Bolsonaro pede reabertura de escolas, comércio e isolamento vertical

Da Redação
Com Lusa

O Presidente do Brasil falou na terça-feira ao país sobre o novo coronavírus e pediu às autoridades estaduais e municipais que reabram escolas e comércio, e ponham fim ao “confinamento em massa”.

“Algumas poucas autoridades estaduais e municipais devem abandonar o conceito de terra arrasada, a proibição de transportes, o encerramento do comércio e o confinamento em massa. O que se passa no mundo tem mostrado que o grupo de risco é o das pessoas acima de 60 anos. Então, por que fechar escolas”, questionou Jair Bolsonaro, sublinhando que o país deve “voltar à normalidade”.

Na terceira mensagem ao país sobre o novo coronavírus, transmitida na rádio e televisão, Bolsonaro declarou que a vida “tem de continuar” e que a situação “passará em breve”. O presidente defendeu o isolamento vertical, apenas para o grupo de risco, ou seja, população da terceira idade.

“O vírus chegou. Está a ser enfrentado por nós e brevemente passará. A nossa vida tem de continuar. Os empregos devem ser mantidos. O sustento das famílias deve ser preservado”, frisou.

Contudo, as declarações de Bolsonaro contrariam as recomendações do seu próprio Governo.

O Ministério da Saúde brasileiro aconselha a população a evitar aglomerações, a reduzir as deslocações para o trabalho, defendendo o “trabalho remoto” e a “antecipação de férias em instituições de ensino”, especialmente em regiões com transmissão comunitária do vírus, ou seja, quando já não conseguem identificar a trajetória de infeção.

As declarações de Bolsonaro foram emitidas no dia em que o Brasil ultrapassou os dois mil casos confirmados da covid-19, com o país a registrar 2.201 infetados e 46 mortos, de acordo com dados do Ministério da Saúde.

Na segunda-feira, o Brasil tinha 1.891 infectados, ou seja, registou-se um aumento de 310 casos em 24 horas.

Segundo o Presidente, “raros são os casos fatais de pessoas sãs com menos de 40 anos de idade (…) 90% de nós não terá qualquer manifestação caso se contamine. Devemos sim é ter extrema preocupação em não transmitir o vírus para os outros, em especial aos nossos queridos pais e avós, respeitando as orientações do Ministério da Saúde”.

Jair Bolsonaro, de 65 anos, voltou a subestimar a pandemia, ao afirmar que caso fosse infectado “não precisaria de se preocupar”, tendo em conta que foi um atleta.

“No meu caso particular, com o meu histórico de atleta, caso fosse contaminado pelo vírus, não precisaria me preocupar, nada sentiria ou seria, quanto muito, acometido por uma ‘gripezinha’, ou ‘resfriadinho’ (…)”, considerou.

O chefe de Estado do Brasil já se submeteu a dois exames ao novo coronavírus, ambos de resultado negativo, segundo o próprio. A imprensa pediu a divulgação pública dos resultados, mas sem êxito.

O Hospital das Forças Armadas, onde Bolsonaro realizou os exames, apresentou uma lista de infetados com o novo coronavírus, mas omitiu os nomes de duas pessoas que testaram positivo nessa unidade hospitalar, segundo a imprensa local.

Nas declarações ao país na noite de terça-feira, Jair Bolsonaro disse ainda acreditar na capacidade dos cientistas e investigadores para a cura da doença, afirmando que o Governo brasileiro recebeu notícias positivas sobre o uso da cloroquina no tratamento da covid-19.

Devido à afluência verificada nas farmácias para a aquisição de cloroquina, as autoridades de saúde brasileiras anunciaram, na semana passada, que a compra deste medicamento estará sujeita a receita médica, uma vez que continua a ser necessário para doentes com artrite, lúpus e malária.

O novo coronavírus, responsável pela pandemia da covid-19, já infectou mais de 400 mil pessoas em todo o mundo, das quais morreram cerca de 18.000.

Depois de surgir na China, em dezembro, o surto espalhou-se por todo o mundo, o que levou a Organização Mundial da Saúde (OMS) a declarar uma situação de pandemia.

Vários países adotaram medidas excecionais, incluindo o regime de quarentena e o encerramento de fronteiras.

Médicos condenam

Associações médicas condenaram o que classificam de “discurso de morte” do Presidente Bolsonaro, que instou a população a romper o isolamento imposto para combater a pandemia de covid-19 para evitar um colapso da economia.

A Associação Brasileira de Saúde Coletiva classificou de “intolerável e irresponsável o discurso da morte” feito pelo chefe de Estado, numa mensagem divulgada na terça-feira e reiterada hoje.

“Nessa manifestação, incoerente e criminosa, o Sr. Jair Bolsonaro, no momento ocupante do principal cargo do Executivo Federal, nega o conjunto de evidências científicas que vem pautando o combate à pandemia da covid-19 em todo o mundo, desvalorizando o trabalho sério e dedicado de toda uma rede nacional e mundial de cientistas e desenvolvedores de tecnologias em saúde”, diz a associação médica, na nota.

Comentando a posição contra o isolamento social defendido por Bolsonaro, a Sociedade Brasileira de Infectologia frisou, em nota, a sua preocupação com a posição do chefe do poder executivo brasileiro.

“Neste difícil momento da pandemia de covid-19 em todo o mundo e no Brasil, trouxe-nos preocupação o pronunciamento oficial do Presidente da República, Jair Bolsonaro, ao ser contra o fechamento de escolas e ao se referir a essa nova doença infecciosa como um ‘resfriadinho'”, disse a Sociedade Brasileira de Infetologia.

“Tais mensagens podem dar a falsa impressão à população que as medidas de contenção social são inadequadas e que a covid-19 é semelhante ao resfriado comum. A pandemia é grave, pois até hoje já foram registados mais de 420 mil casos confirmados no mundo e quase 19 mil óbitos, sendo 46 no Brasil”, acrescentou.

Outra organização que se pronunciou foi a Associação Paulista de Medicina. O órgão afirmou, num comunicado, que se a intenção do Presidente brasileiro foi a de acalmar a população, “a reação da sociedade mostra que ele não alcançou os seus objetivos”.

“Você não traz esperança minimizando o problema, mas reforçando as soluções. Existe um perigo próximo, evidente, real e gravíssimo. Enfrentá-lo é prioritário”, concluiu.

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