Cerca de 20 mil emigrantes portugueses regressam anualmente a Portugal

O sociólogo e diretor científico do Observatório da Emigração, Rui Pena Pires, posa para a fotografia durante uma entrevista sobre o lançamento do Atlas da Emigração Portuguesa, que será apresentado na próxima terça-feira, no ISCTE, em Lisboa, 12 de janeiro de 2024. Cerca de 20.000 emigrantes portugueses regressam anualmente a Portugal, na sua maioria com menos de 40 anos, um retorno que o coordenador científico do Observatório da Emigração considera que deveria ser mais apoiado. MANUEL DE ALMEIDA/LUSA

Da Redação com Lusa

Cerca de 20.000 emigrantes portugueses regressam anualmente a Portugal, na sua maioria com menos de 40 anos, um retorno que o coordenador científico do Observatório da Emigração considera que deveria ser mais apoiado.

Rui Pena Pires, um dos autores do Atlas da Emigração Portuguesa, que será apresentado na próxima terça-feira, disse em entrevista à agência Lusa que Portugal sempre teve cidadãos a emigrar e emigrantes a regressar a Portugal.

“Se estão a sair 60.000 e regressam 20.000 [por ano] é porque um terço está a voltar, o que é um número mesmo muito significativo”, afirmou.

Curiosamente, sublinhou, “e pelo menos na emigração dos últimos anos, os que regressam são sobretudo de idade jovem”, com menos de 40 anos.

A estes, junta-se o regresso de portugueses emigrados em países como a Suíça – o segundo com maior número de emigrantes portugueses, a seguir à França – e que entretanto se reformaram e não obtiveram uma reforma que lhes permita continuar.

Para Rui Pena Pires, “deveria haver uma reorientação das políticas de Estado em termos de regresso”.

“Acho que não é tão útil ter incentivos ao regresso. Não é por incentivos que as pessoas regressam e não é por falta deles que deixam de regressar”, indicou.

E alertou para as dificuldades que os emigrantes enfrentam em Portugal quando regressam ao fim de estadias prolongadas.

“Regressam a uma nova emigração. As dificuldades de integração que tiveram no país de onde estão a regressar são as mesmas. Já não conhecem nada, já não sabem como as coisas funcionam, os impostos que têm de pagar; enfrentam muitas dificuldades”, prosseguiu.

Para o sociólogo e especialista em matéria de emigração, “numa política de apoio ao retorno, o que seria essencial é uma política de apoio aos emigrantes que regressam, apoio burocrático e administrativo”.

“A maioria dos emigrantes que regressam nem sabe os direitos que têm, os estatutos especiais que há para os emigrantes. Há uns gabinetes de apoio aos emigrantes que podiam fazer essa tarefa, podiam ser gabinetes de aconselhamento dos emigrantes e de desbloqueamento de dificuldades”, defendeu.

E concluiu: “É preciso muito mais apoio aí do que propriamente incentivos para regressar”.

De acordo com o Atlas da Emigração Portuguesa, entre 2001 e 2020 saíram anualmente de Portugal, em média, mais de 75.000 pessoas. Nesse período, mais de 1,5 milhões de portugueses optaram por viver fora de Portugal, ou seja, perto de 15% da população.

Em 2021, Portugal recebeu mais de 3,6 mil milhões de euros de remessas de emigrantes, um valor superior às transferências europeias para Portugal e quatro vezes mais do que as remessas enviadas para o estrangeiro pelos imigrantes.

Jovens

Rui Pena Pires considera que os baixos salários e a crise na habitação são cada vez mais pretextos para os portugueses emigrarem, sobretudo jovens e qualificados, embora um terço acabe por regressar.

O diretor afirmou que “a diferença de salários e a perspectiva profissional” são o principal motor para a emigração portuguesa, sobretudo dos mais jovens.

“Nós pagamos salários muito baixos em comparação com os países mais desenvolvidos na União Europeia. Seria perfeitamente anormal que, havendo liberdade de circulação e este diferencial de salários, não houvesse emigração”, adiantou.

E acrescentou: “Nós devíamos é perguntar por que ainda fica cá tanta gente e a resposta é porque, ainda assim, é difícil emigrar, ir para um sítio que não conheço, onde não tenho família, amigos, e onde não sei muito bem se me vou desenrascar com os hábitos do dia-a-dia e do trabalho; e esta insegurança é que trava a emigração, caso contrário emigrava-se muito mais”.

A esta questão salarial soma-se a crise habitacional em Portugal, nomeadamente os elevados preços das casas e das rendas.

“Se havia algum dissuasor da emigração era o fato de ser muito mais barato arranjar casa em Lisboa do que em Amsterdã e atualmente é quase igual”, observou.

A crise da habitação não é só portuguesa, é geral, mas, apesar de os preços praticados serem mais ou menos os mesmos em Lisboa e Amsterdã, o rendimento disponível é muito menor em Portugal, explicou.

A emigração é a opção de cerca de 60.000 a 65.000 portugueses que todos os anos atravessam fronteiras.

“Portugal é um país de emigração e, desde 1974, um país de imigração”, sendo um país muito mais de saídas do que entradas, o país com mais emigração acumulada da União Europeia e com menos imigração.

Em relação à emigração portuguesa aos anos 60 do século XX, quando muitos saíram ilegalmente, hoje a emigração faz-se no espaço europeu e é mais qualificada, o que resulta da qualificação da população portuguesa.

Rui Pena Pires esclarece que nos anos 60 também havia emigração portuguesa qualificada, numa percentagem de licenciados não muito inferior da de hoje, mas para países como Angola ou Moçambique, ex-colônias portuguesas.

Ainda hoje, a maioria dos emigrantes que sai não tem licenciatura, nomeadamente para os países de destinos tradicionais da emigração portuguesa, como França, onde existem mais emigrantes portugueses.

Pelo contrário, para os países do norte da Europa, como o Reino Unido (antes do Brexit), Países Baixos, Bélgica, Suécia e Noruega, mais de metade dos emigrantes tem licenciatura.

Onde a emigração está a ter números crescentemente elevados é nos Países Baixos (Holanda) que, de alguma forma, “poderão estar a substituir o Reino Unido como destino da emigração qualificada”.

O número de portugueses que emigrou para a Holanda subiu de 1.000 em 2000 para mais de 3.000 em 2021. Atualmente, vivem cerca de 20.000 portugueses nos Países Baixos.

“Os Países Baixos têm das maiores porcentagens de multinacionais de toda a Europa e têm necessidade de profissionais qualificados em todas as áreas e, por essa razão, procuram também emigrantes em todas as áreas, nomeadamente da União Europeia”, afirmou, destacando a vantagem de a língua inglesa ser utilizada por todos.

Segundo o Atlas da Emigração, cerca de 30% dos portugueses, com idades entre os 15 e os 39 anos, estão emigrados, o que “não é surpresa nenhuma”, uma vez que existem cerca de 2,3 milhões de cidadãos nascidos em Portugal que residem fora do país. Isto significa que, entre 22 a 23% da população nascida em Portugal, está emigrada.

Sobre as consequências destas saídas, o sociólogo refere que pressiona a demografia portuguesa: “Não se emigra de bengala, mas sobretudo na idade jovem, com menos de 40 anos”.

A maioria das mulheres que emigra nessa altura está na idade de ter filhos e está a ter os filhos fora. Em 2022, nasceram cerca de 80.000 crianças em Portugal, destas só uma parte são filhas de mães portuguesas e nasceram cerca de 11.000 a 12.000 portugueses filhos de mães portuguesas fora, apenas nos seis países para que temos dados, pois se fosse para todos facilmente chegaríamos aos 20.000.

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *