Faro Vestida de Fado

Foto Jean Carlos Vieira Santos

Por Jean Carlos Vieira Santos

Em 2023, tive a honrosa oportunidade de retornar a Faro, cidade localizada no destino turístico internacional Algarve, sul de Portugal. Após um tempo de reflexão sobre a viagem, tentarei apontar, nestas linhas, algumas sensações a partir do olhar empírico ao registrar, em palavras, o sentimento de que tal lugar está mais fadista, principalmente em comparação a outros tempos vividos, nos quais fui residente ou visitante.

A sensação foi que Faro está mais vestida de fado, com um número maior de eventos/concertos em restaurantes, entre eles “O Castelo e Centenário”, na Igreja da Misericórdia, no Posto de Turismo do Algarve. Nesse caso, têm sido promovidos o recital de guitarra portuguesa, no Museu Municipal, e o trabalho da Associação de Fado do Algarve (AFA), grupo sem fins lucrativos com experiências únicas na região turística. De fato, viver em tais lugares foi entrar em um universo à parte: o mundo do Fado no destino turístico.

Em torno desses apontamentos e ao compreender que as palavras são feitas para os relatos de viagens e as nossas experiências ganharem significados, elaboro uma articulação singular do fado com Faro, especialmente em dois restaurantes, cuja construção se associa a perspectivas dos lugares. Diante de um caminhar contemplativo observamos que, no restaurante “O Castelo”, além do palco, das fadistas, da guitarra portuguesa, da gastronomia lusitana e algarvia e da paisagem Ria Formosa, foi possível escrever algumas perspectivas mediadas por esse encontro: “Toda vestida de fado, voz do sul/Que cantava no palco, entre as muralhas de Faro/De mãos dadas com a saudade, dessa voz não esqueço/Uma voz adentro, que entoava a saudade na Cidade Velha/Ofertando sua voz a toda gente no “O Castelo”/Toda vestida de fado, voz do sul/Adormecida de fé, cantava para a Sé e a Ria/E, no caminho da saudade, cantava para a noite que brilhava na Ria/Numa guitarrada em oração, sentia-se Faro vestida de Fado/Entregando-se à poesia de Passos, onde tudo é história e fado/Onde o destino é ficar/Toda vestida de Fado entre as muralhas de Faro”.

Essa “voz do sul” destacada no fragmento acima representa inúmeras vozes fadistas algarvias da AFA ou não, algo que tem fortalecido a singularidade musical da baixa de Faro em um recorte espacial urbano que apresenta as estratégias de permanência de uma música considerada Patrimônio Imaterial da Humanidade, associada à gastronomia e à atividade turística. São lugares eleitos pelos sujeitos que, nos últimos anos, intensificam a presença do fado no Algarve.

Na revisita a Faro, desvelei lugares e territórios conhecidos, como o restaurante “Centenário”. Nesse viajar experiencial, as expressões deram relevo ao sentimento: “Passar pelo Centenário, é deixar-te envolver/É deixar-te envolver pela força do fado/É prender a alma à essência do silêncio/Dos acordes nas noites de fado/É deixar-te envolver por essa combinação tão cheia de sentimentos/Ninguém resiste aos seus temas e ritmos/Que tocam fundo as memórias e afetos/E toda gente fecha os olhos/Como se fossem de encontro à emoção contida/Transportando os sentimentos afetivos/Passar pelo Centenário na baixa de Faro/É a forma ideal de terminar uma tarde/Na alma dessa casa, canecas de vinho, fadistas e guitarras/Toda gente se rende ao silêncio da tarde/Se rende à sinfonia de vozes e guitarras/Passar pelo Centenário na baixa de Faro/É a forma ideal de terminar uma noite de fados/E, nas paredes, desenhos confessam o fascínio/Onde o silêncio vai à mesa/E, nessa linguagem, sentimentos viajam”.

Assim, posso afirmar que o relato “Faro vestida de Fado” foi um reencontro que superou as expectativas de um viajante estrangeiro, ao caminhar pela baixa farense que nos revelou novos conteúdos, envolvências, olhares e o desejo de escrever sem a ousadia de ser poeta, mas ao expor, em tom de ensaio, uma narrativa de viagem, uma linguagem viajante que se rendeu à sinfonia de vozes e guitarras.

 

Por Jean Carlos Vieira Santos

Professor e Pesquisador da Universidade Estadual de Goiás (UEG/TECCER-PPGEO). Pós-doutorado em Turismo pela Universidade do Algarve (UALg/Portugal) e Doutorado em Geografia pela Universidade Federal de Uberlândia (IGUFU/MG).

 

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