Cristina Branco trouxe mais Portugal para perto de nós

Em entrevista exclusiva ao Mundo Lusíada, a fadista atração principal do Dia de Portugal no Brasil, afirmou que entende a preferência da comunidade à músicas que recordam Portugal mas gostaria que também conhecessem o que se tem feito em Portugal ultimamente.

Por Eulália Moreno
Para Mundo Lusíada

Cristina Branco se apresentou acompanhada por Carlos Manuel Proença na viola, na guitarra portuguesa por Bernando Couto, no contrabaixo por Bernardo Moreira e no piano e acordeom por Ricardo Dias

A manhã gélida de sábadoem São Pauloapanhou Cristina Branco e a sua equipe desprevenidas. “Chegamos ontem e não contávamos com esta temperatura tão baixa. Já saímos agora de manhã para nos apetrecharmos”, diz com um sorriso quando nos recebe na entrada do Braston Hotel no centro da cidade.

No palco Cristina é bem mais alta do que a figura vestida de forma descontraída, sem maquiagem e que, de forma alguma aparenta a sua confessada idade de 40 anos. Tem os olhos escuros, as mãos expressivas, gestos largos que acompanham as palavras, e o cabelo que teima em lhe cair no rosto.

“Vamos conversar? Onde está hoje o seu coração?”, pergunto. “Em Almeirim, a terra dos melões, onde nasci. Lá estão os meus dois filhos, o Martim e a Margarida, à minha espera. O mais difícil na minha carreira é separar-me deles, quando eram mais pequenos, eu os levava comigo mas agora já não é possível. Sou uma mãe-galinha, é difícil ficar longe deles”.

Casada com o jornalista Tiago Salazar, escritor e apresentador do programa “Endereço Desconhecido” na RTP2, é a segunda vez que Cristina Branco atua no Brasil. “Esta nossa digressão Fado –Tango Tour está relacionada ao meu último trabalho discográfico Não há só Tangos em Paris e além da Casa de Portugal nos apresentaremos em Brasília, a convite da Embaixada de Portugal e do Instituto Camões, no Teatro Ulysses Guimarães  e a seguir noLa Trastiendade Buenos Aires, Argentina e no Teatro Solis, em Montevidéu, Uruguai”, diz Cristina. E para essas apresentações veio acompanhada por Carlos Manuel Proença na viola, na guitarra portuguesa por Bernando Couto, no contrabaixo por Bernardo Moreira e no piano e acordeom por Ricardo Dias além de Mario Pereira como técnico de som.

Decorria o ano de 1990 quando o avô materno lhe ofereceu um álbum de Amália Rodrigues, “Rara e Inédita”, o que acabaria por despertar a sua atenção para a música portuguesa. “Antes disso, como ouvinte, estava mais próxima de Billie Holliday, Ella Fitzgerald, Janis Joplin e Joni Mitchell e poucos meses antes de pisar um palco pela primeira vez, em Amsterdã, na Holanda, nunca me tinha imaginado sequer uma intérprete amadora”, confessa.

Essas suas  apresentações de estreia  em 25 de Abril de 1996 acompanhada na guitarra portuguesa por Custódio Castelo e Alexandre Silva na viola, numa edição de mil exemplares “Cristina Branco Live in Holland”, que se esgotou rapidamente e teve edições sucessivas.

No total Cristina Branco tem 11 álbuns editados desde 2001 pela Universal Classic, o último deles este Não há só Tangos em Paris, um disco de memórias, viagens ou simplesmente flashes da sua vida. Na triangulação Buenos Aires-Paris-Lisboa, as referências são os poemas de Manuela de Freitas, Vasco Graça Moura, António Lobo Antunes, Carlos Tê e Miguel Farias, e as músicas de Mário Laginha, João Paulo Esteves da Silva, Pedro Silva Martins, Pedro Moreira. “Há um quê de Emigração nesse meu trabalho. Carlos Gardel o grande nome do Tango era francês e emigrante na Argentina. Encontro semelhanças entre Tango e Fado, uma masculina, a outra feminina. Talvez também por isso casem-se tão bem. Lisboa e Buenos Aires são cidades semelhantes, os portos, os rios que as banham”, explica.

A carreira de Cristina passa pelo resgate da música tradicional portuguesa, dos seus grandes autores e por muitas inéditas de jovens compositores. “As minhas referências, filha já de pai e mãe com profissões liberais, pós 25 de Abril, são os grandes nomes da poesia e da música portuguesa, minhas referências também passam pelo Fado, fui convidada diversas vezes para me apresentar no Museu do Fado, participei em todo esse processo do Fado-Patrimônio Imaterial da Humanidade mas não me vejo apenas a cantar Fado, considero-me uma intérprete de música portuguesa onde todas as vertentes tem o seu espaço. De algumas gosto mais, de outras menos”, afirma Cristina acrescentando não permitir-se concessões na escolha do repertório que leva aos vários palcos do mundo.

A sua apresentação até agora inesquecível foiem São Tomée Príncipe, em 2000. “Apresentei-me na Igreja de N.Sra. das Neves, num espaço rústico, sem iluminação pública e a população local acendeu tochas para iluminar a estrada de terra que levava a igreja. Esse espetáculo foi gravado e transmitido pela RTP e a lembrança daquelas luzes me emociona até hoje”.

A fadista em entrevista exclusiva ao Mundo Lusíada antes do show em São Paulo.

“Não sou uma cantora para as Comunidades se é que podemos definir uma categoria para isso. Sinto em alguns países que as nossas Comunidades ainda não estão muito abertas para as novas propostas musicais. Entendo perfeitamente que gostem de ouvir músicas que os façam recordar o Portugal que deixaram há tantos anos mas gostaria que também ouvissem e conhecessem o que se tem feito em Portugal ultimamente.  Por isso fiquei muito feliz pelo convite da Casa de Portugal e na Embaixada de Portugal e do Instituto Camões aqui no Brasil no sentido de me permitirem apresentar o melhor que tenho feito nestes meus 16 anos de carreira. Considero-me uma divulgadora da cultura portuguesa, sou como um fio condutor, interessa-me o que as pessoas levam para casa depois de um espetáculo meu, preocupo-me em passar-lhes a mensagem da minha verdade m palco. Não gosto que me vejam distante, não sou de plástico, gosto de estar perto das pessoas”.

E perto das pessoas esteve Cristina Branco num espetáculo inesquecível que assinalou as comemorações do 10 de Junho, Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas na Casa de Portugal de São Paulo que num fim de tarde de domingo reuniu aproximadamente 350 pessoas para ouvi-la para a seguir confraternizarem e saudarem Portugal com um “Porto de Honra” sóbrio  como os tempos difíceis que atravessamos recomendam, sem contudo perder o requinte de tudo o que se faz na Casa-Mãe de todas as Associações Luso-Brasileiras.

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