Amazônia Festival leva a floresta ao Algarve

Da Redação

Igarapés, araras, singularidades, cenários, culturas: durante oito dias, o Algarve mergulha na riqueza do universo amazônico, através do Amazônia Festival. O evento, que encerra as comemorações do “Ano do Brasil em Portugal” na região, teve início dia 1 de junho, e segue até dia 8, reunindo centenas de obras e dezenas de artistas das áreas de cinema, artes plásticas e fotografia.

Quatro diferentes espaços são palcos para a programação do evento: exposições fotográficas, de artes plásticas e de cestarias indígenas da etnia Baniwa realizadas na Escola de Hotelaria e Turismo de Faro, das 09 às 17 horas. Já a mostra de cinema e documentário, acompanhada de degustações da gastronomia típica amazônica, acontece até 7 de junho no Barti Café, a partir das 21h30. Paralelamente aos eventos realizados na capital algarvia, em Lagoa, a Quinta dos Vales (Estômbar) também irá abrigar exposições fotográficas, sempre das 09 às 19 horas. Já no Castelo de Silves, acontecerá o lançamento de uma linha de lenços de seda da grife TeG, que busca unir a moda à exuberância amazónica: produzidos a partir de uma parceria entre a estilista brasileira Tânia Castro e a fotógrafa Gisele Alfaia, trará estampas que representam as belezas da região. A entrada é gratuita.

O festival é uma realização da Galeria Amazônia Portugal, organização não-governamental criada em 2012, com o propósito de aproximar Portugal do espaço amazônico através do estímulo ao conhecimento e da cooperação com os Estados que fazem parte da chamada Amazônia Legal Brasileira – Amazonas, Pará, Acre, Amapá, Rondônia, Tocantins, Mato Grosso, Roraima e Maranhão. Atividades artísticas e culturais, mostras gastronómicas, seminários, conferências, workshops e encontros temáticos fazem parte do leque de atividades propostas pela organização, que promete trazer muito dos saberes, produtos e culturas da Amazônia para Portugal – e vice-versa.

O projeto tem como sede a Garagem Passos Manuel, no Porto, um edifício histórico erguido no final dos anos 30 do século passado, situado em frente ao Coliseu. Nesta mesma estrutura funciona, desde 2001, o Espaço de Intervenção Cultural Maus Hábitos. É diante da bela vista da ribeira do rio Douro que ambos os projetos desenvolvem o cruzamento de linguagens, formações e informações, de forma a gerar frutos de vanguarda através da arte e do conhecimento.

O Amazônia Festival emerge como um destes frutos: quem circular pelos quatro espaços dedicados ao evento no Algarve, irá defrontar-se com as singularidades de um universo cultural pouco conhecido pelo público português, para além de ter a oportunidade de encontrar grande parte dos artistas que assinam as obras expostas. O ineditismo é um dos pontos fortes da iniciativa, já que pela primeira vez se organiza – fora ou dentro do Brasil – um evento cujo foco é a realidade da Amazônia Legal.

Para viabilizar o festival, a Galeria Amazônia trabalhou em parceria com empresas e diversos órgãos e entidades dos dois lados do oceano. Conta com os patrocínios da Prefeitura Municipal de Manaus e Auto Rent do Algarve, dentre outros, para além do apoio institucional do Consulado Geral do Brasil em Faro e da Embaixada do Brasil em Portugal. Esta junção de forças é a concretização de um sonho de longa data: “Para mim, este evento é mais um passo em frente e que corresponde à visão que eu tive há oito anos atrás. Assim que tive o primeiro contato com a Amazónia, foi amor à primeira vista, digamos assim. Mudou a minha vida para sempre”, afirma Fernando, um dos organizadores do festival, que acrescenta: “Meu comprometimento em divulgar a Amazônia aqui em Portugal e aproximar as duas culturas continua sendo para mim uma missão a ser cumprida”.

Múltiplos olhares sobre a floresta e suas culturas

Nos cenários, nas paredes e ecrãs dos quatro espaços que irão compor o Amazônia Festival, estão obras que revelam os variados olhares lançados em torno do ambiente e da cultura amazônica. Esta diversidade, que inclui perspetivas oriundas de artistas de diferentes Estados brasileiros, será uma das marcas do evento, que contará com a presença – e o entusiasmo – de mais de vinte artistas.

Um deles é José Medeiros, fotógrafo que há duas décadas vem embrenhando-se no complexo universo cultural indígena do Brasil. A partir de um sugestivo nome – “Já fui floresta” – vem desenvolvendo um projeto que captura, através de contrastes, movimentos, luzes e sombras, a diversidade, os rituais, o cotidiano e o expressivo universo simbólico destas populações. A arte e a sensibilidade de Medeiros também lhe renderam inúmeras premiações. Dentre elas, está o mais importante prêmio fotográfico do país, o Concurso Leica Câmera, do qual saiu vencedor do segundo e terceiro lugares. Dentre outras conquistas, em janeiro deste ano, ganhou também o primeiro lugar do concurso organizado pelo Instituto Internacional de Fotografia, em São Paulo.

Depois de participar do Amazônia Festival em terras portuguesas, uma agenda cheia o espera no Brasil: o novo desafio do fotógrafo responde pelo nome de “Olhar Indígena”, projeto que visa capacitar índios da etnia Ikpeng, da região do Vale do Xingu, para tornarem-se profissionais de fotografia. Sua proposta, que conta com o apoio da Prefeitura Municipal de Feliz Natal, no Estado de Mato Grosso, será desenvolvida por dois anos. Uma das iniciativas que constituem o projeto é, inclusive, a preparação de grandes painéis com as imagens captadas pelos fotógrafos indígenas, a serem espalhados pela cidade de Cuiabá, uma das capitais brasileiras a sediarem a Copa do Mundo de 2014. O objetivo é revelar o olhar do índio sem intermediários, de forma que possa contar a própria história. “O que esse olhar pode nos ensinar?”, indaga Medeiros.

Foi também com os olhos postos no futuro que os artistas plásticos Francimar Barbosa e Rubens Belém, ambos da cidade de Manaus, uniram esforços e criaram um caminho para participarem do Amazônia Festival. Apesar de não disporem de financiamento para realizarem a viagem a Portugal, encontraram uma solução criativa para viabilizarem o sonho: organizaram a Feijoada Amazônia Festival, mobilizando amigos, familiares e admiradores de arte. Na ementa, além do talento e da sensibilidade, também puderam provar da solidariedade que lhes permitiu fazerem as malas e atravessarem o Atlântico.

Laços de amizade também foram a força motriz que impulsionou a força criativa da grife de lenços TeG: “A ideia partiu de um convite meu para a Gisele expor fotos no meu atelier. Eu tinha chegado de Nova Iorque, onde está uma explosão de estilistas trabalhando com digitalização em seda””, explica Tânia Castro. Ao ver a beleza das imagens captadas por Gisele Alfaia, ela teve de imediato a ideia de transformar as fotos em estampa digital. A partir desta proposta, os lenços de seda puríssima e com aplicações de cristais Swarovsky ganharam as imagens amazónicas, a partir do olhar afiado da fotógrafa.

Estes e outros exemplos revelam uma teia de olhares, pessoas, culturas e cenários que se entrelaçam sinuosamente, como os densos rios que serpenteiam pelos mais de 6 milhões de quilômetros quadrados da própria Amazónia. Para Patrícia Queiroz, uma das organizadoras do evento, “a cultura da Amazônia é uma cultura que ainda continua protegida pela grande floresta. E através do Amazônia Festival, os artistas terão uma oportunidade ímpar de difundir esta riqueza”.

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