Mais vagas em Medicina não resolve problema do SNS – Ordem dos Médicos

Da Redação com Lusa

 

O bastonário da Ordem dos Médicos (OM), Carlos Cortes, considerou neste dia 15 que o anúncio de criação de mais vagas em cursos de Medicina é “populista e irrealista” para os problemas imediatos do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

“Está mais do que provado que Portugal tem os médicos suficientes, só que não estão no SNS. Em vez de desviarmos as atenções com medidas de algum populismo, mas irrealistas para este momento, devemos concentrar-nos no SNS e na sua capacidade para atrair recursos humanos agora”, disse Carlos Cortes.

À Lusa, em comentário aos anúncios do primeiro-ministro, Luís Montenegro, para a área da saúde, o bastonário da OM pediu que não se empurrem os problemas.

“O país, neste momento, não tem um problema em estudantes ou diplomados em Medicina. O país tem um problema no SNS. Não queria que, mais uma vez, caíssemos nesta falácia de fazer uma ligação direta entre o número de estudantes de Medicina e o número de médicos especialistas no SNS”, disse Carlos Cortes.

Na quarta-feira, numa intervenção na Festa do Pontal, em Quarteira, distrito de Faro, que marcou a ‘rentrée’ política do PSD, Luís Montenegro anunciou a criação de mais vagas para o curso de Medicina, de forma a compensar as aposentações dos médicos do SNS.

Carlos Cortes disse que “é de saudar o fato de o primeiro-ministro ter colocado a saúde como um dos temas prioritários do seu discurso”, porque “significa que está empenhado na saúde e reconhece as dificuldades que o SNS está a atravessar”, mas mostrou-se “surpreendido com as medidas anunciadas”.

“Portugal tem médicos suficientes. Portugal é, na análise da OCDE [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico], dos países que tem mais médicos por 1.000 habitantes (…). Parece sempre muito simpático junto da população dizer que se vai aumentar o número […] mas o que o país precisa mais não é de mais vagas, é de medidas para atrair médicos”, reafirmou, resumindo as que considera mais urgentes.

“Melhores condições de trabalho para os médicos, valorizar a carreira dos médicos, rever as questões remuneratórias com os sindicatos e melhorar a formação e a investigação para atrair mais médicos”, enumerou.

Carlos Cortes lembrou que nos últimos 25 anos se passou de cinco faculdades de Medicina para 12, de cerca de 500 estudantes de Medicina para 1.700, e disse que Portugal tem perto de 2.000 novos diplomados em Medicina todos os anos contando com os que chegam de fora.

Segundo o bastonário, ainda este ano a Direção-Geral do Ensino Superior fez um estudo sobre as necessidades de médicos no país e chegou à conclusão que Portugal necessitava de ter mais 15 a 30 vagas novas nas Faculdades de Medicina.

“A Universidade da Aveiro vai iniciar [um novo curso] com 40 vagas e depois [nos anos seguintes] com o dobro ou o triplo dessas vagas”, acrescentou o bastonário.

Carlos Cortes alertou que no ano passado mais de 400 vagas para a especialidade ficaram por ocupar, um número que, disse, “tem crescido de ano para ano”, razão pela qual “são necessárias medidas para agora, não para daqui a 15 anos”.

“Este aumento de vagas e a criação de novas faculdades só vai ter médicos especialistas e capazes de integrar o SNS daqui a 15 anos. A promessa do primeiro-ministro não resolve os problemas do SNS de hoje, só empurra o problema”, reforçou.

Outra medida sugerida por Carlos Cortes, que criticou os “atrasos lamentáveis das ULS [Unidades Locais de Saúde] nos procedimentos concursais”, é a publicação das vagas dos hospitais para a especialidade em fevereiro ou março, antes de os médicos acabarem a especialização.

“Os médicos acabaram a especialidade em abril e em agosto muitos deles nem foram contactados pelo SNS (…). Os hospitais privados e os do estrangeiro não esperaram por agosto para aliciarem os médicos a trabalharem nos seus quadros”, concluiu.

Recursos

OM considerou ainda que a concentração de recursos é inevitável para resolver os problemas de curto prazo, mas pediu medidas de médio e longo prazo para atenuar as dificuldades do SNS.

“Temos dificuldades em todas as urgências. A parte mais visível é na área das maternidades e temos soluções, umas delas têm de ser a curto prazo. Esta calamidade da dificuldade de recursos humanos, fundamentalmente médicos, precisa de soluções imediatas. Mas temos de ter medidas de médio e longo prazo para atenuar as dificuldades e aumentar a capacidade de resposta do SNS”, disse Carlos Cortes.

Em jeito de comentário aos anúncios do diretor executivo do SNS que, em entrevista ao Expresso, na quarta-feira, admitiu concentrar de forma definitiva as urgências de obstetrícia e pediatria na região de Lisboa, Carlos Cortes considerou que, neste momento, a concentração de recursos é inevitável.

Ao Expresso, António Gandra D´Almeida admitiu revisitar o plano da anterior direção executiva e tentar potenciar a rede das urgências de obstetrícia e pediatria na região de Lisboa, mas falou em concentração caso a nova comissão criada para estudar esta área lhe proponha essa solução.

“As [medidas] de curto prazo foram as anunciadas e não se deslumbram outras para agora, para podermos rapidamente resolver a questão das maternidades, a não ser a concentração de recursos. A concentração de recursos é muito importante porque permite manter uma resposta de qualidade, com segurança”, reagiu o bastonário da OM.

Carlos Cortes defendeu que o sistema de urgência pré-hospitalar “tem de estar extremamente bem articulado com as urgências que vão permanecer abertas”.

“A Ordem dos Médicos vê com bons olhos que, do ponto de vista técnico, haja intenção de manter a qualidade e a segurança de todos – profissionais e grávidas – mas em paralelo devemos avançar já com medidas que possam capacitar o SNS para contratar mais médicos, mais médicos especialistas, mais obstetras e mais ginecologistas, anestesiologistas, médicos da neonatologia”, disse.

Mas para o bastonário é “muito importante não esquecer que o país tem de ter uma cobertura total para todas as pessoas”.

“E na ginecologia e obstetrícia a resposta é fundamental para as grávidas”, frisou.

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