Mundo Lusíada
Com agencias
O Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Zeid Ra’ad Al Hussein, manifestou-se alarmado com o fato das Forças Armadas brasileiras terem assumido a segurança no estado brasileiro do Rio de Janeiro.
No relatório anual que apresentou no conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, o responsável criticou o recente decreto que autoriza as Forças Armadas brasileiras a desempenhar as tarefas da Polícia no Rio de Janeiro, força que fica sob o comando do Exército.
“As Forças Armadas não são especializadas em segurança pública ou em investigação”, afirmou Zeid Al Hussein, que deplorou ainda o pedido do Exército de perdão por crimes cometidos pelos soldados.
“Deploro os pedidos de altos funcionários do Exército a que se tomem medidas que na prática implicam uma amnistia para os soldados que cometam atos que violem os direitos humanos”, disse.
O responsável da ONU apelou ao Governo brasileiro para que garanta que as políticas de segurança respeitem os direitos humanos e que as medidas adotadas evitem discriminações ao nível da criminalização com base na raça ou no nível socioeconômico.
No entanto, Al Hussein saudou a criação do Observatório dos Direitos Humanos para controlar as ações do Exército durante a intervenção e defendeu a participação da sociedade civil neste processo.
A segurança do estado do Rio de Janeiro, que enfrenta uma grave onda de violência, está nas mãos do Exército desde que o Presidente brasileiro, Michel Temer, ordenou a medida num decreto assinado a 16 de fevereiro e aprovado pelas duas câmaras do parlamento poucos dias depois.
A crise de violência que abala o Rio saldou-se, no ano passado, em 6.731 homicídios, entre os quais os de mais de 100 polícias e uma dezena de menores por “balas perdidas”.
Só no passado mês de janeiro, o estado do Rio de Janeiro, cuja população se concentra maioritariamente na região metropolitana da capital homônima, registou uma média de 21 mortes violentas por dia.
A previsão é que as Forças Armadas obtenham o controlo da segurança no Rio de Janeiro até finais deste ano, embora Temer tenha dito que poderá levantar a medida antes, se a situação na região estiver normalizada.
A intervenção federal foi amplamente criticada por movimentos sociais e setores da oposição, que consideram que a decisão de Temer foi motivada por fatores políticos e eleitorais, uma tese que o chefe de Estado categoricamente rejeita.
Cidades também querem
Enquanto isso no Brasil, outros municípios estão preocupados com uma possível migração de criminosos da capital para outras cidades do estado do Rio.
Prefeitos do sul fluminense pediram que as Forças Armadas ampliem a atuação da intervenção federal na segurança pública na região. Os prefeitos participaram da segunda reunião do Observatório Legislativo da Intervenção Federal no Rio de Janeiro (Olerj), que ocorreu em 1 de março, no município de Barra Mansa, no Rio.
De acordo com o prefeito da cidade, Rodrigo Drable, os prefeitos fizeram uma reunião para levantar as demandas a serem encaminhadas ao interventor, general Walter Braga Netto, por causa do temor de ocorrer um movimento migratório da criminalidade.
“Que exista um plano de ação com vistas às necessidades, carências e demandas do interior. Que isso não fique limitado à capital e que nós não soframos as consequências de estarmos esquecidos. Que o crime de lá não migre pra cá sem que haja estrutura para enfrentá-lo”.
Drable explicou que os 13 municípios do sul fluminense formaram um consórcio de segurança pública, mas que faltam recursos para melhorar a atuação em conjunto e integrada. “Nós temos um consórcio, que elencou as principais necessidades. Seriam a estruturação das polícias civil e militar, além da polícia técnica. E que nós tenhamos recursos para estruturar o consórcio para dar suporte através das guardas municipais. E que as guardas voltem a ter o porte de arma, que perdeu nos últimos dois anos.”
O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ressaltou que a intervenção não é apenas na cidade do Rio de Janeiro, mas no estado, então o planejamento deve abranger todas as regiões para se controlar o deslocamento dos criminosos. Ele destacou a importância da educação para evitar a violência no futuro, justificando a realização da reunião do Olerj em uma escola de tempo integral no município, o Centro de Educação Integral Vieira da Siva.
Já em fevereiro, deputados da Comissão de Segurança Pública da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) estiveram reunidos com o interventor da segurança no estado, general Walter Braga Netto, pedindo que as ações da intervenção não ocorram somente na capital, mas também na Região Metropolitana, notadamente na Baixada Fluminense, e no interior do estado.
A presidente da comissão, deputada Martha Rocha (PDT) ressaltou ao interventor a necessidade de convocar candidatos aprovados em concursos da Polícia Militar e da Polícia Civil. São 4 mil policiais militares, 248 oficiais de cartório e 99 papiloscopistas. “Há um compromisso do general Braga Netto, nos mostrando que ele receberá uma verba, mas que ela não autoriza pagamento de salário, mas que ele estará fazendo gestões no sentido da recomposição dos quadros e dos recursos humanos e materiais dessas instituições”, disse a deputada.
Assessoria Jurídica
O general Braga Netto será assessorado por três advogados da União enquanto exercer a função. Esta é uma das medidas definidas por memorando de entendimento firmado pela Advocacia-Geral da União (AGU) e a Procuradoria-Geral do Estado do Rio de Janeiro (PGE).
“Estaremos preparados para dar ao interventor, e a toda a sua equipe, a segurança jurídica necessária para que os atos sejam praticados dentro estritamente das regras estabelecidas pela nossa Constituição e pelas nossas leis”, disse a advogada-geral da União, Grace Mendonça. Ela informou que três advogados da União ficarão no estado do Rio prestando assessoramento jurídico mais direto ao general.
Pelo memorando, as duas instituições devem buscar, sempre que possível, atuar em conjunto. No entanto, isso não afeta as respectivas competências constitucionais e legais da AGU e da PGE. As dúvidas sobre as competências serão solucionadas em comum acordo com as instituições.
A advogada da União buscou tranquilizar a população do estado afirmando que a orientação, no período da intervenção, é para que tudo se dê em estrita obediência à Constituição da República e às leis do país. “Não temos aqui, de modo algum, em qualquer que seja a frente de trabalho, intenção de trabalhar com a perspectiva de violação de qualquer direito”, disse Grace, antes de sair da sede do Comando Militar do Leste.
Ela comentou uma das primeiras discussões suscitadas pela intervenção, que é a possibilidade de expedição de mandados de busca e apreensão que delimitem uma área de busca em vez de especificar o endereço dos suspeitos. Para Grace Mendonça, há um equívoco ao chamar esses mandados de coletivos.
Também o comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, disse no dia 5 que os cariocas perceberão as ações da intervenção federal em breve. “Após reunião com o general Braga Netto, reforço a minha convicção de que o planejamento e as ações em andamento breve serão percebidas pela sociedade carioca. Vamos nos unir, para que esta janela de oportunidade permita a recuperação da capacidade operacional da segurança pública do Rio de Janeiro”, disse, em uma primeira mensagem.
Cerca de quatro horas depois, o general publicou uma nova mensagem, em que afirmou compreender “a ansiedade de todos os que vivem a insegurança pública no Rio de Janeiro”.
“Não faremos promessas que não poderemos cumprir. Oferecemos muita dedicação e trabalho, e esperamos a cooperação dos diversos atores nesta pesada missão”, disse ele, que usou a hashtag #SomosTodosRJ.