Em Cabo Verde, Antonio Costa enaltece lutadores pelas independências africanas

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Mundo Lusíada
Com Lusa

O primeiro-ministro inaugurou nesta quarta-feira o Museu do Campo de Concentração do Tarrafal, Cabo Verde, fazendo um discurso em que enalteceu os lutadores pelas independências africanas e defendeu a tese de que só é livre quem os outros liberta.

Numa cerimônia em que estiveram também presentes o primeiro-ministro de Cabo Verde, José Maria Neves, o dirigente histórico comunista Domingos Abrantes, os ministros Augusto Santos Silva e João Soares, bem como o presidente da Associação Nacional dos Municípios Portugueses, Manuel Machado, António Costa fez um paralelismo entre a luta pela liberdade em Portugal até ao 25 de Abril de 1974 e o combate pela independência das antigas colónias portuguesas.

“Nunca, mas nunca mais, novos tarrafais”, declarou o primeiro-ministro, numa alusão aos mais de trinta presos políticos que, entre 1936 e 1954, morreram neste campo de concentração do Estado Novo.

Perante antigos presos políticos, António Costa prestou homenagem ao líder histórico da resistência da Guiné e Cabo Verde, Amílcar Cabral – cuja data da sua morte é hoje assinalada em feriado nacional pelos cabo-verdianos – e referiu que “todos os povos têm momentos negros na sua História”.

“E uma das marcas mais negras da nossa História é, sem dúvida, o Tarrafal”, disse, antes de se referir à guerra colonial a partir do início da década de 1960.

“Só é verdadeiramente livre quem os outros liberta. Não era possível restaurar a democracia em Portugal sem libertar os povos colonizados”, sustentou o líder do executivo português, depois de, juntamente com o seu homólogo de Cabo Verde, ter deixado uma coroa de flores numa placa alusiva às vítimas do Tarrafal.

Nesta visita, quer o ministro da Cultura, João Soares, quer elementos do executivo cabo-verdiano, referiram-se ao papel desempenhado pelo pai do primeiro-ministro português, Orlando Costa, antigo militante comunista, na resistência ao Estado Novo.

Domingos Abrantes, com António Costa ao seu lado, definiu depois o Tarrafal como a prisão “mais sinistra do fascismo – e preservar esta memória é a melhor homenagem às vítimas do regime fascista”.

“Aqui, no Tarrafal, estiveram antifascistas portugueses, mas também lutadores africanos contra o regime. O Tarrafal é o símbolo dos povos oprimidos, colonizados e dos antifascistas portugueses, que tiveram uma luta comum contra a ditadura”, considerou o membro do Conselho de Estado.

Questionado se alguma vez pensou estar ao lado de um primeiro-ministro socialista, não só fisicamente, mas também do ponto de vista político, o dirigente histórico comunista respondeu: “Era difícil imaginar este dia de hoje, mas já estive ao lado de muitos socialistas”, disse.

Domingos Abrantes aproveitou mesmo para deixar um desafio a António Costa, dizendo esperar que, em termos de compromissos, “Portugal assuma as responsabilidades que tem em relação ao povo de Cabo Verde”.

Costa, por seu, turno, fez questão de frisar que já tinha trabalhado em conjunto com Domingos Abrantes, designadamente na musealização do Aljube, em Lisboa, onde, de resto, o dirigente histórico do PCP esteve preso.

A cerimônia no Tarrafal terminou com a interpretação de três temas por parte da Orquestra Clássica do Centro, que tem sede em Coimbra.

António Costa foi reconhecido nas ruas por vários populares, cumprimentou-os com simpatia e acabou o passeio com uma passagem pelo café Sofia, onde tinha à sua espera o seu homólogo, José Maria Neves, com quem bebeu uma cerveja.

Esta visita do primeiro-ministro ocorre já em ambiente de pré-campanha para as eleições legislativas de Cabo Verde, o que ficou bem patente nas conversas que teve com os líderes do MPD (Movimento para a Democracia, o maior da oposição), Ulisses Correia e Silva, e com a presidente do PAICV (Partido para a Independência de Cabo Verde, no poder) Janira Hopffer Almada.

Almeida Santos

O primeiro-ministro considerou ainda que o presidente honorário do PS, Almeida Santos, foi um “africano por opção” e um opositor do fascismo que compreendeu que a luta pela liberdade em Portugal era “gêmea” do combate ao colonialismo.

António Costa falava na Câmara do Tarrafal, na ilha de Santiago, no encerramento da sessão solene dedicada ao antigo ministro da Coordenação Interterritorial e de Estado, que faleceu na segunda-feira, com 89 anos.

Numa cerimônia que começou com um minuto de silêncio e que teve a participação de José Maria Neves, António Costa definiu o presidente honorário do PS como um cidadão que “nasceu e cresceu beirão” e que se apaixonou por África na primeira visita que fez a Moçambique como membro dos Orfeonistas da Universidade de Coimbra.

António Costa referiu-se também ao fato de na terça-feira ter sido questionado se interrompia a sua visita oficial a Cabo Verde para estar hpresente nas exéquias fúnebres do antigo presidente da Assembleia da República. “Penso que a melhor forma de o homenagear foi mesmo prosseguir esta visita”, rematou o líder do executivo português, já depois de o seu homólogo cabo-verdiano, José Maria Neves, ter salientado o contributo de Almeida Santos para a independência e democracia em Cabo Verde.

José Maria Neves referiu-se a Almeida Santos como “um homem maiúsculo, imprescindível e que lutou toda uma vida”. “O Tarrafal, que já simbolizou a barbárie e a perseguição, representa agora um traço de união entre os povos de Portugal e de Cabo Verde nas suas lutas pela liberdade”, acrescentou.

No segundo e último dia em Cabo Verde, António Costa teve como primeiro ponto do programa a deposição de uma coroa de flores no mausoléu de Amílcar Cabral, tendo depois seguido na companha do seu homólogo cabo-verdiano, José Maria Neves para a barragem de Figueira Gorda – uma obra construída e financiada por Portugal e que representou um investimento na ordem dos 3,7 milhões de euros.

Nesta deslocação a uma das quatro barragens da ilha de Santiago, António Costa ouviu a ministra do Desenvolvimento Rural de Cabo Verde, Eva Ortet, referir que o seu país tem um déficit hídrico avaliado em seis milhões de metros cúbicos.

“Em Cabo Verde, haver ou não água faz toda a diferença. Queremos transformar zonas de sequeiro e áreas de regadio”, disse a ministra cabo-verdiana, com o primeiro-ministro português a concordar, dando como exemplo o caso do Alqueva no Alentejo.

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