Da Redação com Lusa
A 91ª Feira do Livro de Lisboa abriu nesta quinta-feira, com leitores interessados nos preços reduzidos e editores confiantes, mas cientes de que o certame não vai salvar o último ano e meio, que foi “negro” para o setor.
Paulo Gonçalves, dos grupos Porto Editora e Bertrand/Círculo, questionou a possibilidade de uma recuperação econômica, “por muito positiva que seja a feira”, em termos de volume de negócios, depois do “quadro negro” em que o setor editorial se encontra, agravado pela situação pandêmica.
Todavia, os dois grupos editoriais “encaram esta edição com bastante entusiasmo e uma expectativa positiva”, disse Paulo Gonçalves, explicando que “entendem a Feira do Livro como uma oportunidade única de promover os contatos entre os escritores e os leitores, tendo o livro como razão para esse encontro”.
Gonçalves estima as perdas do setor do livro entre 15% e 20%, uma situação “mais sentida num país como [Portugal], onde se tem muito a fazer em termos de política do livro e de incentivo à leitura”
Relativamente à aplicação do programa IVAucher aos livros, Paulo Gonçalves lamentou o atraso da decisão, mas afirmou “que qualquer estímulo é muito importante, desde que se compre”.
Desde 01 de junho, e até 31 de agosto, os consumidores já podiam acumular IVA de despesas de alojamento, cultura ou restauração, para descontá-lo em novos consumos nesses setores até ao final do ano.
Na semana passada, o Ministério das Finanças revelou que as faturas das lojas de discos e editoras de livros também vão contar para o IVAucher.
Para Tiago Gonçalves, frequentador assíduo da Feira do Livro, este programa “pode ser um incentivo à leitura, principalmente, para quem não compra tantos livros”, tanto mais que apoia “um setor tão fragilizado economicamente”.
Tiago Gonçalves faz mais que uma visita à feira: “Uma primeira, de reconhecimento, e uma outra para aproveitar as últimas promoções”.
Outra visitante, Sara Moreira, residente na região Norte, visita a Feira de Lisboa pela primeira vez, “para ver as oportunidades”, procurando essencialmente ficção e biografias.
Celestina Fernandes, da Nova Vega Editora, espera que a feira deste ano “seja melhor que a do ano passado e que o público regresse com todas as devidas precauções”, mas não deposita esperanças no IVAucher que considera não fazer “grande diferença”.
Já a ex-professora Sílvia Salazar é habitual visitante da feira e fã de Ken Follett, chamando a atenção para “a grande importância do contato com o livro pelos mais novos, “mesmo pequeninos”. A visitante desconhecia o programa IVAucher, mas considerou “uma medida positiva”.
A maior festa do livro realizada em Portugal segue até 12 de setembro em Lisboa. Durante as próximas semanas, espera-se a visita de centenas de milhares de pessoas à procura dos seus livros e autores preferidos, saber das novidades e aproveitar as promoções.
Entre escritores com presença confirmada, estão os portugueses Miguel Sousa Tavares (com novo romance), José Luís Peixoto, André Carrilho, Bruno Vieira Amaral, Francisco Louçã, Manuela Gonzaga, Mário de Carvalho e Teolinda Gersão, além do cubano Leonardo Padura, a espanhola María Dueñas, os brasileiros Dulce Regina e Laurentino Gomes e o angolano José Eduardo Agualusa, nomes bem conhecidos dos leitores portugueses.
No Porto
Já nesta sexta-feira, no primeiro dia da Feira do Livro do Porto, a expectativa para livreiros e editores é de que a edição de 2021 seja, pelo menos, tão boa como a de 2020, que serviu para aguentar o ano.
Ainda antes da abertura, já se formava fila para entrar no recinto da Feira do Livro do Porto, que se realiza até 12 de setembro, nos Jardins do Palácio de Cristal.
À espera para entrar estava Hugo Salvador, que aproveitou para ir cedo e procurar alguns achados.
“Tenho uma lista mental e, se vir alguns dos que quero a um preço acessível, talvez compre. Depende do dia e da loucura que estiver o dia”, conta à Lusa, entre risos.
Mais tarde, Hugo Salvador revelava ter comprado, pelo menos, livros, numa altura em que ainda ia dar “mais uma vista de olhos”.
Equipados com camisetas da saga “Harry Potter”, Paulo Cardoso e a família também aguardavam para ver o que os esperava do outro lado do pórtico.
A indumentária não é indicativa das intenções de compra, porque já têm todos os livros da coleção, mas Paulo adianta que gosta “de livros de fantasia e há uma ou duas editoras que têm esse tipo de livros”.
“Estou à procura de encontrar bons preços. O resto da família veio acompanhar-me”, disse à Lusa.
Para os livreiros, a esperança é que a edição deste ano seja tão boa como a anterior.
Arnaldo Vila Pouca, da livraria Flâneur, diz que as “expectativas não divergem muito do ano passado”.
“Em tempo de pandemia, o ano passado colocamos as expectativas um bocadinho abaixo do que seria o desejado, mas a verdade é que foram largamente superadas. Este ano, gostaríamos que acontecesse o mesmo, ainda que tenhamos consciência que é difícil, porque passamos um período financeiramente mais complicado para muitas famílias”, confessa.
Embora admita que “o último ano não foi difícil”, Vila Pouca reconhece que, “para livrarias com uma dimensão como a Flâneur”, a Feira do Livro “é a almofada para o resto do ano”.
Também Carla Oliveira, editora da Orfeu Negro e sócia-gerente da Antígona, quer ver replicados os resultados de vendas de 2020.
Para a editora, a iniciativa serve para vender, mas “é também para partilhar e para conviver com os outros colegas, e a Feira do Porto é particular nisso, porque tem muitas livrarias representadas”.
A responsável destaca a oportunidade de ter “contacto direto com os leitores”, mas também a de promover autores.
Para a Antígona e a Orfeu Negro, 2020 trouxe “resultados melhores do que no ano anterior”, fruto de “muito trabalho e muita estratégia”, diz Carla Oliveira.
O mesmo não aconteceu na livraria Poetria, para quem 2020 “foi um ano muito difícil”, mas a feira do ano passado foi “um balão de oxigênio para sobreviver o resto do ano”, explica à Lusa Nuno Pereira.
Francisco Reis, também responsável pela Poetria, recordou que, para além da pandemia, a livraria atravessa um litígio com o senhorio, que tem vindo a dificultar a situação.
Uma situação semelhante à vivida pela livraria Moreira da Costa, que tem passado “anos difíceis, desde 2017”, já que também teve de passar por um processo de litígio para se manter na Rua de Avis.
“Quando estávamos a recuperar o fôlego, veio esta pandemia, e dois anos seguidos é complicado. Mas estamo-nos a aguentar, a sobreviver e a lutar por aquilo que queremos, que é continuar a ser a livraria mais antiga da cidade e andar para a frente”, confessa Susana Fernandes.
Desta edição da Feira do Livro, espera “que seja igual à do ano passado, que foi excelente”. Este ano, traz “expectativas um bocadinho mais altas”, já que também apostou mais no certame.
“A livraria teve muitos problemas, estávamos há algum tempo sem conseguir adquirir material. Este ano, como as coisas começaram a normalizar, apesar da pandemia, excedemo-nos um pouco nesse sentido. Temos material mais significativo”, explica.
A Feira do Livro do Porto deu início à sua oitava edição organizada pela Câmara Municipal, nos Jardins do Palácio de Cristal, dedicada ao escritor Júlio Dinis com o mote de “Herborizar”.
Com 124 pavilhões, a Feira do Livro do Porto pode ser visitada com uso de máscara, sendo recomendado que se mantenha a distância de segurança. A feira tem um limite máximo de mil pessoas em simultâneo no recinto.
Em 2020, a Feira do Livro do Porto, que decorreu num contexto de pandemia e com limitação de entradas, recebeu cerca de 100 mil visitantes, tendo contado com 120 pavilhões e 80 entidades.