Da Redação
Com agências
O Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) vai suspender a licença da Zona de Caça de Torrebela, na Azambuja, com efeitos imediatos, apresentando ao Ministério Público uma participação de crime contra a preservação da fauna.
“No processo de averiguação realizado pelo ICNF, no qual está a ser coadjuvado por uma brigada da GNR/SEPNA, foram recolhidos fortes indícios de prática de crime contra a preservação da fauna durante uma montaria realizada em 17 e 18 de dezembro, na qual terão participado 16 caçadores”, adianta.
A nota lembra que o ministro do Ambiente e da Ação Climática, João Matos Fernandes, vai ainda convocar o Conselho Nacional da Caça para, no início do ano, se realizar uma reflexão sobre a prática de montarias em Portugal.
“É entendimento do ministério que são necessárias alterações à lei para impedir que os vis acontecimentos relatados se repitam”, acrescenta.
Na segunda-feira, o Instituto da Conservação da Natureza abriu um processo para averiguar junto da Zona de Caça Turística de Torre Bela, concessionada à Sociedade Agrícola da Quinta da Visitação, SAG, Lda., “os fatos ocorridos e eventuais ilícitos” relacionados com estes abates.
Numa nota enviada à comunicação social, o ICNF referiu na segunda-feira que “não teve conhecimento prévio desta ação” e que iria averiguar os fatos, devido à elevado número de animais em causa.
A Câmara da Azambuja disse não ter recebido “qualquer informação oficial relativamente à montaria ocorrida na Quinta da Torre Bela”, tendo apenas tido conhecimento da mesma através das redes sociais.
Tal como o ICNF, a autarquia referiu que a Quinta da Torre Bela é uma propriedade privada onde existe uma zona de caça turística particular.
“O município de Azambuja já avançou com uma comunicação para o ICNF e para o Ministério da Agricultura a solicitar toda a informação sobre o ocorrido, para que estas entidades verifiquem a legalidade desta ação, assim como, a quantidade de animais abatidos e qual o destino dos mesmos”, disse a autarquia.
O caso repercutiu nas redes sociais. Segundo o partido PAN – Pessoas-Animais-Natureza, foram abatidos 540 animais numa montaria realizada na Quinta da Torre da Bela, em Aveiras de Cima (concelho de Azambuja, distrito de Lisboa).
“No entender do PAN, matar por regozijo e desporto é simplesmente desumano e representa um grave retrocesso civilizacional. O PAN tem defendido uma regulamentação apertada para o setor da caça decorrente dos visíveis impactos negativos para a biodiversidade, proteção e bem-estar animal e ainda que as nossas propostas não tenham tido acolhimento parlamentar até à data não deixaremos de pugnar por uma legislação mais apertada e justa” divulgou o partido.
Segundo o governo português, “É entendimento do Ministério que são necessárias alterações à lei para impedir que os vis acontecimentos relatados se repitam”, traz nota divulgada pela pasta.
Federação Caça
A Federação Portuguesa de Caça (FENCAÇA) repudiou o abate de 540 animais, adiantando que a caçada terá ocorrido para poder ser construída uma central fotovoltaica no local, um projeto com mais de 750 hectares (ha) para aquele local, no distrito de Lisboa, que se encontra em processo de consulta pública.
“Tomámos conhecimento pelas redes sociais e pela comunicação social de que este fim de semana teriam sido realizadas caçadas na Herdade da Torre Bela, concelho da Azambuja, onde teriam sido abatidos cerca de 540 exemplares de caça maior, naquilo que foi apresentado como um ‘extermínio’, para alegadamente dar lugar a uma central fotovoltaica”, avançou a entidade em comunicado.
Alertando para a polêmica em torno do projeto, a FENCAÇA adiantou que a empreitada obrigaria também ao abate de um número elevado de sobreiros, espécie florestal que possuí estatuto de proteção, e pediu ao Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) para investigar esta caçada.
“Importa assim que o ICNF averigue urgentemente as circunstâncias em que este abate ocorreu na Herdade da Torre Bela e se o mesmo foi uma ação de gestão da população, devidamente programada e nos termos previstos na lei, necessariamente com caráter sustentável; ou se, pelo contrário, ocorreu um abate massivo de animais tendo em vista o seu ‘extermínio’, aniquilando o património cinegético aí existente […]”, indicou a federação.
Segundo a FENCAÇA, os princípios da caça terão sido violados, bem como os princípios gerais da Lei de Bases Gerais da Caça.
“Apesar de a Herdade da Torre Bela ser uma propriedade murada, nunca aí poderia ocorrer um ‘extermínio’ das populações de caça maior (como noticiado por vários órgãos de comunicação social), exceto no caso de se tratar de uma impreterível medida de emergência sanitária, designadamente para contenção de um surto, o que teria de ser previamente decretado pelo ICNF em conjunto com a DGAV [Direção-Geral de Alimentação e Veterinária], o que não terá sido o caso”, acusou.
Sobre as imagens divulgadas nas redes sociais, a FENCAÇA considerou que as mesmas indiciam que poderão ter sido “violadas algumas disposições legais e procedimentos, desde logo uma deficiente utilização de selos para marcação de exemplares abatidos”.
De acordo com a organização, os selos devem ser adquiridos previamente aos atos de caça.
A Federação Portuguesa da Caça lamenta ainda a forma como os organizadores do evento reagiram nas redes sociais, que se terão vangloriado do “abate massivo, contrariando todos os princípios éticos que devem estar subjacentes ao nobre ato de caçar”.
O ministro do Ambiente porém contestou a afirmação sobre o projeto no local. “Aquilo que o estudo de impacto ambiental diz é que uma parte daqueles animais têm de ser dali removidos. Remover não é abater”, sublinhou Matos Fernandes, acrescentando que “há muitas formas de o fazer e esta é abaixo da pior”.