não ia conseguir? Chegava a fazer 21 notas por segundo. A minha frase é ‘a música venceu’”.
A história de Martins foi registrada em documentários e também em filme de ficção, em que o artista é interpretado por Alexandre Nero e dirigido por Mauro Lima. “O piano é o companheiro que eu jamais abandonei na minha vida”, emociona-se.