Portugal tem falhado na relação com comunidades de lusodescendentes na Ásia – Governo

Da Redação com Lusa

 

O secretário para as Comunidades Portuguesas declarou nesta quinta-feira que Portugal não tem feito “praticamente nada” na relação com algumas comunidades de lusodescendentes da Ásia e defendeu que Macau pode ajudar a estabelecer esses contatos.

Malaca (Malásia), Sri Lanka, Goa, Damão e Diu (Índia), Myanmar (antiga Birmânia), Japão ou Tailândia são alguns dos exemplos de países ou regiões com comunidades de lusodescendentes que Portugal, de acordo com José Cesário, não tem conseguido alcançar.

Pela Ásia, “há diversíssimas comunidades e com as quais Portugal, verdadeiramente, tem feito muito, muito, muito pouco”, disse o responsável aos jornalistas em Macau, em visita de três dias.

“Em termos institucionais, praticamente nada. Há um estudioso ou outro, um acadêmico ou outro, um investigador ou outro, um jornalista ou outro, que de vez em quando e tal faz um artigo, um trabalho, uma coisa. Agora, não há uma continuidade de trabalho”, reforçou.

José Cesário recorreu a Malaca, para exemplificar como algumas destas “comunidades isoladas” preservam tradições antiquíssimas “sem a mínima atenção e incentivo”.

“Eu visito o bairro português, o ‘settlement’, como se diz, encontro lá o [lusodescendente] Papa Joe a tocar, a cantar o Malhão em português, e eles dançam, e têm os trajes folclóricos, e têm o galo de Barcelos (…). Ninguém fala português, mas isso é normal, aqui [em Macau] também. Mas fazem aquilo tudo de acordo com a tradição de há centenas de anos, sem o mínimo acompanhamento”, reforçou.

Para chegar a estas comunidades e colocá-las em rede, com Portugal e entre elas, Cesário defendeu que, do lado do Estado, é necessário “encontrar uma entidade” que consiga estabelecer uma “relação desejavelmente continuada” e fazer “um trabalho a prazo”.

Depois, do lado da sociedade civil, sugeriu o secretário de Estado, o trabalho pode partir de entidades “disponíveis para trabalhar com o Estado na realização de alguns projetos em concreto”.

Neste sentido, Macau pode ser o “melhor local” para realizar este projeto, considerou, referindo ter abordado “este facto que preocupa” com algumas pessoas, nomeadamente responsáveis do Instituto Internacional de Macau, da Associação Promotora da Instrução dos Macaenses e da Fundação Oriente.

“O que eu disse a algumas pessoas foi para pensarem em algumas atividades que possamos fazer com eles, e ver se conseguimos agora, nestes próximos meses, no contexto dos apoios que nós normalmente concedemos ao movimento associativo (…), se conseguimos encontrar algumas atividades que se dirijam especificamente a esta comunidade”, indicou.

José Cesário notou também que há comunidades com as quais é mais complicado trabalhar, notando, por exemplo, ser “muito mais difícil identificar” a comunidade lusodescendente em Myanmar, país que é palco de um conflito armado.

A Associação Internacional dos Lusodescendentes (AILD) tem denunciado, nos últimos anos, “o genocídio” em curso de milhares de lusodescendentes católicos (bayingyis) em Myanmar, que se tem traduzido em destruição, mortes e refugiados.

De acordo com o diretor-geral para a Ásia/Pacífico da AILD, Joaquim Magalhães de Castro, a comunidade de lusodescendentes em Myanmar existe há mais de 400 anos, resultando de casamentos feitos entre locais e portugueses, muitos deles mercenários.

Jovens

Em Macau, Cesário ainda lamentou o fraco envolvimento de jovens no movimento associativo das várias comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo, defendendo a importância da atuação dos mais novos.

“Também senti [em Macau] que é muito importante encontrarmos forma de despertar, de mobilizar alguns novos quadros, particularmente lusodescendentes e mais jovens, que se possam envolver na vida comunitária”, disse o secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, que finalizou hoje uma visita de três dias à região semiautônoma chinesa.

A dificuldade em atrair as camadas mais jovens para participarem na vida da comunidade, explicou o secretário de Estado, prende-se com “uma diferença de postura, em termos culturais, das novas gerações em relação ao associativismo”.

“Por exemplo, nós temos fluxos migratórios por muitos países hoje onde não há uma única estrutura associativa. São comunidades que primam pelo individualismo e por outras formas de aproximação uns com os outros, que não são as tradicionais”, indicou.

Em países como a Noruega, Dinamarca, Emirados Árabes Unidos ou muitas zonas do Reino Unido, exemplificou o responsável, “não há associações” e “muitas pessoas nem sequer contactam, o que as torna mais frágeis, no caso de haver um problema”.

Em consequência, também é mais difícil por parte das autoridades chegarem a estes grupos.

“Como é que nós conseguimos definir um plano, por exemplo, de permanências consulares num local destes, se nós não temos pontos de encontro com a comunidade? Se nós não sabemos onde é que ela está? Isto é um problema seríssimo”, considerou.

No caso de Macau, o responsável, que ocupa pela quarta vez o cargo de secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, traça um cenário otimista, com “mais gente, mais nova”, nas instituições que contactou durante a visita.

No entanto, há que repensar o futuro das estruturas da comunidade, declarou, considerando este um “problema de fundo” transversal a todas as geografias onde está estabelecida a emigração portuguesa.

José Cesário termina hoje uma visita de cinco dias à região, que incluiu ainda uma passagem por Cantão, na província chinesa de Guangdong, e Hong Kong.

Deixe uma resposta