ENTREVISTA: Observatório das Migrações quer ajudar políticos a decidir sem preconceitos

Da Redação com Lusa

 

O Observatório das Migrações (OM) vai procurar coligir dados que ajudem a acabar com preconceitos sobre imigrantes e retratem a realidade para ajudar os políticos a tomar decisões, anunciou hoje recém-nomeado diretor científico da instituição.

Em entrevista à Lusa, Pedro Góis afirmou que o seu objetivo é que o “observatório seja um órgão independente, que construa conhecimento e que ajude as políticas públicas a funcionarem de uma forma mais concertada com a realidade”.

Ao observatório, que integra a estrutura da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA), cabe a responsabilidade de produzir e gerir estatística associada ao fenômeno, mas Pedro Góis quer “pensar a realidade com a comunidade científica” em Portugal.

O investigador quer também envolver “a comunidade epistêmica que trabalha sobre migrações” para conseguir apresentar os melhores resultados possíveis no acolhimento e na integração dos imigrantes.

Atualmente, o discurso anti-imigrantes tem vindo a subir entre várias forças partidárias, o que tem alterado políticas em vários países europeus, algo que preocupa Pedro Góis.

“São tempos desafiantes, sobretudo porque a maioria dessas decisões se baseiam em preconceitos e não em factos”, afirmou, salientando que, “na maioria dos casos, há uma percepção desta insegurança causada pelos migrantes, uma invasão causada pelo grande número de migrantes, que não corresponde de todo à realidade”.

Na sua opinião, a “responsabilidade de chegarem mais migrantes à Europa é da própria Europa, porque estes migrantes vêm preencher postos de trabalho que estão disponíveis no seio deste espaço da União Europeia que os cidadãos da União Europeia já não querem ou não são competitivos por exigirem salários mais elevados”.

Segundo o investigador da Universidade de Coimbra, “o mercado de trabalho é o grande impulsionador das migrações e é regulando o mercado de trabalho, trabalhando sobre as alterações estruturais do mercado de trabalho que conseguiremos governar as migrações no futuro próximo”.

As recentes alterações estruturais na AIMA e a criação de uma Unidade de Estrangeiros e Fronteiras dentro da PSP são decisões saudadas por Pedro Góis.

“Com o esvaziamento do SEF [Serviço de Estrangeiros e Fronteiras] nos últimos anos da sua existência e depois com a sua extinção, tínhamos perdido um conhecimento muito útil que existia no próprio SEF, porque o SEF não era apenas uma polícia, era um conjunto de profissionais dedicados a trabalhar as migrações e os estrangeiros”, explicou.

Os inspetores do SEF foram transferidos para a Polícia Judiciária, mas a organização policial “não é chamada no dia a dia a lidar com crimes de tráfico, com exploração de migrantes, com situações de pequena criminalidade no dia a dia ou com a questão da gestão das fronteiras”, referiu Pedro Góis.

“O sistema ainda não está equilibrado” e “esta tentativa de criar na PSP uma unidade de estrangeiros e fronteiras é porque, de facto, existia um vazio”, salientou o investigador.

Até porque a “AIMA não é uma polícia, é uma agência administrativa”, salientou o diretor científico do OM, que quer também melhorar a qualidade dos dados estatísticos sobre as migrações, o que dificulta comparações com outros países ou avaliar tendências.

“Há um problema de fiabilidade porque o conceito de partida não está ainda suficientemente maduro. Por vezes registamos estrangeiros, por vezes registamos imigrantes, e não são exatamente a mesma coisa”, afirmou, recordando que também existe “uma confusão entre a permanência por períodos mais longos de turistas e a permanência por períodos mais curtos de imigrantes”.

O dado que valida a condição de imigrante é o número de contribuinte português, “a partir do momento em que as pessoas estão integradas no sistema” e será essa a opção preferencial da análise.

“É por isso que é tão importante este momento inicial da regularização, porque, enquanto os imigrantes não estiverem regularizados, nós não conhecemos quem está no país”, concluiu Pedro Góis.

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