Mundo Lusíada com Lusa
Em nome do governo de Portugal, o primeiro-ministro Antonio Costa condecorou hoje com a Medalha de Mérito Cultural o músico brasileiro Caetano Veloso.
“Artista consagrado no Brasil e no mundo, Caetano foi um dos músicos brasileiros que ajudou a minha geração a ouvir o português em canção. Perceber que a palavra cantada não tinha de ser só em inglês” publicou Antonio Costa, após a homenagem.
Combinando gêneros musicais, sotaques e palavras que cruzam o Atlântico, Caetano Veloso “mostra-nos a graça e a riqueza da nossa língua comum. A sua obra, das mais extraordinárias e inventivas do nosso tempo, é um motivo de orgulho para todos os que falam português” declarou Costa.
António Costa afirmou que a voz de Caetano Veloso “é universal”, em cerimônia na residência oficial de São Bento, em Lisboa.
“Artista consagrado no Brasil e no mundo, cantor e autor de canções populares que conhecemos de cor e fazem pate das nossas vidas. O seu canto foi e é um poderoso veículo de afirmação e divulgação da língua portuguesa”, disse o primeiro-ministro, referindo que há cerca de uma semana quando o músico recebeu o Doutoramento “honoris causa” pela Universidade de Salamanca, em Espanha, “fez uma defesa apaixonada da língua portuguesa”.
“Na língua como na música, Caetano esteve sempre ciente do patrimônio e da tradição em que se insere, mostrando que isso não era incompatível com o oposto ou uma incessante inovação e renovação”, disse Costa, no evento desta terça-feira.
Entrega da Medalha de Mérito Cultural a Caetano Veloso https://t.co/OKpoWxOI7v
— República Portuguesa (@govpt) September 12, 2023
A cerimônia, iniciada com 40 minutos de atraso sobre a hora prevista, decorreu no jardim da residência oficial do chefe do Governo, em S. Bento, em Lisboa, e contou com a participação “surpresa” da fadista Carminho, que interpretou “Os Argonautas” (FernandoPessoa/Caetano Veloso) e “O Quarto” (Carminho/Fado Pagem de Alfredo Marceneiro).
Assistiram à sessão o ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, e a mulher de Caetano Veloso, Paula Lavigne.
António Costa, no seu discurso, referiu a canção “Língua”, de Caetano Veloso, que “é todo um tratado da sua visão da língua portuguesa”, “onde cabem Luís de Camões ou Fernando Pessoa, Carmem Miranda ou o sambódromo, a [escola de samba] A Mangueira, ou Luanda”.
“O Governo português presta-lhe esta pública homenagem, em reconhecimento da extraordinária contribuição que tem dado para a criação em língua portuguesa, e para a promoção do diálogo cultural entre Portugal e o Brasil, pela divulgação em todo o mundo, do pensamento e da cultura em língua portuguesa”.
O chefe de Governo citou o verso de Caetano, “A língua é a minha Pátria e eu não quero Pátria, Tenho Mátria, quero Frátria”, para referir o programa de intercâmbio de estudantes no âmbito da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), a exemplo do programa Erasmus, na União Europeia, e que se denominará “Frátria”, como ficou decidido na última cimeira desta comunidade, realizada em finais de agosto em S. Tomé.
O chefe do executivo salientou: “Caetano Veloso reconciliou-nos com a nossa própria poesia, o nosso fado, os nossos heróis e heroínas”.
Costa recordou o episódio acontecido em 1985, no Coliseu dos Recreios, em Lisboa, ao qual assistiu a fadista Amália Rodrigues, tendo o músico interpretado “Estranha Forma de Vida” (Amália Rodrigues/Fado Bailado de A. Marceneiro). Deste modo “prestou uma sentida homenagem” à fadista e deu testemunho da “sua forte influência” na sua formação musical.
“Caetano e Amália estreitaram num longo abraço”, e se tal hoje pode “parecer banal”, não o era à época. “Caetano fez uma plateia inteira emocionar-se e render-se a Amália Rodrigues”.
Sobre este episódio, o primeiro-ministro citou o musicólogo Rui Vieira Nery, que considerou que “esse foi um momento decisivo que constituiu para o reencontro e o renascimento e a reabilitação do Fado e da própria Amália para um determinado público português”.
A sua versão foi escolhida para a banda sonora do novo filme de Pedro Almodóvar, “Estranha Forma de Vida”.
“Caetano Veloso tem colaborado incessantemente, com artistas portugueses de novas gerações, continuando a cruzar o Atlântico, combinando gêneros musicais, sotaques e palavras da nossa língua comum, roçando a sua língua na de Camões”.
Agradecimento
Caetano agradeceu a distinção, desde logo, “pela sorte ambígua, mas indubitavelmente sorte, de ter nascido num país que predominantemente fala português”.
“O fato de o Brasil ser um país lusófono é, para mim, quase um milagre”, disse o músico referindo a influência do espanhol “ao redor”, das músicas da Argentina, México ou Cuba, e os “ecos da língua inglesa”.
“O fato de falar português honra-me e dá-me responsabilidades [pois] devemos lutar pelo brilho disso”, disse o músico afirmando que recebeu a homenagem “modestamente”.
Caetano Veloso recebeu a Medalha de Mérito Cultural poucas horas antes do seu terceiro e último concerto em Lisboa, no Coliseu dos Recreios.
O músico encontra-se em Portugal, no âmbito da digressão “Meu Coco”, que teve início no país no passado dia 09, e passará ainda pelo Coliseu do Porto, na quinta e na sexta-feira, para mais dois concertos já esgotados.
A Medalha de Mérito Cultural distingue pessoas singulares ou coletivas, nacionais ou estrangeiras, pela sua dedicação à Cultura.
A cantora Maria Bethânia, irmã de Caetano Veloso, que recebeu a Medalha de Mérito Cultural no passado mês de julho, a atriz brasileira Fernanda Montenegro o arquiteto Álvaro Siza, a pianista Maria João Pires, a escritora Maria Teresa Horta, a pintora Paula Rego, a artista Lourdes Castro, o ensaísta EDuardo Lourenço e o livreiro José Pinho estão entre anteriores distinguidos.