Governo recusa repor manifestações de interesse para regularizar imigrantes

Da Redação com Lusa

 

O secretário de Estado da Presidência, Rui Armindo Freitas, afirmou hoje que o Governo português não tenciona recuar e autorizar as manifestações de interesse, reclamadas pelas associações de imigrantes desde junho, e que organizaram nesta sexta-feira uma manifestação.

As manifestações de interesse eram um recurso jurídico, extinto em junho, que permitia a um estrangeiro regularizar-se com 12 meses de descontos, mesmo que tivesse entrado com visto de turista.

O Governo “não admite” repor esse mecanismo, porque “a manifestação de interesse era o caminho para a indignidade” e “atirava para a indignidade todos os que vinham pelas rotas ilegais”, afirmou hoje o governante, em entrevista à Antena 1.

Depois, segundo o governante, os imigrantes que pediam esse recurso “eram explorados muitas vezes e continuavam a ser até no mercado de trabalho porque era criada uma ficção de regularização sem qualquer tipo de ordem ou de organização”.

Esse mecanismo contribuiu para “o volume brutal de pendências que este país acumulou”, cerca de 400 mil, afirmou Rui Armindo Freitas, salientando que, com o fim da manifestação de interesse, no início de junho, e daquilo que classificou como efeito de chamada, existe uma “redução em 80 por cento” dos pedidos de residência.

Antes, os serviços recebiam cinco mil pedidos de regularização por semana, explicou Rui Armindo Freitas, reafirmando a vontade do executivo de privilegiar os imigrantes da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) em relação aos demais.

“Há uma opção clara de discriminação positiva da CPLP”, que é “um espaço comum, com países com os quais Portugal já tem acordo de mobilidade”, explicou.

Em agosto, começou a funcionar uma estrutura de missão para regularizar os processos pendentes e este serviço está a “atender ao dia de hoje 2.300 pessoas por dia”, em 14 concelhos do país, mas remeteu para mais tarde um balanço.

“As pessoas quando lá vão não ficam automaticamente regularizadas, é o início de um processo” que irá depender do parecer final dos serviços.

Coletivo de Imigrantes

Um coletivo de 57 associações de imigrantes juntaram se hoje em frente à Assembleia da República para pedir o regresso das manifestações de interesse como forma de assegurar a regularização de estrangeiros.

E uma comissão representativa das associações de imigrantes foi chamada a uma reunião com a vice-presidente do órgão, Teresa Morais.

A comitiva juntou representantes das associações Solidariedade Imigrante, Olho Vivo e Renovar a Mouraria, entre outras, que organizaram a manifestação que junta algumas centenas de imigrantes em protesto a pedir ao Governo que recue nas alterações à lei dos estrangeiros.

“Somos todos imigrantes”, “eu existo com ou sem visto” ou “residências para todos, documentos para todos”, foram algumas das palavras de ordem dos manifestantes que contaram com uma muito baixa representação das associações de imigrantes brasileiros, a maior comunidade do país.

Esta divisão no movimento associativo resulta, segundo Timóteo Macedo, dirigente da Solidariedade Imigrante – a maior do país – da “política segregacionista” do Governo que dá prioridade aos imigrantes da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e “fecha a porta a todos os outros”, como “se existissem imigrantes de primeira e de segunda”.

Nos cartazes distribuídos podiam ler-se frases como “rico tem dispensa de visto, pobre não”, “sem imigrantes não há futuro, manifestação de interesse sim”, “aqui vivo, aqui fico, não vou embora” ou “não somos descartáveis, a expulsão não é solução”.

Em declarações à Lusa, o presidente da Associação Solidariedade Imigrante, Timóteo Macedo promete lutar pelos direitos dos mais frágeis, essenciais para a economia portuguesa, como referem várias associações empresariais.

“A extrema-direita está a crescer em Portugal e na Europa, com o apoio do Pacto Europeu [da Migração e Asilo], que foi aprovado também por muitos deputados” portugueses e assiste-se a uma tendência protecionista, desde o “fecho de fronteiras na Alemanha” à construção de “centros de detenção de imigrantes fora do espaço da UE”.

Esta tendência corresponde a “ciclos que se repetem”, mas “a extrema-direita não tem terreno” em Portugal: “Vamos fazer combate, vamos fazer-lhes frente”, disse Timóteo Macedo, que acusa os movimentos populistas de violarem a própria moral ocidental que dizem defender.

O objetivo final do coletivo de 50 associações que promovem a manifestação é “o retomar de um processo que regularize de uma forma permanente” as pessoas que estão a trabalhar e a contribuir em Portugal, em vez de “soluções excepcionais para alguns”, como o que sucedeu com desportistas ou outras categorias de imigrantes.

O deputado do Livre Paulo Muacho reuniu-se hoje com os imigrantes, e defendeu que esse “mecanismo ainda que tivesse problemas na sua implementação prática permitia às pessoas chegarem a Portugal, começarem a fazer os seus descontos e estarem numa situação que não é de irregularidade, não é de falta de documentação”, afirmou Paulo Muacho ao fundo da escadaria do parlamento.

“O Governo entendeu ceder à retórica da extrema-direita na imigração, ceder à pressão do Chega, usar este tema de uma forma que consideramos populista e condenável”, afirmou Paulo Muacho.

Atualmente há “milhares de pessoas que estão no limbo, sem saberem o que lhes vai acontecer, a continuarem a trabalhar todos os dias, sem terem a certeza do estado português se terão um documento ou segurança”, disse o deputado do Livre, recordando que sem as manifestações de interesse o país terá de regressar às “regularizações extraordinárias”, porque “as pessoas vão continuar a vir”.

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