Mãe azul – Abril é o mês de conscientização do autismo

Por Helena Fraga

A triste realidade da vida é que enquanto não chegar na sua casa, dificilmente você vai se levantar da cadeira ou, pior, vai ajudar quem precisa… Não costumo ser tão pessimista, mas, alguns assuntos tocam meu coração.

Eu não preciso viver na rua para ter compaixão com os que lá vivem. Não preciso ter câncer para compreender a dor dos que o têm, então não consigo compreender como no século XXI ainda temos que fazer campanhas de inclusão social… Sim, apenas reticências podem exprimir essa dor meio poética.

Abril é o mês de conscientização do autismo no mundo. O mês azul foi escolhido pela ONU – Organização das Nações Unidas, pois o transtorno atinge mais pessoas do sexo masculino. Também é usual e conhecido o laço com o quebra-cabeça colorido criado em 1963 pela Autism Speaks simbolizando o quão o espectro tem uma gama infinita de compreensão.

Segundo Mauricio Figueira em matéria da Assembleia Legislativa de São Paulo: “A fita com o quebra-cabeça tem diferentes cores e formas, e lembram a diversidade das pessoas com a doença. A fita é brilhante, sinalizando que, com maior conscientização, intervenção precoce e tratamentos adequados, os autistas conseguem ter qualidade de vida”.

Gabriela, no site Genial Care, tem outra leitura para a fita de conscientização: “Peças do quebra-cabeça compondo a fita em cores diferentes: representam a diversidade de famílias que têm integrantes autistas e sua inclusão social”. A autora comenta ainda que o símbolo nem sempre é bem aceito por dar justamente essa ideia de dificuldade de compreensão sobre as pessoas com TEA – Transtorno do Espectro Autista.

Um fato sem dúvida é que nenhuma pessoa com TEA é igual a outra, mas isso leva-nos a reflexões mais profundas: Ninguém é igual a ninguém. Todos somos seres únicos com nossas peculiaridades e inteligências. Todos somos especiais e todos nós temos uma ou inúmeras deficiências.

Recentemente assistindo a uma série de doramas coreanos pude perceber que em quase todos o tema vem sendo abordado, o que me levou a questionar o motivo e procurar respostas. E claro, sempre que você procura respostas elas aparecem e podem ser motivo de susto ou esperança!

Neste caso o sentimento é um misto de espanto e percepção do quanto não estamos fazendo nada ao saber que em 2017 a cada 160 crianças, uma nascia dentro do espectro e que apenas três anos após esse numero é de uma para cada 54 nascimentos. Mesmo não sendo muito boa em matemática é preocupante que ainda não conversemos sobre o problema de forma aberta, honesta e, principalmente, com o olhar de amor que o tema merece.

Sou mãe azul. Convivo com um adorável e sedutor autista há 27 anos, o João. Como eu sempre falo… no tempo dele nem se ousava pensar em diagnóstico – se bem que rótulos também não levam a lugar algum – e muito menos profissionais capacitados para ajudar-nos.

Assustador porém é perceber que depois de tanto tempo – mais de um quarto de século – as dificuldades ainda prevalecem. Aprendi muito com profissionais que me ajudaram ao longo dessa trajetória. Mas, aprendi mais com o próprio João.

É fácil? Não! Não é… Mas nenhum filho vem com manual e mesmo os ditos normais – esse normal é escabroso – também lhe dão um suador e eu tenho as duas realidades em casa!

No entanto, o que realmente aprendi é que só profissionais não lhe ajudam e nenhuma escola vai incluir ninguém ou que existe uma mágica que lhe tira do problema depois de xis anos. O que aprendi é que tenho que ser mãe! Azul, amarela, verde… não importa muito porque terei que batalhar pelo futuro dos meus filhos.

Números e estatísticas servem para nos confortar ou alienar, mas, não nos ajudam a cuidar de quem precisa de nós. Hoje um cem número de associações, organizações e clínicas especializadas estão se preparando para recebê-los e cuidar deles com todo cuidado e apoio que as famílias precisam.

Aliás, o que realmente seria bacana é conscientizar médicos – principalmente pediatras a alertar as mães quando perceberem que as coisas não estão bem. Uma reavaliação nos conceitos precisa ser amplamente estendida porque o velho chavão – não se preocupe, seu filho tem até 2 anos e meio para falar, andar ou fazer outras coisas – não é mais o top do momento

Hoje se sabe que as janelas de sinapses precisam ser estimuladas desde a mais tenra idade. A neurociência chegou para auxiliar a melhor compreensão do cérebro humano e estamos precisando que ela se popularize para todas as camadas sociais.

Voltando um pouco ao meu caso – tive sorte – não! Teve muita oração e Deus me conduzindo. Muitas pessoas boas me ensinaram coisas boas. Na dúvida do diagnóstico que não chegava ou da ajuda que não existia contei com uma amiga recém formada em fonoaudiologia – carinhosamente apelidada de Tess ou Dra. Maristela – para me ajudar a estimular o João desde cedo. Batendo papo nas salas virtuais da década de 90 aprendi com mães de fora do Brasil a fazer livros de imagens para ensinar meu filho.

Compreendi a duras penas e com muita conversa que precisava mostrar a ele com mais frequência o que ele gostava e, dessa maneira, desde muito cedo íamos ao teatro, ao cinema, ao parque ou à praia.

Havia birra? Muita! Ataques de pânico misturados com mal criação? Um monte… mas tenho orgulho dele ter ido a todos os lugares comigo. Houve também a consulta mais que esclarecedora com um dos maiores neurologistas de São Paulo:

— Mãe, seu filho é igual a todos os outros… ele só tem uma dificuldade. Então dê limites a ele como a qualquer outro filho!

Esse médico em especial me salvou. Foi naquele dia que aprendi de fato o que eu iria viver e eu tinha duas opções: seguir em frente ou desistir. Sempre vou seguir em frente, nasci assim.  Depois aprendi que eram necessárias rotina e organização. O cérebro deles vive melhor dessa forma e na real foi ótimo porque aprendi com ele que nada é melhor do que rotina e organização. Virei autista também e hoje consigo falar disso com uma certa dose de honra.

Quando o pequeno Jonny chegou até meus braços eu era uma mãe não tão jovem, mas, com um desejo infinito de ser mãe, então uma das coisas que apliquei nele e que acredito ter sido o motivo dele não ser tão esquivo ao toque foi Shantalla – uma massagem indiana desenvolvida para que mães e bebês tenham uma ligação afetiva mais íntima. E o toque ainda é o elemento curador da humanidade. Mesmo que o espectro iniba esse contato ainda acredito que é no abraço e no soar do coração um do outro que vamos salvar nossa espécie.

Podia falar aqui das inúmeras ou das principais características do TEA. Hoje se você entrar no Google e procurar vai encontrar detalhadamente todas elas, mas ficaria monótono e bastante distante. Deixo ao final do artigo uma relação de sites e artigos se você quiser saber mais.

Políticas públicas para pessoas especiais? Não falarei sobre isso porque a cada ano ou multiplicam-se aos borbotões ou simplesmente desaparecem da mesma forma que chegaram.

O que eu como mãe posso deixar hoje para você que percebe que seu bebê é diferente do da sua amiga é… procure ajuda! Pode ser que seu filho não tenha nada, mas, pode ser que tenha e na dúvida é melhor você passar pelo luto, desespero e aceitação o mais cedo possível para que possa ajudá-lo rapidamente.

Estimule seu filho. Dê limite a ele. Proteja-o. Crie laços. Converse. Lute pelos desejos dele. Não espere que a escola lhe ajude. Vá até a escola e brigue por ele! Não acredite em todas as terapias – perceba como seu filho é e se o humor dele se alterou questione o profissional.

Não o deixe ser uma criança eterna. Ajude-o a crescer. E o mais importante: seu filho pode aprender qualquer coisa, mesmo que o tempo dele seja diferente do filho da sua amiga. Não o isole do mundo mesmo quando você tiver que pagar o mico dele ter um piti; naquele momento seja a autoridade dele porque ele é seu filho quer que você seja mãe dele.

Nenhuma organização ou profissional pode saber mais do que você que trocou as fraldas, deu de mamar e acalentou; chorou nos momentos difíceis e aplaudiu as conquistas dele. É cansativo… mas, educar é cansativo. E quando esse dia do “cansei” chegar, apenas olhe para ele – sorria e seja honesta – e diga: hoje a mamãe precisa de um tempo para ela!

Acredito que todos os dias deveriam ser azuis ou com cromossomos a mais ou dificuldades extras, mas, também acredito que só o amor pode ser acolhedor e que a união das mães possa levar a um lugar maior que é o de que todas as crianças sejam respeitadas independentemente do seu peso, cor, altura ou dificuldades.

Ame! Beije! Aperte! Diga não… Seja o que ele espera de você. Mãe!

 

Por Helena Fraga
Escritora, empresária e mãe do João – autista de 27 anos

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