Da Redação
Com agencias
Nesta noite, é lançado na Livraria Cultura o livro da jornalista brasileira Amanda Rossi, “Moçambique: o Brasil é aqui”, analisando a presença brasileira no país africano a partir de documentos e entrevistas, incluindo nomes como Lula da Silva e Mia Couto.
O livro-reportagem sobre os negócios do Brasil em Moçambique foi produzido depois de Rossi ter passado seis meses em Moçambique em 2010, e depois mais um mês em 2013, quando retornou para conhecer as iniciativas brasileiras germinadas durante sua primeira visita.
Na viagem para a cidade de Moatize, onde ocorria uma manifestação contra as reservas de carvão da Vale, ela teve algumas surpresas. O avião que a levaria da capital Maputo para Moatize era da Embraer, a Igreja Universal de Reino de Deus estava presente na cidade e entre os manifestantes havia ex-funcionários da Odebrecht. “O Brasil estava por todos os lados”, escreve a autora da obra lançada pela Editora Record.
Ela descreve o aumento da influência de empresas e da cultura brasileira nesses três anos e a forma em que o Brasil passou de “povo irmão” para “primo rico”.
Apesar de o livro apontar que o interesse do Brasil e Moçambique existia desde os anos 1970, Luiz Inácio Lula da Silva é apresentado como o principal personagem da expansão da presença brasileira. Em entrevista à autora, o ex-Presidente afirma ter feito “apelos” para que empresários agissem de forma a não serem “imperialistas”, mas também revelou interesse “estratégico” no carvão moçambicano e em que o Brasil obtivesse mais peso internacional.
“Nós, os dirigentes políticos, fazemos o discurso, o Itamaraty prepara o memorando, mas para as coisas acontecerem tem que ter os agentes [económicos]”, afirmou Lula da Silva. Amanda Rossi contou à Lusa ter ficado surpreendida com a “naturalidade” com que o ex-Presidente falou de negócios.
A entrevista do escritor e biólogo Mia Couto é um contraponto à de Lula da Silva. O moçambicano afirma que os dois países possuem afinidades históricas, mas que algumas das forças que conduzem o Brasil são aquelas que estão em outros lugares, e buscam o lucro.
“Se viesse uma empresa da França, da Inglaterra, não havia expectativa de que fosse diferente. Com o Brasil havia uma expectativa ingénua, de que ‘com esses vamos nos entender melhor’ etc. Então o resultado final é mais grave ainda, porque há uma desilusão”, afirmou, citado pelo livro.
A obra também aborda o apoio do governo brasileiro para a instalação da Vale em Moçambique, com documentos diplomáticos secretos, e a presença das construtoras que agora são investigadas pela Operação Lava Jato, que apura crimes cometidos na petrolífera Petrobras.
“Percebi que o lóbi era visto com naturalidade [em Moçambique]. Até na imprensa brasileira, em 2003, 2004, parecia que as viagens [do Presidente] só eram bem sucedidas se houvesse negócios. Agora, com a investigação da Lava Jato, se questiona esse modelo”, afirmou Amanda Rossi.
Os projetos de cooperação também foram investigados e, segundo a autora, possuem um discurso compromissado, mas são feitos de “forma desastrada”, devido à falta de Orçamento e da criação de uma agência brasileira para a área. Rossi, que buscou não dar sua opinião no livro, defende que Moçambique tome as rédeas do seu futuro, e citou Mia Couto ao dizer que os moçambicanos devem se ver como “sujeitos da história”, não como “vítimas”.
Amanda Rossi é formada pela USP, trabalha na TV Globo, onde foi produtora do Jornal Nacional e do núcleo de reportagens especiais sobre a crise da água. Antes, integrou o Estadão Dados, núcleo de jornalismo de dados do jornal O Estado de S. Paulo.