Em discurso na ONU, Angola destaca desafios de paz e segurança na África

Foto ONU/Cia Pak

Representantes de países lusófonos Timor e Moçambique também falaram na ONU sobre clima e África.

 

Mundo Lusíada com ONUNews

O presidente de Angola, João Lourenço, realizou seu discurso na Assembleia Geral das Nações Unidas nesta quarta-feira. O chefe de Estado ressaltou desafios do continente africano, como a luta contra o terrorismo e a necessidade de financiamento para o desenvolvimento.

“A República de Angola tem procurado contribuir com a sua experiência em termos de construção da paz, da harmonia e da reconciliação nacional para a resolução de conflitos que assolam o continente africano, com especial ênfase para o que ocorre na República Democrática do Congo, onde acreditamos que se poderá construir uma base de confiança entre os beligerantes, que contribua para um abrandamento da tensão na região dos Grandes Lagos e conduza à tão almejada paz.”

No entanto, Lourenço mencionou que os esforços para conter a expansão do terrorismo e outras ações de desestabilização “implicam custos financeiros que nem sempre os países estão capazes de suportar.”

O líder angolano afirmou que é necessário “financiamento adequado, sustentável e previsível” para os esforços na luta contra o terrorismo no continente.

Nesse sentido, ele renovou o apelo à ONU, em particular ao Conselho de Segurança, para “utilização de contribuições fixas para operação de apoio à paz mandatadas pela União Africana.”

Lourenço citou ainda a “onda de mudanças inconstitucionais de poder protagonizadas por militares” na região do Sahel. Ele disse que “esses novos poderes não devem ser premiados” com a possibilidade de partilhar os palcos políticos internacionais.

O presidente afirmou que a falta de perspectivas que se observa em muitos dos países africanos no plano econômico e social, “cria um terreno fértil para a subversão e para a fragilização das democracias recentes.”

“Torna-se por isso urgente e imperativo que seja concedido apoio real ao desenvolvimento por via do financiamento em condições favoráveis para a construção de infraestruturas de produção e distribuição de energia eléctrica e de água potável, de vias de comunicação rodoviárias e ferroviárias, de saneamento básico, de construção de escolas, de hospitais, e outras e também no investimento privado direto nas economias africanas, para que África possa passar a ter uma contribuição maior na economia mundial.”

Para o presidente angolano, “o fosso entre os países em vias de desenvolvimento e os desenvolvidos, continua a ser uma realidade inaceitável.”

Ele mencionou como fatores que retardam a implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável a dificuldades de acesso a recursos financeiros e materiais e as condições impostos à transferência de tecnologia.

Lourenço saudou o secretário-geral da ONU, António Guterres, pelos esforços para reforma da arquitetura financeira mundial e estímulo aos ODS.

Moçambique e Agenda 2030

O presidente de Moçambique participou do primeiro dia de intervenções na ONU falando de paz e segurança, combate ao terrorismo, mudanças climáticas, transição energética, economia azul e conservação ambiental.

Filipe Nyusi iniciou sua fala dizendo que os líderes mundiais assumiram o compromisso de reduzir a pobreza em 17 áreas-chave. Porém, “o mundo continua a enfrentar várias crises interligadas que comprometem o alcance da Agenda 2030.”

“De fato, a crise pandêmica da Covid-19, os desastres naturais decorrentes das mudanças climáticas e os conflitos armados, incluindo o terrorismo e extremismo violento, fazem com que milhões de pessoas continuem a viver na pobreza, sem alimentação adequada, sem acesso aos serviços de saúde e educação.”

O líder moçambicano destacou “a ausência da confiança e solidariedade entre os que têm muito e aqueles que têm pouco ou quase nada” como a causa do insucesso da Agenda 2030.

Sobre a questão do terrorismo, Nyusi disse que ao mesmo tempo que Moçambique busca encerrar um capítulo do processo de paz e reconciliação nacional, “é confrontado com o fenômeno nefasto do terrorismo concretamente a província de Cabo Delgado, no norte do país.”

Ele citou a colaboração internacional e regional como fatores que estão contribuindo para o sucesso de esforços antiterrorismo, mas levantou a preocupação com a sustentabilidade das operações.

“Esta é a experiência pioneira de combinação de intervenção bilateral e multilateral. É também exemplo de solução de problemas africanos antes por próprios africanos. Contudo, a questão que se coloca é a necessidade de apoio substancial a estes países que de forma direta e interventiva combatem conosco o terrorismo em Moçambique de modo a tornar sustentáveis as operações ainda em curso.”

Ainda na questão da paz e segurança, o chefe de Estado disse que várias regiões do mundo “vivem o ciclo vicioso de conflitos e instabilidade armados sobretudo em África.”

Ele declarou que “são milhares de preciosas vidas que se perdem”. Segundo Nyusi, o número de refugiados e deslocados, aumentou em mais de 50% só no ano passado.

O presidente de Moçambique classificou as mudanças climáticas como “a principal crise da humanidade neste século.” Ele destacou que o país, devido a sua localização geográfica, “sofre ciclicamente o impacto devastador dos desastres naturais”.

Segundo Nyusi, os últimos maiores ciclones, Idai, Keneth e Freddy provocaram centenas de mortes e perdas e danos avultados na ordem de bilhões de dólares. “Até ao momento, não conseguimos recuperar, nem um terço dos danos registados”, disse.

O líder moçambicano sublinhou que a transição energética requer investimentos de elevados em projetos de geração de energia a partir de fontes limpas.

Nesse sentido, ele reforçou o pedido para que os países mais industrializados sejam solidários, incrementando o financiamento climático. Nyusi disse ainda que Moçambique aposta no desenvolvimento da economia azul para otimizar os recursos da extensa zona econômica exclusiva ao longo da costa de 2.700km.

Timor Leste pede atenção ao nexo entre clima e segurança

No terceiro dia de debates de Alto Nível na ONU, Timor-Leste compartilhou avanços e desafios na melhora de indicadores econômicos e sociais desde a independência do país em 2002.

Ao discursar na tribuna da Assembleia Geral da ONU nesta quinta-feira, o presidente José Ramos-Horta disse que a democracia timorense “tem evoluído viva e dinâmica.”

Ele classificou a nação como “multicultural, multireligiosa, multilíngue e multiétnica.” No entanto, o presidente citou desafios relacionados à pobreza e destacou as prioridades para os próximos cinco anos.

“Apesar de uma diminuição significativa da pobreza, a pobreza multidimensional é ainda elevada, situando-se nos 45,8%, e é ainda mais elevada entre crianças. Tirar o nosso povo da pobreza extrema, da insegurança alimentar, da mortalidade neonatal, do raquitismo, da subnutrição infantil, da prestação de cuidados às crianças e as mães são alguns dos desafios que estamos determinados a enfrentar de frente nos próximos cinco anos. Por esta razão, a desnutrição infantil e o acesso ao ensino pré-escolar são duas das nossas principais prioridades.”

Ramos-Horta informou que o país irá implementar uma política intersetorial de desenvolvimento da primeira infância em colaboração com o Fundo das Nações Unidas para Infância, Unicef. Ele reconheceu também que Timor-Leste tem “uma incidência elevada e inaceitável de violência doméstica.”

Para enfrentar o problema, o presidente timorense disse que o país está “dando passos significativos” na adoção de quadros legais alinhados com recomendações internacionais para igualdade de gênero e empoderamento das mulheres.

Em relação aos avanços alcançados nos últimos 20 anos, Ramos-Horta mencionou o aumento da expectativa de vida e ampliação de serviços que beneficiam a população.

O líder timorense afirmou que a nação asiática não depende de ajuda externa, pois financia o próprio orçamento nacional com recursos de um fundo soberano.

Ele disse que o mundo precisa de um novo olhar sobre o nexo entre clima e segurança, para lidar com os efeitos da mudança climática e da degradação ambiental na paz e segurança.

Segundo Ramos-Horta, o objetivo dessa abordagem deve ser o de “garantir que a transição energética não piore a situação de segurança em países vulneráveis e frágeis.”

Ele propôs uma iniciativa para “acelerar a transição energética justa em países em desenvolvimento frágeis, que dependem fortemente da produção de petróleo e gás, para prevenir turbulências e agitações.”

São Tomé e multilateralismo

O primeiro-ministro de São Tomé e Príncipe discursou quarta-feira, Patrice Trovoada destacou problemas estruturais e assimetrias que dificultam a realização dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, ODS.

O chefe de governo são-tomense enfatizou os desafios vivenciados por pequenos Estados insulares em desenvolvimento, como é o caso de São Tomé e Príncipe.

“O meu país, um pequeno Estado insular que goza de uma democracia efetiva há mais de 30 anos e que ainda está em desenvolvimento, é uma das principais vítimas das alterações climáticas, da degradação dos ecossistemas e da dependência econômica.”

Segundo Trovoada, o país vive “uma situação de verdadeira urgência econômica e financeira a curto prazo.”

Ele afirmou que apesar de alguns avanços em relação aos 17 ODS, os obstáculos incluem desafios estruturais e o fato de que “a falta de confiança nas instituições democráticas por parte das populações é cada vez maior.”

O primeiro-ministro afirmou que, para além dos discursos, os líderes das várias nações representadas na Assembleia Geral, deveriam questionar e reconhecer “as falhas em proteger o planeta e garantir a prosperidade partilhada até 2030.”

“Não devemos hesitar em apontar o dedo aos responsáveis pelas perturbações climáticas no seio do G20, ou aos órgãos de governação econômica mundial que continuam a ignorar os nossos objetivos sociais e ambientais, nomeadamente, negando-nos o acesso a recursos financeiros em quantidades e condições razoáveis.”

Ele disse que “os problemas de países pobres tendem a tornar-se também os problemas dos países ricos.” Dentre eles, as disparidades demográfica e econômica, a desregulamentação climática e a perda de confiança institucional.

Sobre paz e segurança, o chefe de governo disse que São Tomé e Príncipe fez uma “condenação da invasão da Ucrânia pela Rússia clara e sem hesitações, pois o país respeita o direito internacional e a Carta das Nações Unidas.”

Ele também citou com preocupação o fato de que “os golpes de Estado e as tentativas de subversão da ordem constitucional são cada vez mais frequentes.”

 

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