Por Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
Conceptualizar a Gratidão como um sentimento, uma virtude, um valor social, um traço da personalidade, uma característica da educação ou uma atitude de reconhecimento, por um bem recebido, poderá ter interesse na perspectiva argumentativa, no plano teórico da construção de uma tese, no âmbito da demonstração de boas maneiras.
O essencial, porém, poderá ser abordado no plano prático, pela revelação de comportamentos coerentes e permanentes, de reverência e humildade, perante quem e/ou a quem se presta ou deve Gratidão, independentemente do tempo, do espaço e das circunstâncias em que se recebeu o benefício, posterior e definitivamente, objeto de Gratidão. Não se defende, nem se exige, uma Gratidão de humilhação, nem de subserviência, nem de dependência, nem eternamente renovada, muito embora possa ser, sempre que oportuno, sinceramente manifestada, carinhosamente invocada.
Adotar uma conduta de Gratidão acaba por ser recompensador para quem a recebe, e para quem a manifesta, trata-se de uma atitude nobre, de humildade e elevada dignidade, que só engrandece quem a pratica, verdadeira e genuinamente, mas também proporciona alegria e prazer a quem tem a generosidade de fazer bem e ver-se, assim, reconhecido, considerado, estimado, enfim, distinguido.
O mundo atual, na sua dinâmica globalizante, provoca comportamentos individuais e coletivos que, cada vez mais, se afastam dos mais elementares valores da gentileza, da humildade e da Gratidão. Quantas vezes o favor é negociado, pela troca por outro favor, por outro benefício ou por um outro valor material concreto.
A troca de favores, de influências, de cargos e posições sócio estatutárias torna-se uma prática quase corrente e, na formação dos respetivos intervenientes. Formação e educação para valores desta natureza, boas-práticas na e a partir da família, ou de grupos de amigos e comunidades mais restritas, parece não existirem, pelo menos de forma evidente e abundante. Claro que se ressalvam situações em que é necessário colaborar com pessoas de inteira confiança e, nestas circunstâncias, as nomeações e convites para este tipo de funções/cargos, compreende-se e aceita-se muito bem.
Gratidão, gentileza, humildade serão conhecimentos, princípios, valores, deveres, boas práticas, ou quaisquer outras designações que, na mentalidade de quem não os pratica, possivelmente, não se enquadram num saber-fazer que proporciona lucros, dividendos materiais em numerário ou de natureza ainda mais substantiva. Como se chega a esta insensibilidade é uma questão que se entende cada vez mais nitidamente, pelas razões já apontadas, entre outras, eventualmente, ainda mais graves.
Ao longo da vida de cada pessoa, e quando esta já viveu algumas décadas, acontecem situações que comprovam: tanto os atos de generosidade, de solidariedade, de favores, como os que se lhes seguem de reconhecimento, agradecimento ou ingratidão. A experiência de vida traz-nos muitas surpresas no futuro.
Toda a pessoa tem destas experiências e quando se verificam mais casos de ingratidão, para com a mesma pessoa, esta terá uma tendência natural para se tornar menos sensível a praticar determinadas atitudes, que conduzem a boas-práticas e à disponibilização para fazer o bem, ouvindo-se, frequentemente, lamentos e críticas no sentido de que, afinal, não é estimulante praticar boas ações, fazer favores, ajudar, porque poucas pessoas reconhecem e/ou agradecem.
Gestos tão simples como o marido agradecer à esposa uma pequena atenção, um sorriso terno, confiante e amoroso, um olhar embevecido para o seu companheiro e vice-versa, constituem motivos suficientes para o outro cônjuge revelar Gratidão, desde logo, retribuindo com idêntica espontaneidade, sinceridade e amor.
Atitudes tão bonitas e simples como dizer ao pai ou à mãe um “muito obrigado” por algo que se recebeu, um gesto mais íntimo e profundo, traduzido num beijo carinhoso, um comportamento que orgulhe o familiar, alvo de atenção especial, são atitudes que manifestam Gratidão, reconhecimento, estima e amor, seja dos filhos para com os pais e/ou destes para com aqueles.
Entre amigos verdadeiros, aqueles que, incondicionalmente, estão sempre do nosso lado, solidários, leais, íntimos no sentido da cumplicidade das dificuldades da vida, dos sucessos e dos fracassos, dos desejos e das rejeições, como é boa a troca de atos de Gratidão, reveladores, justamente de um sincero “Amor-de-Amigo”, de consideração, estima, carinho e confiança.
São estas pequenas gentilezas, amabilidades sinceras, genuínas e inesquecíveis, que vão criando no espírito da criança, do adolescente, do jovem e do adulto, sentimentos e virtudes que facilitam a harmonia familiar e, mais tarde, as relações pessoais, profissionais, sociais e institucionais na vida pública. E não há que ter vergonha destes comportamentos atenciosos.
A Gratidão é, portanto, um sentimento que se funda na virtude do reconhecimento, da homenagem e da amizade, porque quem é alvo de Gratidão é porque: primeiro, procedeu para com outrem de forma excecional, a que, eventualmente, nem estaria obrigado a tal, então, o beneficiário da atenção recebida, sente-se como que realizado na sua capacidade de agradecer quando manifestar Gratidão, ao ponto de o fazer com um misto de amizade, orgulho e admiração; depois, entre as pessoas envolvidas estabelece-se, de ora em diante, como que um cordão umbilical duradoiro, pelo qual circulará uma amizade e benquerença que, obviamente, conduz a uma maior harmonia, tranquilidade e realização pessoal. A Gratidão não humilha, nem minimiza quem a manifesta, pelo contrário, enobrece, engrandece e dignifica a pessoa que sabe ser GRATA.
Venade/Caminha – Portugal, 2020
Por Diamantino Lourenço Rodrigues de Bártolo
Presidente do Núcleo Académico de Letras e Artes de Portugal
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