Ao contrário de muitos dos meus amigos brasileiros e de alguns portugueses, fico triste com a detenção do antigo presidente brasileiro Lula da Silva. Seria muito mais fácil não o dizer no dia de hoje, mas digo-o, sem hesitações.
Porquê? Por três razões.
Porque, durante os quatro anos que fui embaixador português no Brasil, só recebi do presidente Lula manifestações de interesse e carinho por Portugal, que eu ali representei. Porque, depois da minha saída do Brasil, continuou a ter para comigo gestos de simpatia e atitudes reveladoras de amizade e atenção. E isso não esqueço. Estando ele na cadeia ou fora dela.
Porque faço uma avaliação globalmente positiva dos seus mandatos, do salto que fez dar à sociedade brasileira, do sopro de esperança que trouxe a pobres e desfavorecidos, da fome que tirou a milhões dos seus concidadãos e do impulso extraordinário que deu à imagem e ao papel do Brasil pelo mundo.
Mas também porque me preocupa a radicalização que a situação política interna do Brasil possa vir a sofrer, por virtude desta ação da justiça. Há uma parte importante do Brasil que tenho a certeza de que vai interpretar esta detenção como uma espécie de vingança histórico-política, para evitar a sua recandidatura em 2018.
Se a humilhação por que Lula hoje passou tiver sido gratuita, espero que alguém seja por ela fortemente responsabilizado. Não se humilha um antigo chefe de Estado sem razões muito sólidas e incontroversas. Mas que fique também bem claro: se se vier a confirmar que Lula da Silva é indiscutivelmente culpado dos crimes que lhe venham a ser imputados, desejo sinceramente que a justiça brasileira o condene e o faça pagar por isso, à medida exata das suas responsabilidades.
Digo aquilo que já disse noutro caso: acho sempre especialmente grave se se vier a provar que uma pessoa traiu a confiança democrática que o voto popular lhe confiou, para disso tirar vantagens materiais de natureza pessoal. Nesse caso, e sob prova concludente, deverá ser punida de modo exemplar. A justiça democrática por que Lula sempre disse lutar é isso mesmo.
Por Francisco Seixas da Costa
Diplomata português. Ex-Embaixador de Portugal no Brasil.