Da Redação
Com Lusa
Cidadãos oriundos de outros países têm agora a vida mais complicada em Portugal devido à covid-19, mas alguns elogiam o modo como o país tem reagido à pandemia, havendo mesmo quem registe melhoria nas suas atividades.
Peter Wilton-Davies e Helen Gray, de 51 e 45 anos, estão há 10 anos fora da Inglaterra e realçam as vantagens de viverem na Serra da Lousã, no concelho da Castanheira de Pera, no distrito de Leiria.
“Estamos muito felizes por estar em quarentena em Portugal e não noutras partes do mundo. O povo português foi muito cuidadoso e atencioso e começou o isolamento antes de ser transformado em lei”, declara Peter.
Para o casal, o isolamento “é mais difícil para as pessoas nas cidades”, enquanto “no campo a vida continua” sem grandes perturbações.
“Fico feliz por estar aqui e não no Reino Unido, onde as condições e restrições não são tão boas”, acrescenta.
Peter Wilton-Davies, que na terra Natal exercia a profissão de artista gráfico, tem optado por comprar frutas e vegetais numa quinta das proximidades.
Helen trabalha nas áreas do marketing e da angariação de fundos.
Por razões profissionais, ia frequentemente a Londres, viagens que está agora impedida de fazer.
“O meu trabalho aumentou muito nas últimas semanas devido à criação de conteúdos ‘online’ (…) e à criação de vídeos educativos e divertidos para crianças e adultos”, afirma à Lusa.
Enquanto trabalha à distância para uma instituição de caridade britânica, a sua vida “não mudou muito”.
“Levo os cães a passear (…) e há entregas diárias de pão e vegetais nas aldeias”, refere Helen Gray, indicando que faltam bens essenciais nas lojas.
O casal admite que as suas aptidões na língua de Camões e Saramago estejam “um pouco enferrujadas” nos últimos tempos.
“O Peter não tem visitado o centro social da aldeia de Pera, onde faz parte da equipa de voluntários” que gere a associação, explica Helen, que também “não pode ir à aula semanal de Português”.
Desejando que Portugal “possa retomar a vida normal”, Helen e Peter esperam “mudanças e lições” após a pandemia, com “respeito pelos outros e menos consumismo”.
O belga Aaron Vansant, de 32 anos, veio ainda criança para Oliveira do Hospital, onde trabalha numa empresa familiar que comercializa espargos e sementes diversas, incluindo de variedades agrícolas autóctones.
Em março, já em pleno estado de emergência, nasceu a bebé Laura, sua primeira filha.
A esta alegria dos Vansant junta-se a evolução favorável dos negócios, que Aaron promove com o pai e o irmão, Peter e Micha.
“A pandemia afeta a nossa atividade pela positiva”, adianta à Lusa.
As pessoas “procuram manter-se ocupadas na horta e no jardim”, além de recearem eventuais falhas no acesso a alimentos vegetais, explica.
“É um fenômeno que já tínhamos visto na crise de 2008. Depois, volta tudo ao mesmo, infelizmente”, prevê o produtor.
A empresa importa sementes e exporta alguns produtos para Angola e Bélgica.
O publicitário luso-brasileiro Leonardo Simões, com raízes remotas na Serra da Lousã, reside em Coimbra. Nasceu no Brasil, há 33 anos, e veio com os pais, irmã e a tia para a Lousã, onde estes familiares se instalaram em 2019.
“Tive um ótimo acolhimento por parte da comunidade portuguesa. Não tenho nada a apontar, por cá fiz muitos amigos e parceiros de negócio”, congratula-se.
Já em termos profissionais, sofreu “um impacto negativo, porém controlado”, na sequência das restrições associadas à covid-19.
“Alguns clientes pediram-me para encerrar temporariamente a prestação de serviços de marketing digital por causa da crise”, acrescenta, ao ser questionado pela Lusa.
No entanto, através de teletrabalho, continua a prestar serviços para clientes no Brasil e em Portugal, “com a mesma qualidade ou até mesmo superior”.
Leonardo, que passa quase “todo o tempo em casa”, com namorada portuguesa, já sente “a falta das atividades ao ar livre”.
“O primeiro impacto que sofri foi o corte de um financiamento por parte dos bancos portugueses. Estava a negociar a compra de um apartamento, mas tive de adiar”, revela o também programador informático.
Na sua opinião, será necessário “aprender com o que está a acontecer, para haver mais preparação para o futuro”.
O alemão Detlef Schafft, de 65 anos, está há quase 40 em Portugal.
É ator, palhaço e músico, desenvolvendo o seu trabalho na Lousã, na Companhia Marimbondo, fundada há 30 anos.
Em 2019, Detlef e Eva Cabral criaram o Museu do Circo Momo, numa parceria com a Câmara.
“O museu está fechado, uma vez que é um espaço municipal. Continuam as aulas de ioga ‘online’”, só que a companhia tem “todos os espetáculos cancelados”, nalguns casos até agosto.
Esta situação “foi um banho de água fria” para a Marimbondo.
“Íamos continuar com muitas atividades no Momo e tivemos de cancelar concertos e espetáculos”, além da participação em festivais internacionais, na Alemanha e na Finlândia.
Detlef rejeita algumas restrições impostas pelo estado de emergência.
“Nem na rua podemos tocar para animar as pessoas”, critica.
O artista insurge-se ainda contra o modo “como está a ser tratada a cultura”.
“Em especial o circo, que mais uma vez não recebe apoio nenhum do Estado. Vai ser um ano destruído. O nosso trabalho depende completamente da interação com as pessoas e muitos projetos nem irão ser estreados”, conclui Detlef Schafft.