Em julgamento, inspetores do SEF negam responsabilidade pela morte de ucraniano

Miguel A. Lopes/LUSA

Da Redação
Com Lusa

O advogado da família do ucraniano Ihor Homeniuk considerou que “era esperado” que os três inspetores do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) acusados do homicídio do cidadão ucraniano em Lisboa negassem em julgamento a prática do crime.

“Era o expectável”, comentou José Gaspar Schwalbach, advogado da família de Ihor Homeniuk, à saída da Juízo Central Criminal de Justiça, no Campus de Justiça (Lisboa), onde neste dia 02 se iniciou o julgamento e no qual os três inspetores do SEF, já ouvidos pelo coletivo de juízes, negaram a acusação de homicídio.

Os inspetores alegaram que se limitaram a manietar um passageiro “agitado, violento e autodestrutivo”, que ficou mais calmo quando saíram da sala.

O advogado da família de Ihor Homeniuk, que morreu em 12 de março de 2020, numa sala do Centro de Instalação temporária do Aeroporto de Lisboa, que não se alongou em comentários aos jornalistas, dizendo apenas que o julgamento começou com a audição dos acusados, mas a audiência terá “desenvolvimentos”, pelo que há que “aguardar” pelas restantes inquirições.

Por seu lado, Ricardo Sá Fernandes, advogado do arguido Bruno Sousa, considerou que “não há nenhuma surpresa” no fato de todos os acusados terem negado a prática do homicídio, cabendo ao coletivo de juízes e a todos que estiveram presentes na sala de audiência “apreciar a consistência” daquilo que os acusados disseram em sua defesa.

Ricardo Sá Fernandes afirmou não ter nada contra o fato de as pessoas – sejam jornalistas, políticos ou cidadãos no geral – se pronunciem sobre os processos antes do trânsito em julgado da sentença, sublinhando que o problema não está em se pronunciarem sobre os casos judiciais, mas sim na forma e “como se pronunciam” sobre algo que ainda não foi julgado.

Em seu entender, neste caso em concreto – da morte de Ihor Homeniuk – houve um “coro nacional de afirmação” que os inspetores do SEF “torturaram e assassinaram o cidadão ucraniano” e isso “foi muito crítico”.

“Desde o princípio até aos dias de hoje que existe uma posição consensual na comunidade portuguesa praticamente sem exceção que estas pessoas [arguidos] torturam e mataram o cidadão ucraniano”, disse Ricardo Sá Fernandes, a propósito da questão de ter havido ou não um prévio julgamento na praça pública.

Segundo o advogado, a “verdade se fará em julgamento” e será com base nos “elementos que existem no processo” que se terá que fazer o escrutínio do que aconteceu.

“A partir do momento em que acham que eles (arguidos) aparecem como culpados, estão aqui a servir de `bodes expiatórios de uma situação que é de fato lamentável”, que foi a morte de Homeniuk, adiantou ainda Ricardo Sá Fernandes.

O advogado classificou a morte de Ihor Homeniuk e as circunstâncias envolventes como uma “situação absolutamente lamentável”, assumindo que o caso também o deixou “envergonhado enquanto português”.

Na sessão desta terça-feira, os três inspetores do SEF Luís Silva, Bruno Sousa e Duarte Laja, acusados do homicídio através da prática de “comportamentos desumanos”, causadoras de “graves lesões corporais e psicológicas” na vítima, apresentaram uma versão semelhante dos fatos, alegando que, quando chegaram à sala, Homeniuk, de 40 anos, apresentava algumas marcas “na cara e nos braços”, estava sentado num colchão e já estava “atado com fita adesiva nas pernas e nos pulsos”.

Todos disseram que encontraram o cidadão “bastante agitado”, mas que, quando foram chamados ao local, desconheciam que este já estava imobilizado.

De acordo com a versão, nos cerca de 20 minutos que os três funcionários dizem ter estado na sala, Homeniuk tentou pontapeá-los, tendo os inspetores usados primeiro fitas médicas para os pulsos e pés e depois algemas de metal.

O inspetor Luis Silva afirmou que decidiu deixar as chaves das algemas com o vigilante dizendo-lhe para libertar o cidadão “quando este estivesse mais calmo”.

Os acusados negaram ainda ter havido confrontos físicos com a vítima, afirmando que se limitaram a algemar Homeniuk, tal como a chefia lhes tinha pedido.

Os co-arguidos por homicídio qualificado negaram a acusação, segundo a qual Homeniuk terá sido agredido a soco e a pontapé e atingido com um bastão extensível, objeto que, contudo, Luis Silva confirmou ter adquirido.

O mesmo arguido negou também que tenha afirmado ao vigilante “isto não é para ninguém saber” e Duarte Laja recusou ter dito outra frase que consta na acusação: “Hoje já não preciso de ir ao ginásio”.

O julgamento dos arguidos, que estão em prisão domiciliária desde a sua detenção em 30 de março de 2020, continua na quarta-feira já com o depoimento de testemunhas de acusação.

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