Mundo Lusíada
Com agencias
O ministro dos Negócios Estrangeiros português recomendou “cabeça fria”, considerando que não devem ser criadas “complexidades desnecessárias” à atual situação da Europa, sobre a proposta do Bloco de Esquerda de realizar um referendo em caso de sanções europeias.
A coordenadora do BE, Catarina Martins, colocou, este domingo, na agenda um referendo em Portugal se a União Europeia decidir sanções contra Portugal por déficit excessivo, dias após o referendo que ditou a saída do Reino Unido da UE.
Questionado pela Lusa, o ministro Augusto Santos Silva recomendou “muita prudência, muita determinação, mas também muita cabeça fria”. “A situação europeia já é suficientemente complexa para dispensar que nós lhe acrescentemos complexidades desnecessárias”, disse o governante à Lusa, por telefone, a partir de Cuba, onde se encontra em visita oficial.
Santos Silva começara por recordar que “quem convoca referendos em Portugal é o Presidente da República”, que já afirmou que esta “é uma questão que não se põe” porque Portugal “quer continuar na União Europeia”.
Questionado sobre se o Governo fica fragilizado por esta posição partir de um dos partidos que garantem apoio parlamentar, o chefe da diplomacia portuguesa negou.
“A arte do acordo que foi possível fazer em Portugal (…) é ser totalmente explícito nas zonas de convergência e de divergência”, sustentou, recordando que o objetivo é o “regresso à ordem constitucional, reposição de rendimentos e relançamento da política económica e social”. Mas, sublinhou, “é um acordo que em nada diminui a identidade própria de cada partido”.
Santos Silva referiu que os acordos celebrados entre PS e PCP, Bloco de Esquerda e Verdes não são explícitos sobre a União Europeia, mas, acrescentou, “os partidos que apoiam no parlamento o atual Governo têm uma coisa em comum: acreditam que o futuro de Portugal passa pela UE, mas pedem mudanças importantes na UE a favor da coesão social”.
O ministro apontou que este “denominador comum muito importante” permite “arbitrar as diferenças que também existem entre PS, Bloco, PCP e PEV em matéria de política europeia”.
O BE tornou-se no primeiro partido português com representação parlamentar a admitir uma consulta popular, no encerramento da X Convenção Nacional bloquista, em Lisboa. O Presidente, Governo, PS, PCP, CDS e PSD já se mostraram contra a realização deste referendo. “Ou a União Europeia muda nos planos de legitimidade democrática da sua governação nos planos económicos, social, equidade e coesão territorial ou os cidadãos procurarão a pouco e pouco alternativas por mais arriscadas, mais desconhecidas nos seus efeitos que sejam”, referiu o líder parlamentar socialista Carlos Cesar, acrescentando que as alternativas serão sempre “tendencialmente extremistas à direita ou à esquerda”.
A coordenadora do BE explicou que o objeto do referendo que Portugal deve realizar caso sejam impostas sanções contra o país por déficit excessivo depende dos mecanismos que forem utilizados para impor essas mesmas sanções. “Se tomar uma iniciativa gravíssima de provocar Portugal, a Comissão Europeia declara guerra a Portugal e Portugal só pode responder recusando as sanções e anunciando que haverá um referendo nacional” declarou Catarina.
Penalizar portugueses
Também o ministro do Trabalho está confiante de que a saída do Reino Unido da UE não penalizará os trabalhadores e imigrantes portugueses naquele país, considerando “muito relevante” as suas competências e qualidade” e a relação entre os países.
“Julgo que as competências, a qualidade e a disponibilidade dos trabalhadores portugueses no Reino Unido, obviamente aliadas às ligações que o nosso país tem com o Reino Unido, é um fator decisivo para garantir que esta transição se faça sem penalização daqueles que optaram por trabalhar no Reino Unido”, disse o ministro português do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Vieira da Silva.
O ministro comparou também os trabalhadores portugueses que trabalham no Reino Unido aos outros trabalhadores que estão em economias que não pertencem à União Europeia (UE), destacando o seu “papel e sustentabilidade do ponto de vista da sua vida económica que é muito relevante”.
“Estou muito convicto de que assim vai acontecer no Reino Unido”, sublinhou, acrescentando que compreende que “haja incerteza, que este resultado [vitória da saída do Reino Unido da EU no referendo de quinta-feira] traga até alguma angústia”, afirmou.
Apesar disso, sustentou que a comunidade portuguesa no Reino Unido “está profundamente enraizada” na vida econômica e social e é uma parte importante daquilo que é o mercado de trabalho naquele país.
Apesar de sublinhar não ser o responsável por esta pasta, Vieira da Silva reiterou que o Governo está a acompanhar, a dar uma particular atenção ao acompanhamento da situação e em permanente contacto com a comunidade portugueses e os representantes de Portugal no Reino Unido.
Num sentido mais lato, Vieira da Silva falou também sobre o projeto europeu, afirmando que “tal como a maioria dos europeus”, a saída do Reino Unido “é uma má notícia para a União Europeia”.
Para Vieira da Silva, o importante agora é que UE “tenha capacidade de dar uma resposta sólida, coerente, que não deve ser precipitada, mas deve ser firme”, no sentido de “recuperar a sua capacidade de ser um fator de crescimento e desenvolvimento na UE e de redução das desigualdades que têm vindo a crescer nos últimos anos”.
“É isso que todos nós esperamos, que a UE tenha capacidade face a esta nova situação e face a esta crise de construir um conjunto de políticas que possam mobilizar os europeus em torno da ideia da Europa unida e que seja capaz de entregar resultados aos cidadãos”, disse.
Vieira da Silva afirmou ainda que “não é fácil retirar desta decisão democrática do povo britânico uma lição que aponte num sentido positivo”, mas defendeu que “há que retirar lições”. “Julgo que todos temos de reconhecer que a União Europeia tem vindo a perder capacidade de mobilizar os europeus em torno do projeto de integração, da própria união económica e monetária ou até mesmo da EU”, afirmou.
Os eleitores britânicos decidiram que o Reino Unido deve sair da UE, depois de o Brexit (nome como ficou conhecida a saída britânica da União Europeia) ter conquistado 51,9% dos votos no referendo de quinta-feira.