Mundo Lusíada com Lusa
O secretário-geral das Nações Unidas pediu neste dia 11 flexibilidade e ambição máximas nas negociações finais da cimeira do clima, mas sem perder de vista os objetivos assumidos no Acordo de Paris.
“Estamos numa corrida contra o tempo”, disse António Guterres, defendendo que “é tempo para ambição máxima e flexibilidade máxima”.
No dia em que começam as negociações finais na 28.ª Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP28), a decorrer no Dubai, o secretário-geral da ONU pediu aos países que não percam de vista os objetivos assumidos no Acordo de Paris e defendeu que o único caminho é o fim dos combustíveis fósseis.
Adotado em 2015, o Acordo de Paris impôs como objetivos a redução das emissões de gases com efeito de estufa para a atmosfera e a limitação do aumento das temperaturas mundiais além de 2ºC acima dos valores da época pré-industrial, e de preferência que não aumentem além de 1,5ºC.
O primeiro balanço do acordo está a ser feito na COP28, através do Global Stocktake, cujo texto final deverá ter alguma referência ao fim dos combustíveis fósseis, um tema que não está, no entanto, a ser consensual entre as partes.
“É essencial que o Global Stocktake [o principal mecanismo através do qual são avaliados os progressos efetuados no âmbito do Acordo de Paris] reconheça a necessidade de iniciar a eliminação de todos os combustíveis fósseis num período consistente com a meta de 1,5ºC e de acelerar uma transição energética justa para todos”, afirmou António Guterres, numa declaração aos jornalistas.
Neste momento, estão ainda em cima da mesa diferentes opções de formulação do que diz respeito ao tema dos combustíveis fósseis: duas, fortemente contestadas pelos produtores de petróleo, que referem a eliminação dos combustíveis fósseis, e outras duas que apontam apenas o fim dos combustíveis fósseis em que não é possível a captura de carbono, chamados ‘unabated’.
Insistindo na eliminação dos combustíveis fósseis alinhada com as metas de Paris, António Guterres ressalvou, no entanto, que “não significa que todos os países tenham de eliminar os combustíveis fósseis ao mesmo tempo, mas que, globalmente, a eliminação tem de ser compatível com a neutralidade carbônica até 2050 e a limitação do aumento da temperatura a 1,5ºC.
Outros dos aspectos fundamentais, acrescentou o secretário-geral, é a ambição em relação ao tema da adaptação às alterações climáticas, outra das matérias menos consensuais nestas negociais.
Sobretudo no que diz respeito ao apoio dos países em desenvolvimento, António Guterres defendeu um esforço acrescido pelos países entre os maiores emissores de gases com efeito de estufa, mais financiamento climático, mas também mecanismos que aliviem a “situação financeira dramática” que muitos desses países enfrentam.
“Uma das coisas essenciais é que todos os compromissos assumidos por países desenvolvidos sejam implementados de forma transparente, mas não vamos resolver os problemas de equidade em relação ao clima apenas com financiamento climático”, sublinhou.
Em concreto, António Guterres defendeu na arquitetura financeira internacional, mecanismos de alívio da dívida e o aumento de capital e mudança do modelo de negócio dos bancos internacionais multilaterais.
“Os próximos dois anos são vitais”, afirmou o responsável, que espera que os países saiam do Dubai “com uma compreensão clara daquilo que é exigido entre este momento e a COP30”, que se realiza em 2025 no Brasil.
A COP28 começou em 30 de novembro e está a decorrer até dia 12 no Dubai. Depois de vários dias com um programa temático, os dias de hoje e terça-feira serão dedicados apenas às negociações finais.
Portugal
No domingo, a secretária de Estado da Energia e Clima reconheceu a dificuldade de chegar a um consenso sobre o tema dos combustíveis fósseis, mas reafirmou a posição de Portugal quanto à sua eliminação nas próximas décadas. Ana Fontoura Gouveia afirmou que, da parte de Portugal e da União Europeia, os combustíveis fósseis são mesmo para eliminar até 2050.
“A matéria dos combustíveis fósseis é uma das mais difíceis e é por isso que aqui estamos, para conseguir encontrar uma linguagem comum. O objetivo central é que os combustíveis fósseis sejam eliminados até 2050”, disse a governante em declarações aos jornalistas ao final do dia.
Na discussão do ‘Global Stocktake’ – principal mecanismo através do qual são avaliados os progressos no âmbito do Acordo de Paris, cujo balanço está a ser feito este ano pela primeira vez – estão em cima da mesa diferentes opções de formulação do que diz respeito ao tema dos combustíveis fósseis.
Duas das opções, fortemente contestadas pelos produtores de petróleo, referem a eliminação dos combustíveis fósseis, enquanto outras duas apontam apenas o fim dos combustíveis fósseis em que não é possível a captura de carbono, chamados ‘unabated’.
“As tecnologias que nos permitem capturar as emissões de carbono associadas aos combustíveis fósseis são muito caras ou ainda inexistentes, portanto, o caminho tem de ser a eliminação dos combustíveis fósseis até 2050”, insistiu a secretária de Estado.
À beira das negociações finais, o tema continua a ser dos menos consensuais, mas Ana Fontoura Gouveia acredita que será possível um acordo até ao final previsto da cimeira, na terça-feira, e espera, acima de tudo, que o resultado permita cumprir os objetivos da União Europeia.
“Temos muitos textos, muitas propostas, muitas discussões bilaterais no sentido de aproximarmos posições. Estamos muito convictos de que, com mais algum trabalho, conseguiremos chegar a um texto final que esteja à altura daquilo que nos trouxe a todos ao Dubai”, antecipou.
Questionada sobre a posição de alguns países produtores de petróleo e comentando também a hipótese de a próxima cimeira se realizar no Azerbaijão, a secretária de Estado considerou que “essas são as geografias certas para termos esta discussão”.
“Não podemos ter uma discussão séria sobre uma transição climática se excluirmos estes países que, na verdade, estão aqui comprometidos com o diálogo. É isso que temos visto”, referindo o exemplo dos Emirados Árabes Unidos e do presidente da COP28, Sultan Al Jaber, que é também presidente da companhia petrolífera nacional.
Apesar de declarações polêmicas antes do início da cimeira, quando considerou que a transição energética muito rápida seria voltar à “idade das cavernas”, Al Jaber retratou-se entretanto e, no entender da secretária de Estado portuguesa, o presidente da COP28 “tem colocado a fasquia muito alta”.
“Tem sido uma força motriz de mais compromisso por parte daqueles países que poderiam querer sair desta COP com menos ambição”, referiu.
Já o ministro do Ambiente e da Ação Climática defendeu a necessidade de um forte consenso para que o processo que levou à criação da nova área marinha protegida no Algarve seja replicado. “É importante ter toda a gente no mesmo barco para manter compromissos para o futuro e poder replicar este processo”, afirmou Duarte Cordeiro.
O ministro falava numa sessão sobre o Parque Natural Marinho do Recife do Algarve – Pedra do Valado, que decorreu no Pavilhão de Portugal na COP28, dia 09, e juntou representantes de vários intervenientes no processo.
Aprovada há duas semanas, dois anos e meio depois de ter sido proposta, é a primeira área marinha protegida criada em Portugal em mais de duas décadas e um passo na meta do Governo de criação de 30% de áreas marinhas protegidas até 2026.
“É uma tarefa enorme”, sublinhou Duarte Cordeiro, acrescentando, por outro lado, que se foi possível no Algarve, numa zona com uma forte pegada turística, “é possível em quase qualquer lado”.
Não é a primeira que a Pedra do Velado é referida por Portugal na COP28 e, ao longo de vários dias, foi destacada por vários governantes que passaram pela cimeira, desde logo pelo primeiro-ministro como dos exemplos da preservação da biodiversidade marinha que o país quer passar aos restantes países.
No mesmo debate, promovido pela Fundação Oceano Azul e pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, um dos investigadores responsáveis sublinhou ainda a importância desta área marinha protegida de interesse comunitário no contexto do combate às alterações climáticas.
“Esta tem das únicas pradarias marinhas do país e agora vão ser protegidas”, sublinhou Jorge Gonçalves, investigador do Centro de Ciências do Mar da Universidade do Algarve, recordando o papel destes ecossistemas na captação e armazenamento de dióxido de carbono.
“Agora temos o início de um novo processo”, acrescentou, por outro lado, a presidente da Câmara Municipal de Silves, Rosa Palma, considerando que agora o desafio é assegurar a preservação daquela área, uma responsabilidade ainda maior.