O presidente português assinalou o 25 de Abril com referências às desigualdades sociais e problemas como a pobreza e exclusão dos idosos e a violência doméstica.
Lisboa – O Presidente da República de Portugal, Cavaco Silva, centrou o seu discurso na sessão solene dos 32 anos do 25 de Abril nas desigualdades e problemas sociais que ainda dividem o país. Cavaco Silva afirmou que 32 anos após a revolução “Portugal continua a ser um país fortemente marcado pelo dualismo do seu desenvolvimento”, considerando que “há que enfrentar com sucesso a dupla exclusão do envelhecimento e da pobreza no interior”.
Cavaco Silva defendeu que não seja apenas o Estado, mas também os portugueses, a lutar pela melhoria das condições sociais. "Quero propor um compromisso cívico, para a inclusão social, que envolva não só as forças políticas, mas também as autarquias e as instituições de solidariedade", disse o novo presidente português.
O fosso entre as regiões rurais e as urbanizadas, os problemas de exclusão da população mais idosa e a violência doméstica foram as principais questões destacadas por Cavaco Silva, cuja intervenção foi aplaudida pelos deputados do PSD, CDS-PP e PS, com o PCP, Bloco de Esquerda e "Os Verdes" a absterem-se de aplaudir.
O discurso de Cavaco Silva, que dispensou o cravo, algo inédito entre os presidentes portugueses do pós-25 de Abril, foi antecedido por intervenções do presidente da Assembleia da República, Jaime Gama, e de representantes dos vários partidos com assento no parlamento.
O Partido Comunista Português (PCP), que lutou na clandestinidade durante décadas, até à Revolução dos Cravos, evocou a "libertação de um povo que sofreu ao longo de uma época de obscurantismo" e considerou, segundo Abílio Fernandes, que "as profundas transformações então [em 1974] realizadas foram plasmadas numa das constituições mais progressistas da Europa". Na sua intervenção o PCP defendeu ainda o pluralismo das instituições e criticou os governos por falharem o cumprimento das promessas eleitorais.
Vera Jardim, pelo Partido Socialista (PS), enfatizou a necessidade do Estado social. "As condições sociais de hoje são diferentes das de há 32 anos, mas continuamos a querer uma sociedade mais justa e rejeitamos a sociedade do mercado", disse o antigo ministro da Justiça. Por outro lado, o representante do PS defendeu o contributo português ao combate ao terrorismo, afirmando que "Portugal deve continuar a apoiar na União Européia uma política de reforço da segurança internacional, particularmente no combate ao terrorismo".
O combate ao terrorismo é uma prioridade igualmente para outros partidos, como o CDS-PP, que defendeu, pela voz de Telmo Correia, que Portugal não deve ser neutro, mas aliado dos seus parceiros atlânticos. O Partido Popular pretende mudanças na Constituição de 1976 e anunciou que irá propor em breve alterações no sentido de produzir um segredo de Justiça "digno", bem como mecanismos para combater a delinqüência juvenil.
As comemorações dos 32 anos da Revolução continuam durante o dia. Além da habitual sessão solene, o dia é marcado pela inauguração de uma nova exposição sobre os "30 Anos de Constituição" e pela abertura ao público, entre as 15h e as 18h, da residência oficial do primeiro-ministro.
Estão ainda previstas manifestações populares em Lisboa, do Marquês de Pombal para o Rossio, e no Porto, na Praça D. João I. Em dezenas de municípios tem havido ao longo dos últimos dias eventos comemorativos, com debates, conferências e vários espetáculos subordinados ao tema do 25 de Abril.
O dia da Revolução
No dia 24 de Abril de 1974, um grupo de militares comandados por Otelo Saraiva de Carvalho instalou secretamente o posto de comando no quartel da Pontinha, em Lisboa. Às 22h55 era transmitida a canção ”E depois do Adeus”, de Paulo de Carvalho, pelos Emissores Associados de Lisboa. Este foi um dos sinais previamente combinados pelos revolucionários e que dava início à tomada de posições da primeira fase do movimento militar, o Movimento das Forças Armadas, com forte apoio popular e dos partidos que lutavam contra a ditadura fascista.
O segundo sinal foi dado às 0h20, quando foi transmitida a canção ”Grândola Vila Morena“ de José Afonso, pelo programa Limite da Rádio Renascença, que confirmava o movimento militar e marcava o início das operações.
O movimento militar do dia 25 de Abril teve a colaboração de vários regimentos militares, que desenvolveram uma ação concertada. No Norte, uma força do CICA 1 liderada pelo tenente-coronel Carlos Azeredo toma o Quartel-General da Região Militar do Porto. Estas forças são reforçadas por forças vindas de Lamego. Forças do BC9 de Viana do Castelo tomam o Aeroporto de Pedras Rubras. E forças do CIOE tomam a RTP e o RCP no Porto. O regime reagiu e o ministro da Defesa ordenou a forças sedeadas em Braga para avançarem sobre o Porto, no que não foi obedecido, já que estas já tinham aderido ao movimento.
À Escola Prática de Cavalaria, que partiu de Santarém, coube o papel mais importante: a ocupação do Terreiro do Paço. As forças da Escola Prática de Cavalaria eram comandadas pelo então comandante Salgueiro Maia. O Terreiro do Paço foi ocupado à primeiras horas da manhã. Salgueiro Maia moveu, mais tarde, parte das suas forças para o Quartel do Carmo onde se encontrava o chefe do governo, Marcello Caetano, que ao final do dia se rendeu, fazendo, contudo, a exigência de entregar o poder ao General António de Spínola, que não fazia parte do MFA, para que o "poder não caísse na rua". Marcello Caetano partiu, depois, para a Madeira, rumo ao exílio no Brasil.
Da revolução "pacífica" resultou, contudo, a morte de 4 pessoas, quando elementos da polícia política do regime fascista – a Pide/DGS, (Direção-Geral de Segurança) – dispararam sobre um grupo que se manifestava à porta das suas instalações na Rua António Maria Cardoso, em Lisboa.
O cravo tornou-se o símbolo da Revolução de Abril de 1974 porque com o amanhecer do dia 25 as pessoas começaram a juntar-se nas ruas, apoiando os soldados revoltosos e alguém começou a distribuir cravos vermelhos pelos soldados, que depressa os colocaram nos canos das espingardas.
Miguel Prado, Portugal Digital