Garrafa com cinco séculos guarda o início da história de Portugal com Macau

Garrafa Jorge Álvares – Garrafa de 1522 do mercador abastado, que teve como sócio Fernão Mendes Pinto, é um dos objetos em exposição que conta a relação entre Portugal e Macau, patente no Centro. Foto ANDRÉ KOSTERS/LUSA

Da Redação com Lusa

Uma garrafa de porcelana com cinco séculos e a última bandeira hasteada na transferência da administração de Macau são alguns dos objetos que contam a relação entre Portugal e a região no Centro Científico e Cultural de Macau, em Lisboa.

Estas são apenas duas das cerca de 4 mil peças patentes no espaço museológico do Centro Científico e Cultural de Macau (CCCM) e que pretendem “dar uma ideia de 5.000 anos de história e arte chinesa, que vai desde o período neolítico até ao início do século XX”, como explicou o diretor do museu, Rui Dantas.

Neste espaço, os visitantes podem perceber “como Macau foi criado e as relações que se estabeleceram entre a Europa e a Ásia, a partir de Macau”.

O acervo conta com exemplares das primeiras cerâmicas neolíticas, até terracotas funerárias, bronzes, cerâmica song, objetos para o fumo do ópio, pinturas, pratas e leques, entre outros.

Um dos objetos em destaque é uma garrafa decorada que foi encomendada, em 1522, por Jorge Álvares, um mercador abastado de Freixo Espada à Cinta que teve como sócio Fernão Mendes Pinto e foi um dos pioneiros portugueses no negócio da porcelana.

A obra assinala o início do comércio da porcelana, sendo uma das primeiras peças de encomenda no arranque de um vasto percurso de trocas comerciais, explicou o diretor do Museu de Macau.

Outra peça em destaque é um Buda assinado pelo artista cerâmico Pun Yu Shu, discípulo do célebre mestre da cerâmica de Shek Wan, e que foi encomendada pelo colecionador Silva Mendes, o primeiro europeu a colecionar pelas de qualidade com as características da cerâmica de Shek Wan.

O espaço conta com um apontamento sobre a transferência (da administração do território de Portugal para a China), tendo exposta a última bandeira a ser arreada nas cerimônias oficiais da transferência da administração de Macau, em 1999.

Foi precisamente esse o ano em que o CCCM foi criado, com o objetivo de “promover o conhecimento das relações entre a Europa e a Ásia”, propósitos que se mantêm, com uma forte componente na formação, segundo a presidente do Centro, Cármen Mendes.

Nesta área, destacou o curso de Cultura e Língua Chinesa, recordando que o Centro foi “a primeira instituição a lecionar este curso em Portugal”.

Segundo Cármen Mendes, este é um centro “vivo”, com a passagem de muitos investigadores, doutorandos, bolseiros e pessoas interessadas nas relações entre Portugal e a Ásia, e outras que simplesmente não resistem a ofertas de formação como, por exemplo, sobre o patuá (crioulo de Macau) ou o guzheng (instrumento de música tradicional chinesa), administradas neste espaço.

“Temos cada vez mais visitantes, não só na nossa biblioteca – que é a melhor biblioteca com obras sobre a Ásia em Portugal, que reúne investigadores e outros interessados na Ásia -, o nosso museu e os cursos de formação que vamos lecionando para especialistas, acadêmicos e também a sociedade civil e o público em geral”, indicou à Lusa.

Ao nível da investigação, sublinhou, “o centro tem tido um papel pioneiro na ligação de todos os acadêmicos que trabalham sobre a Ásia em Portugal, alguns portugueses no estrangeiro e alguns estrangeiros com fortes ligações à academia portuguesa”.

Destacou ainda as Conferências da Primavera, que reúne cerca de 180 oradores e a atribuição de bolsas de doutoramento anuais, financiadas pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), que tutela o Centro, a estudantes de doutoramento que fazem investigação sobre a Ásia.

O CCCM conta com 25 bolseiros de doutoramento, voluntários que neste espaço conseguem uma grande proximidade com a Ásia.

“Temos aqui pessoas das mais diversas áreas disciplinares – da arte, religião, língua, cultura, também história e economia, mas há algo que as une: A paixão pela Ásia”, afirmou

Cármen Mendes mostra-se entusiasmada com a criação de uma incubadora científica e acadêmica, que “vai permitir investigadores, empresários e até artistas terem esta ligação a Macau, através da Universidade de São José, a Universidade Católica de Macau”.

Em relação à biblioteca, a chefe da divisão de Informação e Documentação do CCCM, Helena Dias Coelho, apresenta-a como primeiramente “vocacionada para o estudo das relações entre Portugal e Macau” e, mais tarde, alargado a toda a Ásia.

“Somos sobretudo procurados por estudantes de estudos asiáticos, investigadores, muito por jovens estudantes de ensino superior, doutorandos e a nossa documentação responde a este tipo de procura”, disse à Lusa.

Nessa biblioteca, as obras mais procuradas são as gerais da história da Ásia, mas também os espólios, nomeadamente do monsenhor Manuel Teixeira, um historiador que viveu em Macau, onde publicou mais de uma centena de livros e centenas de artigos na imprensa.

Foi o próprio que doou o seu espólio ao CCCM, estando o mesmo devidamente tratado e consultável, repartido entre livros, fotografias, textos e pequenas notas.

Nos arquivos desta biblioteca está ainda uma coleção de microfilmes constituída por cerca de 7.000 microfilmes, com mais de 50.000 documentos essenciais para o estudo de Macau e das suas instituições, entre o início do século XVII e meados do século XX.

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