Situação de desespero provoca divulgação de carta de funcionário diplomático do Rio

Com salários congelados há oito anos, Valdeir Pinho Carvalho diz que “situação é lamentável e desumano”, problema se estende por todo o Brasil

Mundo Lusíada

O Mundo Lusíada recebeu uma carta do Assistente Técnico Valdeir Pinto Carvalho, do Consulado de Portugal no Rio de Janeiro, que é um verdadeiro desabafo em tom de desespero e na qual o funcionário expõe a situação vergonhosa pelo que passam os muitos funcionários diplomáticos que trabalham nos vários consulados portugueses pelo Brasil.

A divulgação abre feridas expostas justamente numa altura em que o Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) anuncia abertura de concurso para 102 vagas em embaixadas, missões e postos consulares portugueses, incluindo uma vaga para a Embaixada em Brasília, e uma em cada localidade, no Consulado Geral de Portugal em São Paulo, no Consulado Geral em Salvador, e no Consulado português de Belo Horizonte.

Apesar da indignação e do descaso por parte de autoridades e até de lideranças sindicais, e apesar das recentes promessas de avanços nas negociações, concretamente nada avançou.

Ainda assim Valdeir diz que “mesmo não concordando plenamente com essa longa espera de mais de oito anos para conclusão das negociações entre o STCDE e o MNE, temos de apoiar totalmente o nosso Sindicato e lutarmos juntos pelas nossas reivindicações atuais e futuras, porque sem o STCDE e nossa união, não conseguiremos lograr êxito na nossa causa”.

Na verdade a decisão do funcionário de expor suas realidades e de muitos colegas, foi uma tentativa desesperada de chamar a atenção das autoridades portuguesas competentes neste assunto, para se sensibilizam com a atual situação salarial e efetivamente resolverem a situação dos empregados.

“Quero ressaltar, que me sinto envergonhado e humilhado, por ter de expor minha vida pessoal dessa forma, mas não vejo outra solução, cansei de esperar e sofrer calado à espera de um acordo definitivo entre o STCDE e o MNE, para colocar um ponto final nisso”, diz ele completando que “todos precisam saber da calamidade financeira que a grande maioria de nós, funcionários dos Consulados de Portugal no Brasil estamos passando, devido aos nossos salários estarem congelados há mais de oito anos ao câmbio de R$ 2.638 [atualmente o euro no Brasil já passa de R$ 6,20] por falta de boa vontade política de alguns membros do Governo Português em resolver a nossa situação”, diz Valdeir.

A CARTA

Carta de desabafo e pedido de socorro

(“)
Quero aproveitar essa oportunidade para escrever algumas palavras, vou mencionar a realidade financeira, que se encontram a maioria dos funcionários dos Consulados de Portugal no Brasil, devido ao congelamento dos salários desde 2013.
É lamentável e desumano, a situação financeira que estamos passando, com os salários congelados há mais de oito anos, vivendo em um país onde a inflação oficial não é a real e o sistema de segurança, saúde e educação pública, são deficientes.
Será que as autoridades portuguesas sabem o que é viver em situação de desespero e calamidade financeira, conforme a maioria de nós, funcionários dos Consulados Portugal no Brasil, estamos vivendo neste momento?
Devido a tudo isso, vou fazer um breve relato da minha vida pessoal e atual situação financeira que estou vivendo, que também, é a de muitos colegas de trabalho.
– Hoje estou morando em uma casa mais humilde e pagando aluguel, porque fui obrigado a vender a minha casa própria para poder pagar dividas e conseguir sustentar a minha família.
– Vendi o meu carro novo e comprei um mais velho, de menor valor, para sobrar dinheiro e custear minhas despesas pessoais.
– Tirei o meu filho da escolar particular de excelente ensino e coloquei em uma escola pública, porque não tenho nesse momento, condições de pagar escola particular para ele.
– Cancelei o meu seguro saúde e o da minha família, porque com o salário atual, não tenho condições de arcar com os seus custos.
– Minha filha tem problema sério de saúde (anemia) e está há três meses aguardando na fila do INSS para ser atendida no hospital público, porque as consultas e exames particulares são caros.
– Eu tenho um problema grave de saúde, sou obrigado a fazer tratamento em hospital público, enfrentando longas filas de espera para ser atendido e recorrer a farmácia popular, da Clinica da Família, para pegar os meus remédios gratuitos, graças a Deus, que o Governo brasileiro, ainda fornece gratuitamente, porque se eu tivesse de comprar, já teria morrido, devido o valor altíssimo dos medicamentos.
– Lazer com a minha família, não existe há mais de oito anos. Quando os meus filhos me chamam para uma atividade de lazer ou mesmo para almoçar em algum restaurante, sou obrigado a dizer com o coração partido que vou comprar um frango assado na padaria da esquina, e almoçamos juntos em casa, porque não tenho dinheiro sobrando para lazer com a família. Eu e minha família somos privados de muitas outras coisas que gostaríamos de fazer, mas com o salário congelado, não sobra dinheiro no final do mês, muito pelo contrário.
Com base no exposto, pergunto às autoridades competentes e responsáveis pelos nossos salários, se isso é digno de um funcionário que sempre colocou o trabalho acima de tudo, trabalhando há mais de trintas anos no Consulado Geral de Portugal no Rio de Janeiro, com competência, responsabilidade e total dedicação ao seu emprego, inclusive, nas Permanências Consulares, que executa desde 2012, quando foi inaugurada aqui no RJ?
Nós, funcionários, estamos envelhecendo precocemente por causa do estresse gerado pela falta de dinheiro e de lazer, ficando com problemas psicológicos, sem perspectivas de vida e totalmente desmotivados para a vida, por causa dessa situação salarial atual.
Somos todos cumpridores rigorosos dos nossos deveres e obrigações, sempre com responsabilidade e competência, apesar de estarmos trabalhando sob muita pressão.
Peço desculpas, pelo meu desabafo e conto com a compreensão e a dedicação das autoridades competentes para resolver a nossa situação de calamidade salarial, para que possamos ter, enfim, o retorno da nossa dignidade e orgulho de trabalhar para o Estado português. (”)

Valdeir Pinho Carvalho
Assistente Técnico

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