Por Thais Matarazzo
Também conhecida como Maria Alcina Fadista. É uma legenda do Fado na Cidade Maravilhosa. Durante 23 anos, de 1976 a 1999, dirigiu o restaurante típico A Desgarrada, no Rio de Janeiro, que se tornou uma referência ao seu nome.
Chegou ao Brasil aos 14 anos, em 1953, em companhia da sua mãe, estabeleceram-se no Rio. Aos 18 anos, casou-se com um brasileiro e teve três filhas, Alcineli, Eliane e Ângela. Começou a cantar profissionalmente aos 20 anos, em 1959, quando foi ouvida por Edson Santana, o “Rei Momo”. Santana a convidou para participar do seu programa Era do Rádio, na Rádio Vera Cruz.
Sua estreia nas noites paulistanas aconteceu por intermédio da fadista Adélia Pedrosa. “Em 1964 a Adélia fazia uma temporada na ‘Lisboa Antiga’, em São Paulo, e de repente ela foi convidada para ir cantar na Argentina. Indicou meu nome para substituí-la. O dono da casa me perguntou se eu sabia cantar a desgarrada. Respondi que sim, mas não sabia. Acontece que eu precisava trabalhar pois tinha três filhas pequenas. Mas na minha família tinha bons improvisadores. Uma noite eu assisti o Manuel Taveira cantar a desgarrada com outra fadista e aprendi na hora. A necessidade fez-me aprender depressa. E depois acabei por me tornar a ‘Rainha da Desgarrada’! Fiz durante muitos anos dupla com o fadista Antônio Campos”, narra Maria Alcina.
Sobre a sua estreia, o cronista Monterri registrou no Diário da Noite de 5/6/1964. “Maria Alcina, um dos grandes valores da música e da canção portuguesa, aconteceu ontem pela primeira vez, nos jantares da Adega Lisboa Antiga. O público gostou e aplaudiu a nova intérprete, que com muita graça participou da desgarrada”. E nos próximos sete meses, Maria Alcina continuou agradando em todos os sentidos, com sua classe e simpatia, o público do endereço da Rua Brigadeiro Tobias. Todas as noites eram seus colegas no revezamento dos shows Terezinha Alves, Manuel Taveira e o Trio Manuel Marques.
“Eu era uma pessoa muito simples e todos gostavam de mim. Fiquei muito amiga do Manuel Taveira e da Terezinha Alves, que, naquela altura, era famosa e vestia-se muito bem. Durante a semana ficava em São Paulo e nos finais de semana voltava ao Rio para rever minhas filhas. Como eu só falava delas e chorava de saudades, meus colegas e os clientes da ‘Lisboa Antiga’ me traziam muitos presentes para as meninas. Quando chegava em casa era uma festa! Eu era muito responsável e quase não saia do hotel onde estava hospedada. Nunca fui boêmia, nunca bebi e nem fumei, por isso, não conheci outras casas noturnas na cidade.
Depois desta primeira temporada, voltei diversas vezes a São Paulo. Fui muito feliz na Pauliceia. Do Rio de Janeiro vinham muitos artistas para cantar porque o dinheiro estava em São Paulo”.
Em 14 de julho de 1969, aconteceram duas estreias na “Lisboa Antiga”, a fadista Maria Alcina e o sambista José Domingos. Foi uma noite diferente e curiosa, como escreveu Monterri no Diário da Noite em 14/7/1969. “A famosa fadista Maria Alcina, que vem do Rio, depois de obter es trondoso sucesso na Lisboa Antiga, onde se apresentou por longa temporada, é uma das estreias. A outra é um cantor brasileiro, por demais conhecido em nossa vida noturna,
trata-se do sambista José Domingos, sócio-proprietário do Bar Arabesque, da Rua Jesuíno Paschoal. Com ingresso desses formidáveis valores, ficará assim composto o cast artístico-musical, que a partir de hoje terá a missão de abrilhantar os jantares cotidianos do endereço português na Rua Brigadeiro Tobias: Dino Meira, cantor romântico; Mário Simões, o showman do momento; Maria Alcina, a comandante das desgarradas; como complemento tornando os shows dessa casa um misto de luso-brasileiro, o extraordinário, cantor e violonista, Zé Domingos. Com respeito ao conjunto musical privativo da Lisboa Antiga, continuará o mesmo, tendo Aquiles Bernardo e Alípio Correia, as guitarras, e Alcídio Guerra, ao violão”.
Mais detalhes sobre a carreira artística de Maria Alcina podem ser encontrados no livro Fado no Brasil: Artistas & Memórias (2013), também de nossa autoria.
Por Thais Matarazzo
Trecho do livro “O Fado nas Noites Paulistanas…” (2015), de Thais Matarazzo, Editora Matarazzo (São Paulo-SP).